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Lula troca debate por atos 'vira voto' em SP de olho no 1º turno

Lula discursa durante comício em Itaquera - Lucas Borges Teixeira/UOL
Lula discursa durante comício em Itaquera Imagem: Lucas Borges Teixeira/UOL
Lucas Borges Teixeira e Gabryella Garcia

Do UOL e colaboração para o UOL, em São Paulo

24/09/2022 19h35

O ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) ignorou o debate presidencial do SBT nesta noite para fazer um comício em Itaquera, na zona leste de São Paulo, com objetivo principal de pedir à militância para virar votos de parentes e conhecidos, em busca de uma possível vitória no primeiro turno.

Enquanto outros sete candidatos ao Planalto, incluindo o presidente Jair Bolsonaro (PL), participavam do primeiro bloco do programa, Lula subia ao palanque. Para a campanha, o ex-presidente tem mais a ganhar do que a perder ao ignorar o programa e falar diretamente com as regiões mais populosas de São Paulo —mesmo que vire alvo de seus adversários.

Este foi o segundo comício do candidato em São Paulo hoje. Pela manhã, promoveu um ato no Grajaú, zona sul de São Paulo. Os atos abrem a última semana de campanha do primeiro turno, focada no Sudeste, maior colégio eleitoral do país, com mais de 40% do eleitorado.

Entre críticas ao principal adversário e lembranças de outras visitas à zona leste, ele voltou mais uma vez sua fala a temas que envolvem em especial as classes média e baixa, principal alvo da campanha nesta reta final.

Vira voto. Lula e outras lideranças que subiram ao palanque com um pedido em comum: pedir à militância que virasse votos de conhecidos. Em falas semelhantes, petistas e apoiadores pediram que eleitores pedissem "até para o cunhado" virar voto.

Faltam só oito dias, a semana que vem. Ô Janja [da Silva, esposa de Lula], não é o último da campanha no dia 26 [segunda]. Não é o último ato coisa nenhuma, não. O último ato meu vai ser esperar abrir as urnas e a gente comemorar a nossa vitória no dia 1º [dia 2]."
Lula, em Itaquera.

"Faltam só oito dias, não vamos aceitar provocações, não vamos acreditar em mentira", completou Lula.

O movimento não é aleatório. Nesta semana, as pesquisas do Datafolha e do Ipec (ex-Ibope) desta semana colocaram Lula 14 pontos à frente de Bolsonaro, com possibilidade de vitória no primeiro turno na margem de erro.

Com pesquisas internas semelhantes aos dois, o PT tem trabalhado com a possibilidade real de vitória no próximo dia 2 —basta convencer esta pequena margem.

Gente, vamos virar voto, vamos conversar com os vizinhos, parentes, com os amigos. Olha, a rede social funciona, mas a rádio Zé Povinho funciona melhor. Vamos conversar com todo mundo, se o Lula virou o voto até do Ratinho a gente vai conseguir virar o voto de muita gente aqui na Zona Leste. 'Vamo que vamo', vamos com esperança para cima deles até a vitória.
Guilherme Boulos (PSOL), em Itaquera

Com base nos trackings internos, a campanha trabalha com duas possibilidades principais, dada a situação está apertada: vitória em primeiro turno por uma vantagem pequena ou ida ao segundo turno com uma pequena margem faltando.

"Precisamos acabar com esse pesadelo. Vamos virar voto até dia 2 para acabar com esse pesadelo. Isso daqui é uma nação, a zona leste", pregou o ex-ministro Fernando Haddad (PT), que também pediu voto para si ao governo de São Paulo.

"Vamos passar a régua no domingo que vem, encerrar esse negócio", completou o ex-governador Márcio França (PSB), candidato ao Senado, no mesmo tom. "Se a eleição acabar no primeiro turno, tem uma vantagem: dá para todo mundo assistir à Copa do Mundo [de futebol] com a camisa do Brasil."

Nesses últimos oito dias a 'tarefa do mais', mais unzinho por dia, um só. Se depender da Zona Leste estava dando Lula no 1º turno fácil fácil. Se depender da zona leste está dando Haddad fácil no 1º turno, fácil. O problema é que não é só a zona leste, tem sempre outros lugares. Alguém aqui tem algum parente no interior de São Paulo? Pelo amor de Deus, liga. Dá uma ligadinha e faz um zap, manda para essa pessoa, pode até ser cunhado que vale, pode ser sogra que vale também. Eu sei que é chato, mas fazer o quê? Nessa hora vale porque nós estamos na busca do mais um."
Márcio França, em Itaquera

"Faltam oito dias para a gente depositar muito amor naquela urna. Vamos pedir para todos depositar [o voto] e pedir mais um. Vamos acabar com isso", pediu também Janja da Silva, esposa de Lula, antes de apresentar o clipe de campanha.

Os imóveis de Bolsonaro. Em meio às críticas ao presidente, Lula fez ainda referência ao caso dos imóveis do clã Bolsonaro comprados com dinheiro vivo, revelado pelo UOL e censurado por algumas horas na tarde de ontem.

Eu não fico fazendo acusação falsa, mas quando ele fala mal do PT, ele tem que mostrar antes onde ele arrumou dinheiro para comprar 51 imóveis à vista. Para falar de nós lave a boca. Macaco fica olhando para o rabo dos outros e não olha para o seu próprio rabo."
Lula, em Itaquera

O caso. Em 30 de agosto, o UOL informou com exclusividade que o clã Bolsonaro usou R$ 13,5 milhões (R$ 25,6 milhões atualizados pelo IPCA) para comprar imóveis com dinheiro em espécie, total ou parcialmente, desde o início da década de 1990.

