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Lula no Flow: Leia íntegra da entrevista do ex-presidente para podcast

Lula aparece ao lado do apresentador Igor, nos bastidores do Flow Podcast - Reprodução/Twitter/Lula
Lula aparece ao lado do apresentador Igor, nos bastidores do Flow Podcast Imagem: Reprodução/Twitter/Lula

Do UOL, em São Paulo

18/10/2022 21h48Atualizada em 18/10/2022 22h41

O ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) foi entrevistado nesta terça-feira (18) no Flow Podcast. Ao longo do programa, o petista falou sobre fake news, afirmou que seu adversário Jair Bolsonaro (PL) se "comporta como um pedófilo" —ao citar o caso das adolescentes venezuelanas— e citou o transporte gratuito para as pessoas votarem no segundo turno.

A entrevista com Lula ultrapassou a audiência do programa que teve a participação de Bolsonaro. Em 8 de agosto, uma segunda-feira —antes da campanha eleitoral—, o atual chefe do Executivo foi entrevistado pelo Flow e alcançou uma média de 550 mil espectadores simultâneos. Hoje, por volta das 19h24, o petista somava 645 mil ouvintes simultâneos e depois chegou a alcançar um milhão de pessoas.

O programa durou pouco mais de uma hora e 40 minutos e foi conduzido pelo apresentador Igor Coelho.

Leia a íntegra da entrevista:

[Igor]: Salve, salve, família. Bem-vindos a mais um Flow. Eu sou o Igor e hoje vou conversar com o Lula, cara, o Luiz Inácio Lula da Silva. Muito obrigado por vir aí, cara.

[Luiz Inácio Lula da Silva]: É um prazer, Igor.

[Igor]: Queria ter esse papo contigo já faz muito tempo, tu não faz nem ideia, cara. Eu imagino que isso não chega nem pra você, mas eu tô tentando falar com você faz uns dois anos.

[Luiz Inácio Lula da Silva]: A verdade é a seguinte: O Crispiniano faz tempo que ele quer que eu venha no Flow. Faz tempo.

[Igor]: Obrigado, Crispiniano. Fez força aí. Mas deu tudo certo, graças a Deus. Bom, antes de a gente começar aqui, na verdade, deixa eu falar sobre os patrocinadores de hoje. [Apresentador fala dos patrocinadores]

Lula, esse último aqui, não é nada pessoal, mas, ó... você aí que está calvo e está precisando de um implante, certo? Que nem eu, eu fiz dois.

[Luiz Inácio Lula da Silva]: Você fez dois implantes?

[Igor]: Fiz um para cobrir aqui, ficou até maneiro.

[Luiz Inácio Lula da Silva]: Mas tão novo.

[Igor]: Eu tenho 37, né? Aí eu fiz um segundo, começou a faltar aqui atrás também, aí eu fiz mais um aqui, dei uma adensada, agora tô cabeludão. Mas, cara, antes estava meio assustador, pra ser sincero. [Apresentador fala de patrocinador]

[Luiz Inácio Lula da Silva]: Ô Igor, você sabe que?

[Igor]: Tá com mais cabelo ali, hein, Lula!

[Luiz Inácio Lula da Silva]: Esse negócio de cabeludo é o seguinte. eu fui cabeludo até 2011, quando eu tive o câncer. Quando eu tive o câncer, aí o cabelo despencou e não nasceu mais com a força que tinha.

[Igor]: Entendi.

[Luiz Inácio Lula da Silva]: Mas eu tinha medo de ficar careca e não casar, cara.

[Igor]: Ih!

[Luiz Inácio Lula da Silva]: Meu irmão, o Frei Chico, ficou careca com 22, 23; o dele já tinha o cocuruto aqui, e eu tinha um medo, po, se eu ficar careca, quem vai querer casar comigo, pô? Aí? [Risos]

[Igor]: É, bom, não foi um problema, no fim das contas.

[Luiz Inácio Lula da Silva]: E eu não fiquei careca, graças a Deus tá pouquinho cabelo agora, pouquinho cabelo. Eu não quero mais fazer implante, não, mas?

[Igor]: Tá certo. Lula, eu estava assistindo esse último debate que teve aí na Band, um formato diferente, tal, teve uma hora...

[Luiz Inácio Lula da Silva]: Bom formato, bom.

[Igor]: Bom formato, né?

[Luiz Inácio Lula da Silva]: É melhor do que os outros.

[Igor]: Eu também acho, eu também acho. Eu também acho que só é possível porque só tinha você e o Bolsonaro, na verdade, não tinha aquele monte de gente, né?

[Luiz Inácio Lula da Silva]: É, nós já tivemos debate, todo segundo turno o debate é mais flexível. Eu já tive com o Alckmin, já tive com o Serra. É um debate melhor, porque você tem uma hora e meia, você e o teu adversário. O problema de debater com o Bozo é que ele é um mentiroso compulsivo.

[Igor]: Eita porra!

[Luiz Inácio Lula da Silva]: É um negócio impressionante, eu nunca... Eu pensei que o Maluf, que era mentiroso, porque eu faço política há 50 anos?

[Igor]: Todo político é mentiroso, Lula.

[Luiz Inácio Lula da Silva]: Não, não é verdade. Não é verdade. Veja, deixa eu lhe falar uma coisa: é que se cria uma imagem do político que causa prejuízo à política.

[Igor]: Tá.

[Luiz Inácio Lula da Silva]: Você tem políticos sérios de direita, você tem políticos sérios de esquerda?

[Igor]: De fato.

[Luiz Inácio Lula da Silva]: Você tem políticos sérios de centro, sabe? Você não precisa mentir. Eu estava vendo um vídeo do Bozo esses dias, ele, naquele vídeo em que ele tá falando das meninas venezuelanas, ele fala textualmente: "Tenho que mentir, é preciso mentir! O político tem que mentir!". Porque sempre é mais fácil acreditar numa mentira. Uma mentira... minha mãe dizia: uma mentira, ela? ela voa; a verdade engatinha. É sempre assim.

Mas eu acho que você tem muitos políticos no Brasil que não mentem, que são pessoas sérias, sabe? Só pra você ter ideia, todos os deputados que tiraram nota dez na Constituinte, todos os deputados não se reelegeram. O cara foi nota dez de prestar serviço à sociedade, era medida a nota pelo que o cara fazia pelo povo trabalhador, sabe? Os deputados que tiveram nota dez não se elegeram, cara!

[Igor]: E a que tu atribui isso?

[Luiz Inácio Lula da Silva]: Significa que o povo não presta muita atenção, sabe, no exercício do mandato, e muitas vezes a imprensa, ela desinforma, ela julga todo mundo, ou seja, quando ela fala "o Congresso não trabalha", ela não diz quem trabalha, ela coloca todo mundo no mesmo caixote, e isso vai cometendo equívocos, erros, e as pessoas vão tendo uma visão deturpada.

