'Tem de haver um jeito de pacificar o país': centenários vão às urnas
Em meio aos milhares de eleitores que vão às urnas neste domingo (2), um grupo pequeno — mas com a maior experiência eleitoral do país — também promete marcar presença. Centenários, que já atravessaram diversos momentos políticos no Brasil, fazem questão de participar da escolha de presidente, governador, deputados e senadores em 2022.
"Escolha no cabresto não dá", sentencia Maria Helena Andrés, de 100 anos de idade. Ela se refere a uma prática de controle de votos pelo abuso de poder, característica da primeira metade do século 20, mas que ainda persiste em algumas regiões do país.
A eleitora, que mora em Brumadinho (MG), não declara quais candidatos vão receber seu voto — "é secreto", afirma — , mas garante que a decisão foi tomada por conta própria.
"Tenho a possibilidade que outras pessoas não têm de ter vivido mais de 100 anos com muita lucidez. Não vou com a cabeça de ninguém, faço as minhas reflexões próprias", diz ela. "É o que minha consciência manda."
Embora não seja obrigada — o voto é facultativo para idosos acima de 70 anos — Maria Helena diz que gosta de votar e nunca deixou de ir. Perdeu as contas de quantas eleições já participou e espera estar presente nas próximas. "Enquanto estiver com disposição, vou votando."
Em todo o Brasil, há 184.330 eleitores com 100 anos de idade ou mais aptos a votar, segundo dados do TSE (Tribunal Superior Eleitoral) — o número representa apenas 0,1% do total de eleitores (156 milhões). Entre os centenários que podem votar, boa parte não vai de fato às urnas.
Para Maria Helena, artista plástica, escritora e professora, o voto é uma forma de mudar o futuro das pessoas que ama. "Penso nos meus filhos, netos. Quero que todos tenham possibilidade de estudar, ser gente na vida, fazer as próprias escolhas", diz ela. "Tem de haver um modo de pacificar um pouco o país. Sou da paz."
A 1,5 mil quilômetros de distância, Celina Zengerling também terá compromisso neste domingo: ela vota em Caxias do Sul (RS). E, nas últimas semanas, vem cobrando o neto para não esquecer de levá-la ao colégio eleitoral.
Com 104 anos de idade, Celina nasceu quando as mulheres brasileiras ainda não podiam votar — o voto feminino só foi possível a partir de 1932. Na cidade onde mora, é uma das 15 pessoas com mais de 100 anos aptas a participar da eleição.
Celina não se lembra do primeiro pleito de que participou, mas diz que desde que tem idade para votar, está presente. E coleciona os comprovantes de participação.
"Eu fazia (o voto) toda faceira", conta ela, que já participou de eleições com cédulas impressas e passou a se entender com a urna eletrônica, usada no Brasil a partir de 1996.
A perda parcial de visão dificulta a marcação dos números, mas não impede a votação: a Justiça Eleitoral permite que um parente acompanhe eleitores com mobilidade reduzida ou deficiência. Segundo o TSE, a presença do acompanhante tem de ser autorizada pelo presidente da mesa receptora de votos.
A condição é que ter um ajudante seja imprescindível para que a votação ocorra e que o escolhido não esteja a serviço da Justiça Eleitoral, de partido político ou de coligação.
Para Celina, que atualmente sai pouco de casa, o dia da eleição também será um passeio com a família. Depois da votação, ela pretende acompanhar o resultado ouvindo as notícias na TV. "Gosto de votar para ter uma pessoa boa (no cargo), para fazer o serviço dela."
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