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Senadores fazem propaganda de verba do orçamento secreto em campanhas

Do UOL, em Brasília

16/09/2022 04h00Atualizada em 19/09/2022 15h52

Disputando o governo de seus estados, os senadores Weverton Rocha (PDT), do Maranhão, Fernando Collor (PTB) e Rodrigo Cunha (União Brasil), ambos de Alagoas, têm anunciado em suas propagandas eleitorais as indicações milionárias que fizeram com verbas do orçamento secreto.

Os estados do Maranhão e de Alagoas destacam-se na corrida pelos recursos das emendas do orçamento secreto neste ano, como mostra levantamento do UOL com base em dados do sistema Siga Brasil, do Senado (veja mais abaixo).

Em cada local, caciques políticos, como Weverton e Collor, decidem para onde vai o dinheiro. Os verdadeiros padrinhos das emendas, porém, não aparecem nos portais de orçamento, mas algumas vezes são revelados em documentos de indicações do Congresso ou em redes sociais pelos próprios parlamentares.

Collor elogia Bolsonaro. Em Alagoas, o ex-presidente e ex-governador Fernando Collor colocou as emendas como mote de campanha. "Senador Collor, em todos os seus mandatos destinou recursos que muito beneficiaram o nosso município", diz o prefeito de Limoeiro (AL), Marlan Ferreira, no vídeo da propaganda.

Alagoas é o destaque nacional em emendas empenhadas, ou seja, prometidas para pagamento posterior. O estado do presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL), recebeu R$ 339 milhões. Ou seja, R$ 109 para cada um dos seus 3,3 milhões de habitantes.

Collor mandou neste ano R$ 2,52 milhões em emendas pagas pelo orçamento secreto para o Fundo Municipal de Saúde do município de Flexeiras, segundo ele mesmo anunciou em abril, ainda antes das chuvas que castigaram o estado.

A cidade alagoana com 12 mil moradores não está na lista das beneficiadas pelo senador com emendas individuais.

Os valores recebidos significam R$ 196 por habitante, mais que a média da capital, Maceió, do estado de Alagoas e do Brasil, respectivamente, R$ 41, R$ 109 e R$ 38 por habitante.

"Tudo isso é graças à ajuda que eu venho recebendo do presidente Bolsonaro", afirmou Collor em um vídeo divulgado por sua campanha.

Cassado nos anos 90 após denúncias de corrupção em seu governo, hoje Collor é um dos principais aliados do presidente Jair Bolsonaro (PL) em Alagoas.

A assessoria de Collor informou ao UOL que o senador estava se dedicando à campanha eleitoral, mas que tentaria prestar esclarecimentos. Até a publicação desta reportagem, não houve manifestação. A resposta será publicada se for enviada.

Emendas anunciadas superam orçamento individual. Rodrigo Cunha (União-AL) é outro parlamentar-candidato que tem anunciado as verbas do orçamento secreto em sua campanha.

Na sua propaganda eleitoral, ele diz ser responsável por cerca de R$ 300 milhões em investimentos "para todos os 102 municípios do estado em pouco mais de três anos".

Por meio de emendas individuais, Cunha enviou recursos para apenas 20 municípios, totalizando R$ 15,6 milhões de empenhos, segundo dados do Painel Parlamentar.

Em seu site de campanha, porém, há um mapa que indica a liberação de recursos das quais ele teria participado, totalizando R$ 289 milhões para Alagoas.

O uso do orçamento secreto pelo senador fica mais destacado numa lista de indicações do Congresso. A relação mostra que ele apontou R$ 21 milhões em recursos apenas neste ano.

A assessoria de Cunha disse ao UOL que "o parlamentar tem compromisso com o desenvolvimento do estado de Alagoas". "Rodrigo Cunha prima pela transparência. Todas as informações referentes ao exercício de seu mandato parlamentar estão à disposição para consulta nos sistemas de transparência das contas públicas disponíveis na internet e por meio do site https://rodrigocunha.org/mandato-transparente/."

No site, não existe a discriminação de quais recursos são fruto de emenda de relator. A reportagem solicitou os dados ao gabinete do senador, mas não os recebeu até a publicação desta reportagem.