O Ulysses Guimarães dizia: "Toda vez que a sociedade quer mudar o Congresso e fala que vai mudar, ele muda pra pior". A quantidade de gente que entrou no Congresso nesses últimos quatro anos foi muito pior, cara!

As pessoas mentem descaradamente, sobretudo depois da internet. Essa tal de fake news, ela é um liberou geral pro cara que não presta, pro mentiroso. Você não tem noção...

[Igor]: Eu quero conversar contigo sobre isso.

[Luiz Inácio Lula da Silva]: Você não tem noção do que é isso. Você não tem noção!

[Igor]: Eu lembro do... que teve aquele assunto lá de mamadeira de piroca, teve umas coisas absurdas assim.

[Luiz Inácio Lula da Silva]: Essas coisas absurdas que eles inventam todo dia, e não têm critério. Eles são capazes de dizer que você nasceu mulher e depois virou homem. Eles são capazes de dizer que vaca voa. Eles são capazes de dizer que cavalo tem chifre e boi não tem. Qualquer mentira, não tem tamanho e não tem hora. É uma verdadeira fábrica de mentir a campanha do Bolsonaro. Eu... eu tenho uma coisa, Igor, que eu aprendi fazer política ainda quando eu estava no movimento sindical. Então você tem um discurso mais ideológico, um discurso mais em defesa das coisas que você acredita, mais em defesa da melhoria dos trabalhadores, tal, você defende programa de governo, eu quero ser presidente porque eu quero fazer isso, quero fazer aquilo. Não, hoje não tem mais, cara. Hoje não tem mais. Hoje é o seguinte: é mentira atrás de mentira, e você passa o tempo respondendo.

[Igor]: E como é que tu lida com isso sem... assim, você tá dizendo basicamente que a campanha do Bolsonaro é baseada em mentira, mas você também falou que as... ninguém mais tá prestando atenção em plano de governo, tudo mais, como é que tu lida com isso?

[Luiz Inácio Lula da Silva]: Não só a campanha é com base na mentira, e das piores mentiras, da coisa mais perversa que você pode imaginar, como o governo dele é uma mentira. Ou seja, já foi patenteado, divulgado de que ele mente quase oito vezes por dia. O cara levanta uma hora da manhã para contar mentira! Na internet. Ele levantou uma hora da manhã para tentar corrigir a maluquice que ele fez de ir na casa das meninas que prestam serviço, que trabalham, pra achar que elas estavam, sabe, fazendo... qualquer coisa errada. Ele foi lá com segundas intenções. E depois percebeu a bobagem que fez, então resolveu acordar uma hora da manhã desesperado e dizer que o PT que é o culpado, que o PT não sei das contas. Ele!

[Igor]: É difícil realmente defender aquilo ali que aconteceu e tal, mas você não acha também que assim, ó, pelo amor de Deus, todo mundo, quem me conhece sabe que eu não sou bolsonarista, sabe também que eu não sou petista, tô tentando ter uma conversa franca contigo.

[Luiz Inácio Lula da Silva]: Eu quero sair daqui tentando ganhar seu voto. O voto é sigiloso, porra, você não tem que falar para ninguém.

[Igor]: Verdade. Eu acho que às vezes existe um exagero, e assim, falando especificamente do Bolsonaro, vai. Que, porra, tu realmente acredita que ele é pedófilo? Tu acredita que ele é pedófilo? Eu não acredito que ele seja pedófilo.

[Luiz Inácio Lula da Silva]: Deixa eu lhe falar, ele se comporta como se fosse.

[Igor]: Tá.

[Luiz Inácio Lula da Silva]: O tratamento que ele dá às mulheres. Você veja uma coisa, ele vai terminar o mandato de presidente. Ele nunca reuniu nenhum agrupamento de organização da sociedade, nem favelado, nem trabalhador, nem sindicato, nem mulher, nem negro, nada! Ele vive por conta de alimentar os milicianos dele de mentira, porque ele tem um exército poderoso de divulgar mentira. Ele vive disso.

O comportamento dele agora, o comportamento no caso das meninas da Venezuela é o comportamento de um pedófilo. E ele percebeu isso. Por isso é que ele ficou apavorado e tentou se explicar o mais rapidamente possível, sabe? Agora à noite, não sei se você viu, tem uma nota do partido, do PP, em que a direção do PP diz que, sabe, ele pensou que eram umas meninas...

[Igor]: É, mas o que é interessante é que assim, ele falou isso acho que em duas oportunidades ao vivo, sabe? Eu acho meio... um tiro no pé, não sei, é que nem o lance de virar jacaré. A galera pegou, "o Bolsonaro falou que se tomar vacina você vai virar jacaré". Não era exatamente isso. Né? Ele estava meio que falando ali que não sabia qual eram as paradas, ninguém de boa-fé acredita que ele falou mesmo que as pessoas vão virar jacaré.

[Luiz Inácio Lula da Silva]: Deixa eu te contar uma coisa: ele fala isso ao vivo na televisão e no rádio, ele não mede as consequências. Quando dá caca é que ele, então, tenta se explicar. Porque aí vem o pessoal da política e fala: "Ô cara, você tem que pedir desculpa, você tem que inventar qualquer coisa". Mas ele tem uma propensão de falar bobagem.

[Igor]: Bom...

[Luiz Inácio Lula da Silva]: Tem uma propensão de mentir. No debate da Bandeirantes, o que eu acho engraçado é que antigamente a gente dizia: "O cara mente e nem fica vermelho". O Bolsonaro mente descaradamente. Sabe, de coisas mais absurdas que acontecem. E ele tenta passar aquilo como se fosse verdade.

Ele tem uma rede poderosa de robôs em que ele consegue fazer com que essas mentiras cheguem a todo mundo em tempo real, e daqui a pouco você tá se explicando, tem que ficar se explicando.

[Igor]: Já tive que lidar com robô mesmo.

[Luiz Inácio Lula da Silva]: É uma coisa delicada, sabe por que, Igor? Eu pelo menos não estava acostumado a fazer política assim. Eu fui candidato contra o Collor, eu fui candidato contra o Fernando Henrique Cardoso, fui contra o Serra, contra o Alckmin, ou seja, é uma coisa civilizada que você discute o Brasil. Você vai pra televisão pra defender o teu programa. Eu quero propor isso pro Brasil. Sabe? Com ele é impossível! É impossível! Ele não teve programa em 2018 e não tem programa agora.

E ele vive de mentira, ele vai contando as mentiras dele, vai contando as mentiras dele, e na rede social há uma contradição porque a imprensa escrita costuma provar as mentiras dele, mas na rede social ele faz um ato com cinco pessoas, filma só a cabeça das cinco pessoas e fala que é uma multidão.

Sabe, é disso que ele vive, disso que ele se sustenta. E eu fico triste de saber que muita gente no Brasil se deixa enganar por isso. Sabe? Tem coisa que eles falam que não tem cabimento. Ah, o Lula vai fechar igreja. Você já ouviu falar isso.

