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Erros em disputa com Alckmin são lições para Lula tentar vencer em 1º turno

Adversários no segundo turno em 2006, Lula e Alckmin formam chapa que vem liderando as intenções de voto - Maurício Lima/AFP
Adversários no segundo turno em 2006, Lula e Alckmin formam chapa que vem liderando as intenções de voto Imagem: Maurício Lima/AFP

Do UOL, em São Paulo

29/09/2022 04h00

Se ganhar as eleições no primeiro turno no próximo domingo, o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) conquistará algo inédito em sua carreira política. Em 2002 e 2006, anos em que venceu a corrida pelo Planalto, o petista precisou de dois turnos para derrotar José Serra e Geraldo Alckmin, respectivamente.

No pleito de 2006, quando concorreu à reeleição, Lula chegou às últimas semanas da disputa com mais de 50% de votos válidos — quando se excluem brancos, nulos e indecisos — nas principais pesquisas. Na reta final da campanha, porém, dois acontecimentos prejudicaram a candidatura lulista: a tentativa de compra de um dossiê contra o PSDB e a ausência do então presidente no debate da TV Globo.

Lula fracassou em vencer no primeiro turno em 2006 apesar de seu governo, à época, ter uma avaliação de 52% de ótimo/bom a menos de seis semanas das eleições, segundo o instituto Datafolha. A aprovação, que até então era um recorde para presidentes, foi registrada apesar de a imagem do PT estar arranhada pelas investigações do mensalão, iniciadas no ano anterior.

Para especialistas ouvidos pelo UOL, os erros cometidos pelo partido naquele ano não são a única explicação para o segundo turno contra Alckmin, que hoje é vice na chapa do petista. Mas Lula viu seu desempenho nas pesquisas cair logo após os episódios, o que indica o impacto negativo deles naquela campanha.

O escândalo do dossiê estourou em 15 de setembro de 2006, a pouco mais de duas semanas do primeiro turno. Naquele dia, sete integrantes do PT foram presos em flagrante pela tentativa de comprar um dossiê contra Serra, que disputava o governo de São Paulo.

Algum candidato a presidente já venceu em primeiro turno? Sim. O fenômeno, no entanto, não ocorre há 24 anos. Nas duas eleições que venceu, em 1994 e 1998, o ex-presidente Fernando Henrique Cardoso (PSDB) superou a marca de 50% dos votos e liquidou a fatura já no primeiro turno, deixando Lula na segunda posição em ambas as ocasiões.

Em 2002, quando concorreu à Presidência pela quarta vez, Lula era o principal adversário de Serra, candidato da situação. No primeiro turno, o petista marcou 46,44% dos votos válidos, contra 23,19% do tucano. No segundo turno, o petista teve 61,27% dos votos e foi eleito.

Quatro anos depois, em busca da reeleição, Lula teve 48,61% no primeiro turno contra 41,64% de Alckmin, que no início de agosto tinha 24% de intenções de voto segundo o Datafolha, mas cresceu nas semanas decisivas. No segundo turno, todavia, o petista foi reeleito com 60,83% dos votos, enquanto o desempenho de Alckmin encolheu para 39,17%.

Por que Lula não venceu no primeiro turno em 2002 e 2006? Em 2002, o terceiro colocado foi Anthony Garotinho (então no PSB), que teve 17,86%, enquanto Ciro Gomes (à época no PPS) ficou em quarto com 11,97%. Juntos, os candidatos rivais de Lula e Serra tiveram quase um terço dos votos no primeiro turno.

Hoje, Ciro e a senadora Simone Tebet (MDB) são os perseguidores mais próximos de Lula e do presidente Jair Bolsonaro (PL), mas vêm oscilando entre 4% e 7% nas pesquisas. As sondagens indicam um baixo desempenho da chamada terceira via em comparação com duas décadas atrás. Já em 2006, a terceira via não chegou a 10% dos votos.

Lula, que registrou 51% na primeira pesquisa Datafolha de setembro, perdeu 5 pontos em um mês com o caso dos dossiês e a ausência no debate da Globo, três dias antes da eleição. No último levantamento do instituto antes do primeiro turno, Lula marcou 46%.

Para Pedro Santos Mundim, professor de ciência política na UFG (Universidade Federal de Goiás) e autor de dois artigos sobre os fatores que impactaram a opinião pública nas eleições de 2002 e 2006, esses acontecimentos tiraram de Lula pontos fundamentais para a vitória em primeiro turno.

O estouro do caso do dossiê inaugurou uma cobertura de imprensa muito negativa para o Lula. Essa cobertura negativa se intensificou e chegou ao ápice quando Lula optou por não ir ao debate da Globo
Pedro Santos Mundim, professor de ciência política na UFG (Universidade Federal de Goiás)

O que mais explica a ocorrência de segundo turno nestes anos? Para o cientista político Rodrigo Prando, da Universidade Mackenzie, a força do PSDB no estado de São Paulo — que é governado pelos tucanos desde 1995 — inviabilizou uma vitória de Lula em primeiro turno em âmbito nacional.

"A divisão regional dos votos nas eleições de 2002 e 2006 mostra que o fator decisivo foi São Paulo, o maior colégio eleitoral do país. O PT já tinha consolidado seu domínio no Nordeste, mas os eleitores paulistas ajudaram a levar a disputa para o segundo turno", observa.

Na avaliação de Prando, o antipetismo que permitiu as vitórias de FHC em primeiro turno colaborou para que Lula não tivesse o mesmo sucesso. "O sentimento antipetista sempre foi muito forte na sociedade brasileira. Da mesma forma que o PT desperta uma militância bastante coesa, na faixa de um terço do eleitorado, um percentual semelhante rejeita os candidatos do partido", diz.

Lula pode vencer em primeiro turno em 2022? Na pesquisa mais recente do Datafolha, em 22 de setembro, Lula teve 50% dos votos válidos. Já no último levantamento do Ipec, divulgado no dia 24, o petista registrou 52% dos votos válidos. Considerada a margem de erro, não é possível afirmar que a pontuação seja suficiente para uma vitória em primeiro turno.

Para Rodrigo Prando, as eleições deste ano serão decididas pelos níveis de rejeição. "A votação do Lula é movida pela rejeição ao Bolsonaro. Lula aglutinou forças políticas que aderiram a ele não por concordarem com as propostas ou por o considerarem o candidato mais virtuoso, e sim por antagonismo ao oponente", analisa.

Se o Lula for eleito em primeiro turno dessa vez, será muito menos por méritos dele e muito mais pela rejeição ao Bolsonaro
Rodrigo Prando, cientista político da Universidade Mackenzie