Em 9 de setembro, o UOL detalhou as evidências de uso de dinheiro vivo em cada uma das 51 transações relatadas pela reportagem, produzida durante sete meses e com base em informações colhidas em 270 documentos obtidos em cartórios.

Sem censura. O ministro do STF (Supremo Tribunal Federal) André Mendonça derrubou na noite de ontem a decisão judicial que censurou as reportagens no mesmo dia. O ministro determinou a "imediata suspensão dos efeitos da decisão".

Mais cedo, o UOL havia entrado com uma ação no STF contra a decisão do desembargador Demétrius Gomes Cavalcanti, do TJ-DFT (Tribunal de Justiça do Distrito Federal e Territórios), que censurou as reportagens do site que apontam para a compra de imóveis com dinheiro vivo feito por familiares e pessoas próximas ao presidente. O pedido foi feito pelo senador Flávio Bolsonaro (PL-RJ), filho mais velho do presidente.

Em sua decisão, Mendonça —que foi indicado para o cargo de ministro do STF por Bolsonaro— lembrou de um julgamento de 2009 no Supremo que impede a censura à imprensa. "Reiterou-se a plena liberdade de imprensa como categoria jurídica proibitiva de qualquer tipo de censura, bem assim, a imposição, ao Poder Judiciário, do dever de dotar de efetividade os direitos fundamentais de imprensa e de informação", escreveu Mendonça.

Gíria, não. Dialeto. Com parte relevante do público jovem, a militância adaptou os gritos eleitoreiros para as gírias locais e músicas de rap e funk. "O o, papai chegou! O papai chegou", gritaram os apoiadores mais próximos ao palco quando Lula subiu no palanque.

Até Haddad entrou na brincadeira. "O pai não tá on? O pai tá muito on! E ele tá com vontade, tá jogando bola feito um menino", disse.

Segundo tempo. No Grajaú, pela manhã, Lula fez um apelo contra a abstenção para a eleição no primeiro turno. Ele disse que quem não vota "perde a autoridade moral de cobrar".

Animado com as últimas pesquisas, o petista também aproveitou para provocar Bolsonaro. "Ele tem crises de enxaqueca todo dia -e ele tem uma dor que parece chamada Lula", brincou.

Quebrando protocolo. Tanto pela manhã quanto à noite, Guilherme Boulos (PSOL) e Marina Silva (Rede) discursaram. As falas quebram um protocolo que tem sido respeitado nos comícios do petista, em que candidatos à Câmara não costumam falar nos palanques, mesmo presentes, para não gerar disparidade.

Falar na zona sul e na zona leste, por sua vez, foi uma exigência direta de Boulos, coordenador da campanha em São Paulo. Já Marina teve lugar de destaque por ser o primeiro grande comício no estado desde que ela declarou apoio ao petista.

Os dois são considerados puxa-votos pela federação PSOL-Rede.

Todos roucos. Com eventos diários - muitas vezes mais de um -, agora não é só a voz do ex-presidente que chama atenção. No comício da manhã, Alckmin, Marina, Haddad e até Janja, que fala menos, apresentaram cansaço na voz.

No ato da noite, com mais vento e sob temperaturas menores, a rouquidão se repetiu.

Sem parar. Lula tem intensificado a agenda no Sudeste nesta reta final. Com dois comícios na cidade hoje, deverá passar a próxima semana na ponte aérea Rio-São Paulo.

  • Ontem (23), ele estava em Ipatinga (MG) para um comício junto ao ex-prefeito Alexandre Kalil (PSD), candidato ao governo de Minas Gerais;
  • Hoje, foi pela manhã ao Grajaú, na zona sul, e agora está na zona leste - ambos ao lado de Fernando Haddad (PT), candidato ao governo;
  • Amanhã (25), voa para o Rio de Janeiro, para um ato com a presença inédita do prefeito Eduardo Paes (PSD).
  • Na segunda (26), volta para São Paulo para um evento com artistas no Anhembi.

Deverá voltar ainda para o Rio de Janeiro na quinta (29) para participar do debate presidencial da Rede Globo e fazer uma caminhada na sexta (30). No sábado (1º), a campanha deverá ser encerrada na capital paulista.

Falta. Lula não foi ao debate presidencial, no final da tarde de hoje, no SBT. Com preferência por sabatinas e eventos na rua, a campanha não vê o que o ex-presidente, em ascensão nas pesquisas e na luta para tentar ganhar já no primeiro turno, teria a ganhar com a participação. Assessores entendem também que não há tanto a perder. Por outro lado, como dito, ele deverá ir ao programa da Globo.

Para o petista, como os públicos já foram contemplados, faz mais sentido se voltar à rua e a eventos presenciais do que debater.

Participam do programa Bolsonaro, Ciro Gomes (PDT), Felipe D'Avila (Novo), Padre Kelmon (PTB), Simone Tebet (MDB), Soraya Thronicke (União Brasil). São os únicos cujos partidos têm, no mínimo, cinco deputados federais —exigência da Justiça Eleitoral.

Virou alvo. Bolsonaro ironizou Lula e sugeriu que ele não compareceu por causa do desempenho no debate do UOL/Folha/Band/TV Cultura.

"Obviamente que ele foi muito mal no último debate. Foi absolvido, ou melhor, não foi absolvido. Foi tirado da cadeia por uma interpretação da 2 instância e depois descondenado por um amigo do Supremo. E ele é candidato. Não tem qualquer condição moral e ética para ocupar a cadeira da Presidência", disse.

Serão, ao todo, quatro blocos, com duração total de cerca de duas horas, conduzidos pelo jornalista Carlos Nascimento. Não há plateia e apenas quatro assessores de cada candidato poderão entrar no estúdio.