[Igor]: Também acho que não tem nenhum cabimento.

[Luiz Inácio Lula da Silva]: Deixa eu te contar...

[Igor]: É parecido com o lance do virar jacaré.

[Luiz Inácio Lula da Silva]: Deixa eu te contar, fui eu, em 2003, que sancionei a lei de liberdade religiosa nesse país, ele era deputado, ele sabe disso. Fui eu em 2010 que criei a Marcha com Jesus. Veja, eu defendo a liberdade religiosa, porque eu acredito que a fé é uma coisa sagrada, cada pessoa exerce como bem entender.

E eu defendo todas as religiões, a evangélica, a católica, o budismo, sabe? O islamismo, a religião judaica, a religião de matriz africana, eu defendo tudo.

[Igor]: Será que é por isso que ele detém a maioria do voto evangélico, porque você é mais todo mundo?

[Luiz Inácio Lula da Silva]: Olha, possivelmente, possivelmente ele tem uma fábrica de contar mentira também junto a setores da igreja evangélica. Porque os evangélicos, tem gente muito séria, são muitos trabalhadores, gente pobre, que trabalha.

Eu era presidente do sindicato, eu convivia com centenas de metalúrgicos evangélicos, sabe? Agora, o que a gente tem lido na imprensa todo dia, tem lido em imprensa brasileira e estrangeira? É de determinados pastores que funcionam como se fossem, sabe, um candidato, ameaçando as pessoas, ameaçando, dizendo que nós somos contra a religião, que nós vamos fechar igreja, que quem não votar no Bolsonaro vai não sei das quantas, sabe?

Essa mentira, você não tem tempo de discutir o futuro, porque você fica tendo que prestar conta das mentiras e desmontando as mentiras que os caras contam todo santo dia. Todo.

E todas as mentiras que você vê todo dia, essa mamadeira de piroca na campanha do Haddad é uma coisa tão absurda que a minha cabeça não tem lugar para guardar uma coisa dessa. É tão inverossímil que eu fico pensando, ninguém acredita.

[Igor]: Também achava que ninguém acreditava.

[Luiz Inácio Lula da Silva]: Mas tem gente que acredita. Se você passar na Praça da Sé e você ficar olhando pro céu e gritar "olha um elefante voando", tem gente que fica olhando porque acredita que vai aparecer um elefante voando. Tem gente que compra bilhete vencido achando que vai ganhar. Ou seja... então, Igor, é uma preocupação constante em criar uma civilidade nesse país em que as coisas se transformem em coisas mais sérias.

O povo não pode ser enganado todo dia, toda hora, com mentiras. As pessoas de boa vontade, as pessoas de bem, que trabalham. Sabe, as pessoas que querem cuidar das suas famílias, com muito carinho, não podem viver nesse nível.

É muito ruim, eu posso te garantir que com os meus 76 anos, eu nunca tinha visto nada igual. Nada igual. É uma fábrica poderosa de contar mentira. Você não sabe de onde vem o dinheiro, você não sabe aonde é que está o robô, sabe, é uma coisa... e todo dia, todo santo dia você tem uma mentira, uma aberração, que você fala: bom, o cara que acreditar nisso é louco.

Na verdade quando você fala, você está ofendendo o cara que tem uma deficiência mental porque, sabe, o cara que acredita nisso é pior do que isso. E o Bolsonaro funciona como se fosse um psicopata. Para ele tudo, tudo, tudo pode ser transformado numa mentira. Ele vem aqui, ele mente, ele vai no debate, ele mente, ele vai na reunião do Congresso, ele mente, ele conta uma história, depois ele percebe que fez bobagem, ele tenta descontar aquela história, tenta construir. É assim. Você veja o discurso dessa Damares outro dia, não sei se você acompanhou.

[Igor]: Devo ter acompanhado.

[Luiz Inácio Lula da Silva]: Falando de criança. É uma coisa tão absurda, uma coisa tão absurda que na minha cabeça não passa a ideia de que alguém pode falar uma coisa daquelas. Não é possível. As pessoas...

[Igor]: E tu se eleito vai ter que lidar com ela lá.

[Luiz Inácio Lula da Silva]: Pois é, essa gente foi eleita, e essa gente você tem que lidar com ela.

[Igor]: Se tu for eleito, tu vai ter que lidar com uma galera bolsonarista.

[Luiz Inácio Lula da Silva]: Só que lá também o jogo é mais duro, lá também não tem bobo, o bobo ficou de suplente, sabe? Ela também vai enfrentar pedreira no exercício do mandato dela. Ou seja, você elegeu algumas pessoas que sinceramente o Brasil não merecia. Tem uma piada antiga que diz o seguinte, que estava reunido...

[Igor]: O povo que escolheu, cuidado com isso.

[Luiz Inácio Lula da Silva]: Eu sei, é isso mesmo. Estava reunido o americano, um francês e um japonês, falando da qualidade do seu país. Os americanos reclamando dos furacões, que Deus foi injusto que colocou furacão, que Deus foi injusto que colocou muita neve no outro país, que Deus foi injusto porque colocou muito vento no outro país, e aí o cara falou: porra, mas só cuidou bem no Brasil, no Brasil não tem furacão, não tem tufão, não tem terremoto, não tem vulcão. E Deus falou assim: você vai ver a classe política que eu vou colocar lá. E aí acontece um pouco isso. Acontece um pouco isso.

Lamentavelmente essas pessoas são eleitas, você tem que lidar com elas na expectativa de que elas pelo menos tenham juízo de utilizar o mandato para servir a sociedade.

[Igor]: Idealmente. Para isso que estão ali, na verdade.

[Luiz Inácio Lula da Silva]: É isso.

[Igor]: Cara, tira uma dúvida pra mim rapidinho aqui. Eu reparei... na verdade, eu não reparei, não, um amigo meu chamou minha atenção no debate, que você estava usando a mesma gravata que você usou em um dos depoimentos para o Moro. Tu pensou nisso ou foi sem querer?

[Luiz Inácio Lula da Silva]: Não, sabe o que é? Aquela gravata é um símbolo para mim. Aquela gravata eu ganhei quando o Brasil ganhou as Olimpíadas em Kopenhagen. Você pode ver que lá em Kopenhagen eu estava com aquela gravata, o Pelé estava com aquela gravata, foi uma gravata que o comitê olímpico deu para nós. E eu fiquei com 18 gravatas, dei uma para o Jô Soares, sabe?

E não sei quem pediu a outra. Eu tenho lá em casa. Aquela gravata, eu uso toda vez que vou encontrar com representante estrangeiro, eu uso aquela gravata.

[Igor]: Tá, então ela de fato significa alguma coisa?

[Luiz Inácio Lula da Silva]: Significa... sabe? Significa minha pátria amada.

