Oposição real a Lula e bolsonaristas 'light': o que esperar da nova Câmara

Com a eleição de uma bancada recorde do PL, partido do presidente Jair Bolsonaro, a Câmara dos Deputados terá um perfil mais conservador a partir do ano que vem. Para especialistas consultados pelo UOL Notícias, contudo, o comportamento do plenário dependerá do governo que assumirá no ano que vem.

Se o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT), candidato do PT ao Planalto, for eleito, ele terá uma base inferior a um terço da Câmara e precisará negociar com frequência com o centrão, que sai fortalecido das eleições. Já Bolsonaro, se vencer, deverá ter um apoio mais robusto, mas menos radicalizado do que no Senado, que teve a eleição de cinco ex-ministros e outros nomes fortes da cúpula bolsonarista. Eles disputam o segundo turno da eleição presidencial no dia 30 de outubro.

As urnas deram ao PL uma bancada que terá, a princípio, 99 deputados federais e 13 senadores, mais do que qualquer legenda em ambas as casas. Atualmente, o partido tem 76 deputados e 4 senadores, ou seja, houve um acréscimo de 32 parlamentares.

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Na Câmara, a segunda maior bancada da Câmara é a da federação partidária formada por PT/PCdoB/PV, que ganhou 11 deputados, saltando dos 68 atuais para 79 eleitos ontem.

Em seguida, porém, vêm várias legendas de centro e direita: União Brasil (59), PP (47) e Republicanos, PSD e MDB (42 cada), segundo projeção das bancadas publicada pelo Diap (Departamento Intersindical de Assessoria Parlamentar).

O que esperar da Câmara se Lula for eleito? Os partidos de esquerda representarão menos de um terço da Câmara, o que significa uma base frágil para um eventual governo Lula.

Somando os eleitos do PDT (17), do PSB (14), da federação PSOL/Rede (14) e do Solidariedade (4), as siglas que em tese serão alinhadas ao petista contarão com 128 deputados. O número é insuficiente, por exemplo, para barrar um eventual pedido de impeachment contra Lula.

Mas o analista Antônio Augusto de Queiroz, do Diap, avalia que a oposição a Lula na Câmara seria menos concreta do que na Casa vizinha. "Se for eleito, Lula vai ter uma oposição real e consistente no Senado. Essa oposição também será numericamente na Câmara mas pouco coesa e mais maleável, aberta a negociações", avalia.

Se você pegar os partidos da base do governo, são partidos pragmáticos. Uns 30% são Bolsonaro raiz, mas o resto faz negócio. Um presidente com a habilidade do Lula conseguiria cooptar alguns destes partidos em boa parte das votações
Antônio Augusto de Queiroz, analista do Diap

O que esperar da Câmara se Bolsonaro for eleito? Queiroz avalia que a base bolsonarista na Câmara, embora tenha aumentado, deverá ser mais experiente do que a eleita há quatro anos. Isso significa, segundo analista, que o plenário será menos radicalizado à direita do que o do Senado.

"Embora muitos bolsonaristas tenham vencido, eles deverão vir menos raivosos do que o grupo eleito em 2018, que não tinha a menor noção de como funciona o Congresso. Agora eles estão reeleitos, e não estarão mais naquela onda do caçador de Pokémon, com o celular para cima e para baixo. Por isso eu acho que a Câmara vai ser menos radical do que o Senado", observa.

O cientista político Leandro Consentino, professor do Insper, considera que Bolsonaro continuará dependendo do centrão para alavancar os interesses do governo na Câmara.

O centrão vai continuar dando as cartas, por meio do orçamento secreto e outros instrumentos. E o Executivo fica, basicamente, como refém da prerrogativa dos deputados. O governo poderá passar mais tempo sendo pautado do que pautando os parlamentares
Cientista político Leandro Consentino, professor do Insper

Se Bolsonaro for eleito, em que pautas poderá avançar? Para os analistas, a chamada pauta de costumes, que não teve espaço no Congresso no primeiro mandato de Bolsonaro, poderá ser impulsionada com uma eventual reeleição. Segundo ele, os bolsonaristas poderão fazer avançar suas visões ideológicas em temas como educação e segurança pública.

"No atual mandato, o Bolsonaro não conseguiu nesses temas porque o Rodrigo Maia [presidente da Câmara em 2019 e 2020] priorizou questões fiscais, como a Reforma da Previdência, e o Arthur Lira [atual presidente da Casa] ficou mais focado em garantir a reeleição do Bolsonaro", opina Queiroz, do Diap.

E no Senado? Com maioria conservadora, o Senado pode não apenas impulsionar pautas bolsonaristas como pautar temas como o impeachment de ministros do STF (Supremo Tribunal Federal), que até o momento, não tiveram espaço na casa.

"A eventual eleição do Bolsonaro pode estabelecer uma crise sem precedentes com o STF. Em um novo mandato, o Senado vai dar suporte a ele nesse enfrentamento aos ministros, terá números para isso", diz Queiroz.

Consentino, no entanto, ainda vê a possibilidade como remota. "Essa pauta precisaria do apoio de senadores que, em geral, não querem se indispor com os ministros porque têm foro no Supremo, são julgados por eles. Normalmente, eles não embarcam em uma aventura dessas por instinto de preservação", analisa.