Senador cita Lula, Bolsonaro, Ciro e opositor. No Maranhão, o senador Weverton Rocha é apontado como um dos principais padrinhos de emendas de relator. Ele tem como adversário de campanha o governador e candidato à reeleição Carlos Brandão (PSB), que sucedeu Flávio Dino, do mesmo partido.

Em vídeos da campanha, Weverton cita o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT), Bolsonaro e Ciro Gomes (PDT) para dizer que, se eleito, ele trabalhará com qualquer um dos três nos próximos anos.

Também evita criticar Dino. É com essa habilidade em reunir divergentes que o senador tem conseguido trazer verbas do orçamento secreto para o Maranhão, segundo o UOL apurou.

"Destinei recursos para compra de equipamentos médicos e ambulâncias para 40 municípios", diz Weverton na campanha eleitoral. Ele anunciou ter obtido R$ 180 milhões apenas para a saúde. Segundo sua assessoria, foram verbas pagas entre 2018 e 2022. Os valores são maiores que os R$ 30 milhões em emendas individuais de 2015 a 2022.

Neste ano, o Maranhão teve R$ 778,49 milhões em emendas empenhadas. É o maior volume de pagamentos do país, segundo as informações do Siga Brasil, atualizadas até 26 de agosto. Deste valor, R$ 643 milhões já caiu nas contas de prefeituras, empresas e entidades sem fins lucrativos do estado.

Weverton é aliado do prefeito de São Luís, Eduardo Braide (sem partido). Em um vídeo, Braide afirma que o senador tem "ajudado o município desde o ano passado com recursos".

O candidato, que apoiou a eleição de Rodrigo Pacheco (PSD-MG) para a presidência do Senado, selou uma aliança com o prefeito de São José do Ribamar, Dr. Julinho (PL), para sua campanha pelo governo do estado.

"Temos a obrigação de apoiá-lo pela ética, que é a ciência mais complexa do universo. Além disso, concatenamos as nossas ideias filosóficas para o progresso do Maranhão e de São José de Ribamar", disse o prefeito em um ato da pré-campanha de Weverton em julho. Dr. Julinho já pediu R$ 160 milhões em emendas de relator para seu município.

Weverton é ainda aliado do prefeito de Bacabal, Edvan Brandão (PDT). Brandão divulgou no site da própria prefeitura que o senador teria destinado emenda de R$ 10 milhões para obras de asfaltamento na cidade.

A assessoria de Weverton afirmou ao UOL que não existe segredo em suas emendas porque, quando elas são pagas, ele as divulga em redes sociais, mas apenas para os municípios beneficiados. A reportagem pediu a relação das emendas de relator do senador, mas não as recebeu até o momento.

E como estão nas disputas estaduais? Apesar das verbas liberadas, Collor, Cunha e Weverton ainda não despontaram na corrida eleitoral.

A última pesquisa do Ipec (ex-Ibope) para o governo de Alagoas mostrou que Paulo Dantas (MDB), aliado do senador Renan Calheiros (MDB), tinha 24% em 31 de agosto . Atrás dele, Cunha, o candidato do presidente da Câmara, Arthur Lira (PP), estava com 21%. E Collor seguia com 17%.

Mesma situação vive o senador Weverton. O Ipec anotou que o governador Carlos Brandão tinha 28% de intenções de voto em 23 de agosto. Weverton, 16% e Edivaldo Holanda (PSD), 14%.

O que é o orçamento secreto? As chamadas emendas de relator formam o orçamento secreto. Elas existem no Brasil desde os anos 1990, mas apenas recentemente ganharam formato e volume relevante.

Estudo da Câmara revela que o orçamento secreto quadruplicou na gestão de Jair Bolsonaro(PL) em relação a seus antecessores, Michel Temer (MDB) e Dilma Rousseff (PT).

Essas emendas têm autoria? Uma análise em inquéritos da Polícia Federal que apuram desvios de corrupção, a observação em redes sociais e um olhar sobre o volume destinado a pequenas cidades permite identificar parte dos verdadeiros autores dessas emendas, os chamados padrinhos.

Nos portais de transparência, só consta o nome do relator do orçamento. No site da Câmara, há uma lista de documentos com indicações, mas nem sempre a pessoa que indica a verba é o deputado ou senador que atuou ali (entenda mais sobre as demais emendas no gráfico abaixo).

Qual é o caminho das emendas de relator - Arte/ UOL - Arte/ UOL
Imagem: Arte/ UOL