[Igor]: Entendi. Que bonitinho, cara!

[Luiz Inácio Lula da Silva]: Significa... aquela gravata simboliza o Brasil, sabe? Eu achei muito bonito, então uso ela toda vez que eu vou ter uma reunião com um representante estrangeiro, eu uso aquela gravata.

[Igor]: Entendi. Entendi. Mudando um pouco de assunto, cara, ó? Bom, por que você acha que existe, na esquerda, eu tô falando da minha experiência, porque assim, eu já apresentei, aqui nesse formato, quase mil programas, tá? E eu percebo, cara, uma dificuldade em trazer uma galera aqui declaradamente de esquerda pra conversar. Não sei se as pessoas se sentem desconfortáveis ou imaginam que eu sou o diabo ou qualquer... ou um grande cientista político, qualquer coisa nesse sentido aí, que eu não sou, mas assim, eu sinto uma...

A verdade é que eu sinto uma certa resistência, assim majoritária, quase que exclusivamente de esquerda; eu consigo marcar com uns caras, assim, centro-direita, e com muita facilidade, mas de esquerda tenho mais dificuldade. Por que você acha que...

[Luiz Inácio Lula da Silva]: Vou te apresentar uma relação de caras de esquerda pra você trazer.

[Igor]: Tá, faça isso, porque o...

[Luiz Inácio Lula da Silva]: Deixa eu te contar, Igor: eu, por exemplo, eu não tenho nenhuma preocupação em fazer entrevista ao vivo com quem quer que seja. Agora, o que eu tenho preocupação é dar uma entrevista por escrito pra um cara que eu sei que me odeia, porque eu não sei o que ele vai escrever.

[Igor]: Não, faz todo sentido. Eu também tenho essa preocupação.

[Luiz Inácio Lula da Silva]: Ou se você gravar num canal de televisão, você não sabe o que ele vai editar. Mas ao vivo eu não tenho nenhuma preocupação, até porque, pra mim, não tem pergunta difícil, não tem pergunta irrespondível, sabe? Ou você sabe, ou não sabe. E tem muita gente boa de esquerda. Gente muito boa, e não precisa ser de esquerda, não, porque não é só a esquerda que tem a verdade dentro de si.

É importante a gente saber que tem muita gente séria que não é de esquerda. Muita gente boa, muita gente comprometida, muita gente que pensa no Brasil, sabe? E eu acho que essa gente que precisa falar mais, que precisa discutir mais, que precisa se apresentar mais, porque sabe o que acontece? Quando você fala "eu não sou político"? você já falou isso?

[Igor]: Eu já falei que eu não gosto de política.

[Luiz Inácio Lula da Silva]: Ah, então deixa eu te contar: junho de 1978, tu não era nem nascido ainda, pô.

[Igor]: Não.

[Luiz Inácio Lula da Silva]: E eu dizia: "Eu não gosto de política e nem gosto de quem gosta de política".

[Igor]: De política eu gosto, eu não gosto é de político.

[Luiz Inácio Lula da Silva]: Eu achava o máximo! A imprensa me tratava como rei, o jornal O Estado de São Paulo, o Jornal do Brasil: "Lula, o puro", "o sindicalista que não gosta de política", "ele não quer o poder". Dois anos depois, eu estava criando um partido político. Porque o problema é o seguinte, Igor: se você não faz política, alguém faz por você.

[Igor]: Sim.

[Luiz Inácio Lula da Silva]: É simples, portanto, você pensar nisso.

[Igor]: Mas eu faço política.

[Luiz Inácio Lula da Silva]: Por isso eu quero aproveitar essa chance que você tá me dando, que é o seguinte: nós temos que convocar o povo que não votou a ir votar. Sabe por quê? Se você não vota, você não tem o direito de reclamar de nada. Você não tem o direito de xingar o deputado, de xingar o governador, de xingar o prefeito e o presidente da República.

Então, se você votar confiando no programa que ele te apresentou e ele não cumprir o programa, você pode passar na rua e xingar o presidente; não xingar de palavrão, mas xingar, sabe? De traidor, de traíra, de qualquer coisa, sabe? Mas por isso eu queria fazer um apelo: se você puder, nos seus programas, fazer sempre um apelo para que as pessoas compareçam pra votar, o TSE...

[Igor]: Não, eu peço pras pessoas fazerem diferente de mim e irem votar.

[Luiz Inácio Lula da Silva]: O TSE, deixa eu te contar, tomou uma decisão agora que as prefeituras podem colocar transporte gratuito pro povo. Sabe, porque é muito importante, o transporte tá caro, e uma pessoa que mora aqui na Zona Leste, se ele tiver que votar noutro lugar, ele não tem dinheiro. Então, o que é que tem dar um dia de transporte pro cara viajar pra ir votar? E se você não vota, Igor, vote, cara. Levante de manhã?

[Igor]: Eu não voto desde 2012, cara.

[Luiz Inácio Lula da Silva]: Mas deixa eu lhe falar: levante de manhã e fale: "Eu vou cumprir com o meu dever cívica".

[Igor]: Mas é que eu não acredito em vocês, cara.

[Luiz Inácio Lula da Silva]: Eu vou assumir... Você tem que acreditar, cara, sabe por quê? Ou você acredita, ou você vira político. Porque quando você não acredita em ninguém, você tem que saber o seguinte: que político bom que você quer? Talvez seja você.

[Igor]: Eu nem acho que eu sirvo pra isso?

[Luiz Inácio Lula da Silva]: Quem sabe só você pode realizar o que você quer que os outros realizem? Então, ô cara, pare de falar mal dos políticos e entre na política. Aí você vai perceber como é difícil.

[Igor]: Não, eu tenho certeza que é um absurdo de difícil.

[Luiz Inácio Lula da Silva]: Vai perceber como é mais fácil falar no microfone do que fazer as coisas.

[Igor]: Esse é o meu jeito de política, na verdade: eu trago os caras aqui pra... e apresento pra galera ouvir as ideias que são produzidas aqui, né?

[Luiz Inácio Lula da Silva]: Eu jamais vou conversar com uma pessoa querendo que ele seja do meu partido ou querendo que ele vote em mim. O que eu quero é o seguinte: a pessoa tem que comparecer pra votar. Sabe? Para dar exemplo pras pessoas. Eu, quando vejo uma pessoa de 80 anos ir votar, ele não é obrigado a votar.

[Igor]: Não.

[Luiz Inácio Lula da Silva]: Mas quando ele vai votar é uma coisa muito, mas muito, muito legal. A mãe do Lewandowski, do Ministro Lewandowski, ela tinha 90 anos. Ela levantava com o andador dela e ia votar. Sabe, é uma coisa...

[Igor]: Muita vontade de votar.

[Luiz Inácio Lula da Silva]: Sabe por quê? Porque acredita na democracia, acredita no voto, acredita que pode melhorar. Você tem que ter esperança, cara, acreditar numa coisa boa! Não é possível que essa quantidade de candidatos que tem no Brasil não tem ninguém que mereça sua confiança.

[Igor]: Deve ter. Deve ter, deve ter, deve ter? Se olhar com cuidado, tem.

[Luiz Inácio Lula da Silva]: Olha, não seja o Lula de 78.

[Igor]: Tá.

[Luiz Inácio Lula da Silva]: Não negue a política.

[Igor]: Por falar no Lula de 78, quando tu cria ali o... quando você tá ali envolvido na criação do PT e tal, cara, eu tenho uma percepção que eu queria que você me comentasse sobre ela, que é, sabe, eu sinto que o PT, de uma forma geral, ele foi se tornando um pouco soberbo. Eu acho que foi se juntando às fileiras do PT e o PT foi abraçando uma galera, intelectuais e pessoas que... e pensadores, e grandes artistas, e não sei o quê, e talvez o PT tenha perdido a conexão com o trabalhador de fato, até porque o PT chegou muito longe: três mandatos e três mandatos e meio, vai, de Presidência da República?

É bastante coisa, é chegar muito longe, né? Você considera que o PT se tornou um pouco soberbo, que o PT se distanciou um pouco do trabalhador?

[Luiz Inácio Lula da Silva]: Deixa eu contar uma coisa primeiro. Esse Lula político que eu te falei, de 78, em 78, o presidente da República tinha como ministro um gaúcho que fez uma lei proibindo determinadas categorias fazer greve. Bancários, professor, frentista de posto de gasolina não podiam fazer greve. Aí eu resolvi ir a Brasília falar com o deputado que era um absurdo, se você quer que uma categoria seja considerada essencial e não pode fazer greve, você tem que dar um salário essencial pra ela. Não é isso?

Aí eu fui lá, quando eu cheguei lá, eu descobri que não tinha trabalhador no Congresso Nacional. Aí eu saí de lá com uma ideia de criar um partido político. Foi daí que nós criamos o partido político. E o PT já nasceu grande. Porque o PT juntou o que tinha de melhor no movimento sindical brasileiro, o que tinha de melhor no movimento social, o movimento da saúde, movimento da carestia, o PT conseguiu juntar grandes intelectuais, como Florestan Fernandes, Paulo Freire, apenas pra citar dois, Sérgio Buarque, sabe, juntar intelectuais importantes.

O PT conseguiu pegar parte da juventude que tinha ido pra luta armada nos anos 70, e essa gente toda mandava no PT. Mas quem mandava no PT era os sindicalistas. Acontece que o PT cresceu muito. Desde... Ô Igor, em 89, quando eu fui lançado candidato a presidente, eu achava que era uma brincadeira dos meus amigos. Eu falava: "Pô, como é que eu vou ser candidato a presidente com o Brizola disputando, com o Ulysses Guimarães disputando? Com o Maluf disputando, com o Afif disputando, com Mário Covas disputando, com o vice-presidente da República disputando?".

Sabe, eu fiquei pensando isso, o pessoal é louco de me indicar candidato a presidente da República. Você acredita? Eu fui segundo colocado. Então o PT foi o segundo em 89, o segundo em 94, o segundo em 98, o primeiro em 2002, o primeiro em 2006, o primeiro em 2010, o primeiro em 2014, e o segundo em 2018. E agora estamos em primeiro outra vez. Então o PT é muito grande.

[Igor]: Sempre muito grande.

[Luiz Inácio Lula da Silva]: O PT é muito grande. E o PT não é a nossa direção nacional. O PT, na verdade, tem gente muito, muito, muito importante espalhada por esse Brasil afora. Sabe? Gente do campo, gente... pescador, a parte da sociedade está vinculada ao PT. Tinha cara que pegava uma canoa, andava três dias remando pra ir numa reunião do PT no estado do Amazonas. Três dias remando. Comendo frango assado com farinha de mandioca e bebendo água do próprio rio. Então é um partido poderoso.

Obviamente que a hora que você vai crescendo, vai entrando gente nova, a família vai crescendo, a família vai crescendo. Quando você era sozinho na sua casa, você comia o melhor bife, tua mãe te dava mais denguinho, mais carinho, mas quando vem os irmãos, aí o irmão começa a dar cotovelada no outro. Então o PT foi crescendo, ficou mais confuso. Mas veja, se você fizer uma pesquisa de opinião pública e perguntar: qual o partido de sua preferência? Vai aparecer assim PT: 20% ou 22%, segundo colocado 1% ou 0%. Porque não existem outros partidos. Agora tá surgindo o PSOL. Mas um partido que aparece nas pesquisas é o PT. Porque o PT tem história e tem muito vínculo com as lutas sociais desse país. Por isso é que tem tanto ódio contra o PT.

[Igor]: Será?

[Luiz Inácio Lula da Silva]: Porque o PT é muito grande, cara.

[Igor]: Não sei se é por isso. Eu acho que o PT, de uma forma geral, ele acaba, bom, você ganha a primeira vez, aí você ganha a segunda vez, e você consegue emplacar a Dilma também, né? Então, cara, eu não sei, eu acho que... parece que o PT meio que "porra, eu sou PT, eu sou foda". Entendeu?

[Luiz Inácio Lula da Silva]: Não, não.

[Igor]: Agora eu, sei lá, eu sou... Foi uma parada que eu acho que tem a ver talvez com o que o Brown falou naquele comício. "Pô, tem que voltar pra base. Tem que falar com os cara que tá aqui no Capão Redondo" e o caralho.

[Luiz Inácio Lula da Silva]: Obviamente que isso aconteceu, o partido cresceu e o partido se afastou da sua base originária, também porque a base operária que criou o PT já não existe mais como existia nos anos 80. Quando eu era presidente do Sindicato de São Bernardo, nos anos 80, a Volkswagen tinha 44 mil trabalhadores; hoje tem sete mil. Também o mundo do trabalho não é mais o mesmo. Então mudou. Mudou a base do PT.

E o PT sabe que eu faço muita crítica. Eu deixei de ser deputado em 90 porque tinha muita gente que achava que só mandava no PT quem era deputado. Só tinha importância no PT quem era deputado. Eu resolvi deixar de ser deputado para provar que eu ia continuar tendo importância no PT, mesmo sem ser deputado, trabalhando, viajando o Brasil. Cara, quando morreu o Chico Mendes, eu estava em Cabo Verde, quando eu recebi a notícia que morreu o Chico Mendes, em Xapuri, longe pra caramba. Você desce o Rio Branco, tem que pegar mais 300 quilômetros de estrada, chovendo pra caramba. O PT não tinha dinheiro, eu falei para a tesoureira do PT: aluga o avião para pagar em 30 dias. Aí eu ia atrás de arrumar dinheiro. Pegamos o avião, fomos para lá para ficar uma hora no enterro, ficamos lá no enterro, fiz um discursinho para o Chico Mendes, voltei. Quem é que faz isso? Ninguém faz isso, cara. Só quem tem muito vínculo. Só quem tem muita relação. E o PT construiu isso.

Obviamente que você olha o PT, tem gente mais sofisticada, tem gente que já não é mais operário, tem gente que não é mais da base. E eu concordei com o discurso do Mano Brown. Eu acho que o PT não pode abandonar a periferia. Sabe, o PT não pode... os deputados do PT precisam frequentar, precisam visitar, precisam estar do lado, precisam apoiar, porque senão não há razão da gente existir, para ser igual os outros? Não precisa a gente existir.

[Igor]: Eu concordo. Eu acho que esse era o ponto, na verdade, que ele estava tentando levantar, sei lá, não sou o Mano Brown, mas imagino que tenha sido alguma coisa nesse sentido.

Cara, você estava falando antes sobre a raiva que as pessoas sentem do PT e tal, e a gente começou a falar sobre isso, pô, é que assim, a gente também observou, especialmente nas eleições de 2018, um sentimento anti-petista muito acentuado e tal, querendo ou não, aconteceram por causa de todos os escândalos de corrupção e tudo mais, e dá uma manchada ali, até porque tinha muita gente, eu lembro os cientistas políticos e jornalistas falando na época assim: pô, o PT não admite, o PT não faz o mea-culpa, o PT não está... ele não... cara, ele entrou numa vibe de porra, eu sou o PT e acabou.

[Luiz Inácio Lula da Silva]: É fantasticamente engraçado como as pessoas pediram para o PT fazer a autocrítica. Veja, se eu fizer autocrítica todo dia, eu não preciso de oposição. A oposição é que tem que me criticar. Por que eu mesmo tenho que me criticar?

O problema é o seguinte, Igor, presta atenção numa coisa. Você acha que elite brasileira engoliu de graça o PT fazer uma lei que registra empregada doméstica em carteira, jornada de trabalho, direito de férias, descanso semanal? Você acha que a direita aceitou pacificamente isso? Uma sociedade que é escravista.

Você acha que eles aceitaram com muita tranquilidade o fato de a gente fazer com que as pessoas pobres da periferia chegassem a fazer universidade? Que filho de empregada doméstica virasse médico, virasse engenheiro, virasse diplomata, virasse advogado? Quando nós criamos o Prouni e o Fies, a gente permitiu, nós saímos de três milhões e meio de estudantes na universidade para oito milhões e meio, cara.

[Igor]: A gente tem mercado pra essa galera?

[Luiz Inácio Lula da Silva]: É lógico que vai ter mercado. Esse é um processo. Na medida que a gente vai formando mão de obra mais qualificada, essa gente vai trabalhando e vai melhorando a capacidade de produção do Brasil, vai ficando mais importante as coisas que nós produzimos, a gente vai ganhar novos mercados, e a gente vai ser competitivo. E mais ainda, a gente começa a exportar inteligência, conhecimento. Não tem que exportar só soja ou minério de ferro. A gente vai exportar conhecimento, como faz o Japão, como faz a China, como faz os Estados Unidos, como faz a Coreia.

[Igor]: A gente tem um monte de gente que é formada...

[Luiz Inácio Lula da Silva]: O problema sabe o que é, Igor? O problema é que no Brasil nunca se levou a sério as camadas de baixo a chegar à universidade. Eu vou te dar um dado para você registrar, que eu falo sempre.

[Igor]: Eu me formei pelo Prouni.

[Luiz Inácio Lula da Silva]: Eu vou te dar um dado. O Peru foi descoberto em 1492, quando Colombo chegou aqui. Em 1554, o Peru já tinha sua primeira universidade. O Brasil foi descoberto oito anos depois, a primeira universidade brasileira foi 1920. Ou seja, nós demoramos 420 anos para fazer a primeira universidade. Por quê?

[Igor]: 420 universidades têm tudo a ver, pô.

[Luiz Inácio Lula da Silva]: Porque os filhos dos ricos iam estudar na França, nos Estados Unidos, eles estudavam. Como era uma sociedade escravista, para que negro precisa aprender? Índio precisa aprender? E pobre precisa aprender? Não. Esse país até 1930 só podia votar quem tivesse terra, quem tivesse dinheiro, sabe? Que era... mesmo que o cara não produzisse nada, se ele tivesse muita terra, ele virava conde, virava duque. E a gente não tinha... o analfabeto só foi começar a votar no Brasil na Constituição de 88.

Ora, o cara sabe trabalhar, o cara sabe fazer pão, o cara sabe fazer um monte de coisa, por que ele não pode saber votar? Por que ele era proibido de votar?

[Igor]: Não, mas aí também tem muita coisa errada na nossa história.

[Luiz Inácio Lula da Silva]: Você veja o atraso em que a gente está submetido: o Brasil foi o último país do mundo a fazer a Independência, o último a abolir a escravidão, o último a dar voto pra mulher. Você percebe que há uma? há uma? eu tenho um amigo meu que é jornalista e ele tem um sítio em Porangaba. Porangaba é indo pra? pra Sorocaba. Quando esse cara resolveu dar décimo terceiro salário para os funcionários dele, o restante dos sitiantes se rebelaram! "Cara, como é que você vai dar décimo terceiro, vai dar férias, sabe? Todo mundo vai querer!". Ele arrumou inimigo por conta disso.

Agora, você imagina a gente colocar os pobres pra ir pro aeroporto de Congonhas viajar de avião? Ou Galeão, ou Guarulhos? O que a classe média alta falava: "Pô, esse caras, o aeroporto tá virando uma rodoviária, tá cheio de pobre que não sabia nem sentar no avião". Sabe, o que nós fizemos foi o seguinte: nós fizemos a maior política de inclusão social que esse país já conheceu desde que foi descoberto.

[Igor]: E, na prática, por que eles conseguiam pegar o avião? O que mudou?

[Luiz Inácio Lula da Silva]: Eles passaram a ganhar mais, o salário mínimo aumentava todo ano, o pequeno agricultor começou a ganhar mais porque a gente dava mais dinheiro; quando eu cheguei na Presidência, o Pronaf era cinco bilhões, só liberava dois bilhões. Quando nós deixamos o governo, era 30 bilhões. Então a gente criou programa pra comprar alimento, a gente comprou o PNAE pra comprar alimento e dar pras pessoas mais pobres nas escolas, ou seja, nós fizemos um programa de inclusão social, nós criamos o Pronaf Mulher, a mulher recebia o dinheiro, o Minha Casa Minha Vida, a escritura era dada no nome da mulher. Sabe?

O Bolsa Família, o cartão era no nome da mulher. Porque a gente inverteu um pouco a lógica de achar que os pobres não podem subir um degrau na ascensão social. É preciso as pessoas compreenderem. Nós tiramos 36 milhões de pessoas da miséria absoluta, acabamos com a fome nesse país, que voltou agora poderosamente forte, e nós conseguimos colocar 42 milhões de pessoas com padrão de classe média baixa.

A coisa mais orgulho que eu tinha é quando eu chegava no Nordeste, os caras falavam: "Ô Lula, encostei o meu jumento e comprei uma motocicleta!". O governador do Ceará me contou que ele encontrou oito mil jumentos abandonados.

[Igor ri]

[Luiz Inácio Lula da Silva]: Sabe? Ele teve que tirar um lugar pra guardar o jumento, porque o cara evoluiu! Ô Igor, ninguém quer ser pobre, cara.

[Igor]: Isso com certeza.

[Luiz Inácio Lula da Silva]: Ninguém quer ser pobre, ninguém quer comer mal, ninguém quer se vestir mal, todo mundo quer ter as coisas. Por que o cara é pobre? Porque não teve uma oportunidade. Ele não teve chance.

[Igor]: É como é que a gente vai fazer agora? Porque assim, em dois mil e... Quando tu se elege, em 2002 lá, você, podemos dizer que você deu uma sorte ali com o boom das commodities coincidindo com o teu governo... tá, assim, você vai comentar, mas, cara, agora a gente tá num momento completamente diferente, e você tá dizendo, pelo que você tem dito, pelas coisas que você tem falado e tal, é que dá pra voltar pra um patamar parecido que a gente estava ali, que foi possível aí na... de 2002 a 2010.

Qual que vai ser, o que é o motor, agora, dessa vez? O que vai fazer a gente conseguir aí a tal da picanha, a tal da cerveja?

[Luiz Inácio Lula da Silva]: Então deixa eu falar pra você uma coisa. Se criou o fetiche de que "ah, o Lula deu certo porque teve o boom das commodities". Por que não deu certo pro Fernando Henrique Cardoso?

[Igor]: Porque meio que estava... Começou ali em dois mil e pouquinho, né?

[Luiz Inácio Lula da Silva]: Nada! É porque sabe o que acontece? É porque meio nós fizemos com que as coisas acontecessem colocando o pobre dentro do orçamento. Você sabe quantos milhões de empregos nós criamos no nosso governo? 22 milhões de empregos com carteira assinada. Você sabe quantos meninos foram estudar no exterior? Cem mil meninos foram fazer curso no exterior. Fazer pós-graduação.

[Igor]: Mas precisa de grana pra isso.

[Luiz Inácio Lula da Silva]: Nós fizemos 19 universidades federais novas e 178 campus avançados. Nós saímos de 140 escolas técnicas para 422. Houve uma revolução nesse país. Uma revolução! Pela primeira vez, os pobres começaram a se sentir participantes e se transformar em sujeito da história.

Os catadores de material reciclável, eu levei eles dentro do BNDES pra tomar um empréstimo de 200 milhões de reais. Por que só emprestar dinheiro pro grande e não emprestar pro pequeno? Emprestar pra cooperativa deles. Emprestar dinheiro pra cooperativa, sabe, de quebradeiras de coco do babaçu, pras bordadeiras do Piauí, pras bordadeiras do Rio Grande do Norte. Agora, quando eu voltar, a gente vai abrir linha de crédito muito grande para que a gente possa investir em micro e pequenos empreendedores.

Se o cara tiver, se o cara for um Igor, se o cara tiver inteligência de fazer o que você faz, sabe, na internet, ou seja, ele vai ter financiamento pra trabalhar, pra começar. Se ele quiser montar um restaurante, um bar, uma oficina de motocicleta, de bicicleta, de carro, o que ele quiser fazer, ele vai ter crédito. Ele vai ter crédito, porque nós precisamos agora, já que o emprego de hoje não é tão fácil como o emprego de 1980, nós vamos querer explorar a criatividade do povo brasileiro dando a ele oportunidade. Siga em frente, cara, vença! Você tá tendo a oportunidade, vai embora. É isso que eu vou fazer.

[Igor]: E como é que tu vai fazer isso? Precisa sair dinheiro de algum lugar, cara.

[Luiz Inácio Lula da Silva]: Não. Os bancos públicos existem pra isso. O BNDES existe pra isso, a Caixa Econômica existe pra isso, o Banco do Brasil existe pra isso, o BNB existe pra isso, o Basa —Basa é o Banco da Amazônia, BNB é o Banco do Nordeste.

[Igor]: Tá.

[Luiz Inácio Lula da Silva]: Sabe, é utilizar o dinheiro desses bancos públicos, sabe, pra financiar a produção, pra financiar a evolução desse país. Sabe? Até porque nós queremos ser exportador de inteligência. Então, como é que a gente vai fazer? Fazendo.

[Igor]: O bagulho era segurar essa inteligência aqui, hein, Lula.

[Luiz Inácio Lula da Silva]: Quando teve a crise em 2008, uma crise poderosa, que chegou a quebrar o banco Lehman Brothers, nos Estados Unidos, que foi uma crise desgraçada. Eu disse: "Isso aqui é uma marolinha no Brasil". Todo mundo tirou sarro da minha cara. A Miriam Leitão me criticou muito. O que aconteceu? O Brasil foi o último país a entrar na crise e o primeiro a sair. Um ano depois da crise, a gente estava crescendo 7,5% ao ano. E no varejo, crescia 13%. Eu aumentava o salário mínimo todo ano. Todo ano, não era reajuste da inflação. Era o reajuste da inflação mais aumento real.

90% dos trabalhadores que trabalham em categorias organizadas, químico, gráfico, metalúrgico, todo esses caras recebiam aumento real acima da inflação. Hoje não recebem. Veja quanto cresceu a economia. O Bozo fica dizendo todo dia: "Não, porque a economia tá bombando, a economia tá bombando". Eu não sei se tá bombando no cartão de crédito dele, no cartão corporativo dele, sabe? Porque no povo, hoje foi divulgado, o Brasil vai crescer 1%. Sabe quanto o Brasil cresceu no meu mandato? 4% ao ano.

[Igor]: Mas tá no meio de uma crise, de uma guerra.

[Luiz Inácio Lula da Silva]: Que guerra? A guerra não tem nada a ver conosco.

[Igor]: Como é que não, cara?

[Luiz Inácio Lula da Silva]: Querer jogar a culpa nossa na guerra da Ucrânia já é demais.

[Igor]: Você acha?

[Luiz Inácio Lula da Silva]: Eu acho que é demais. Veja, até porque eu estava criando uma fábrica de ureia em Três Lagoas, em Mato Grosso do Sul, eles fecharam. Estava fazendo uma fábrica de amônia em Uberaba, eles fecharam. A fábrica de fertilizante em Sergipe, eles fecharam. Fábrica de fertilizante no Paraná, eles fecharam.

[Igor]: Tá dizendo que você começou a tentar tornar a gente autossuficiente em fertilizante?

[Luiz Inácio Lula da Silva]: É preciso ser autossuficiente! O Brasil tem condições de ser autossuficiente. Por que o Brasil não virou? Porque nunca houve tanto interesse do pessoal porque era muito barato importar fertilizante.

[Igor]: É verdade.

[Luiz Inácio Lula da Silva]: Então agora o pessoal tá se dando conta. O Brasil é o terceiro produtor de alimento do mundo.

[Igor]: E a gente não tem fertilizante.

[Luiz Inácio Lula da Silva]: O Brasil pode chegar a ser o primeiro. O Brasil é o maior criador de gado do mundo. O Brasil é o maior, sabe, produtor de proteína animal do mundo. Sabe? Então nós temos que cuidar disso, cara. Nós temos que cuidar disso com muito carinho. E nós precisamos cuidar disso sem derrubar uma árvore na Amazônia. Sem derrubar uma árvore no Pantanal.

O que nós precisamos é aprender de forma civilizada que uma agricultura de baixo carbono vai ser muito mais rentável para o Brasil, e eu posso te dizer, Igor, com todo o carinho: o homem do agronegócio, o produtor profissional, ele não derruba mata. Quem derruba mata é transgressor.

[Igor]: Mas isso já tá meio que vencido mesmo, porque hoje em dia se você não tem, se você não tem uma pecuária verde, as pessoas, os outros países nem compram a tua carne.

[Luiz Inácio Lula da Silva]: Veja, não é só a carne verde. Você vai falar assim, se você não explicar, sabe, os caras pensam que vai ter boi verde. O boi é o seguinte, é o boi que vive no pasto comendo grama, sabe? Esse é o chamado boi verde. Veja, é preciso você fazer isso levando em conta que tem muitas formas de você criar. Não precisa ser tudo em campo aberto. Você pode ter confinamento. Aquela carne que o Bolsonaro estava comendo outro dia, 1.200 reais a picanha, do Japão, aquele boi é criado no confinamento ouvindo música clássica, a quinta sinfonia de Beethoven. Aí a carne nasce macia.

Aqui no Brasil a gente compra picanha de dois quilos. Não existe picanha de dois quilos porque é colchão duro, cara! Picanha é 700 gramas, 800 gramas.

Então, deixa eu te falar, o Brasil pode muitas coisas. A gente pode fazer, nós temos 30 milhões, 30 milhões de hectares de áreas degradadas, de pastos abandonados. O que você tem que fazer? Recuperar essa terra e plantar o dobro do que você planta hoje sem precisar derrubar uma árvore do Pantanal, uma árvore na Amazônia. O que nós precisamos saber é que a riqueza da Amazônia está na exploração da biodiversidade da Amazônia. Para que a gente possa fazer com que a indústria de fármaco cresça, a indústria de cosmético cresça, e a gente possa melhorar a qualidade de vida do povo da Amazônia. E nós precisamos compartilhar com o mundo.

O Brasil é dono da Amazônia, o território é soberano nosso. Mas a gente pode compartilhar conhecimento científico com o mundo inteiro! Sabe? Pra quê? Pro bem da humanidade. Já tá provado, já tá provado que a questão climática não é uma coisa qualquer hoje, é uma coisa muito séria. Muito séria! E se a gente não cuidar, a gente tá cavando a nossa própria cova, o nosso próprio enterro

[Igor]: A gente já sabe disso, a gente já toma... por exemplo, a gente já consegue, já tem parques eólicos bastante avançados.

[Luiz Inácio Lula da Silva]: Já sabe disso, mas até outro dia tinha o ministro do Bolsonaro que falava que ia derrubar tudo e invadir a Amazônia.

[Igor]: Não vi isso, cara. Mas eu não vou duvidar, não.

[Luiz Inácio Lula da Silva]: Você sabe o ministro do Bolsonaro que falava que era preciso...

[Igor]: O Salles.

[Luiz Inácio Lula da Silva]: Não quero falar nome, porque não gosto de falar nome de adversário.

[Igor]: Tá bom. Desculpa, deixa que eu falo.

[Luiz Inácio Lula da Silva]: Você percebe? É uma coisa desnecessária. Eu sou contra você só proibir, você tem que discutir como fazer as coisas bem feitas. O que é melhor? O que dá mais dinheiro? O que vai dar mais? Segundo estimativa de pessoas ligadas ao assunto, tem três trilhões de dólares para ser gastos com a questão, sabe, do sequestro de carbono, com a boa agricultura, para a gente poder equilibrar o planeta. Se isso é verdade, vamos tentar trabalhar essa coisa. E é uma coisa que eu vou fazer, pode ficar certo que eu vou fazer, você vai ter orgulho de visitar a Amazônia e falar: Pô, esse Lula é porreta mesmo.

[Igor]: Então tá. Tu vai liberar jamba no primeiro ou no segundo mandato? A ervinha do mal?

[Luiz Inácio Lula da Silva]: Deixa eu te falar...

[Igor] [risos]

[Luiz Inácio Lula da Silva]: Essa não é uma questão que o governo tem que tratar, essa é uma questão que ou o Congresso Nacional trata, ou...

[Igor]: Eu concordo, eu tô brincando.

[Luiz Inácio Lula da Silva]: Ou a Suprema Corte cuida disso. É só isso. Veja, deixa eu te contar uma história.

[Igor]: Isso aqui é um paiero, tá, família? Eu nem fumo, tá?

[Luiz Inácio Lula da Silva]: A questão que eles falam todo dia: Ah, o Lula vai fazer banheiro unissex. Já ouviu falar isso, né?

[Igor]: Já. Parece absurdo.

[Luiz Inácio Lula da Silva]: É absurdo. Esses caras não têm respeito. Eu sou pai de cinco filhos, tenho oito netos, dos quais quatro meninas, e tenho uma bisneta. Esses caras pensam que podem mentir de qualquer jeito e as pessoas acreditarem? Não é possível as pessoas terem o desplante de contar uma mentira dessa no microfone dentro de uma igreja.
[Igor]: Tá. Então você tá dizendo que...

[Luiz Inácio Lula da Silva]: Ou seja, uma igreja é um lugar para a gente ir para rezar, para a gente tratar da nossa espiritualidade. A igreja não é um lugar que você vai para mentir.

[Igor]: Ou para fazer campanha.

[Luiz Inácio Lula da Silva]: Para cometer pecado e fazer campanha, falar mal dos outros. Sabe, uma mulher, uma família quando sai de casa com seus filhos que vai na igreja, ela vai tratar da sua espiritualidade, ela vai tratar da fé da família. Por que o cara tira proveito para fazer política barata, nojenta e mentirosa?

[Igor]: Bom, aí eu concordo que não devia ser um lugar para fazer campanha também, não.

[Luiz Inácio Lula da Silva]: Agora, sempre que você puder, cara, aproveita o microfone e dá porrada nisso, senão a gente não conserta esse país. Você não pode criar uma sociedade mentirosa.

[Igor]: Mas eu dou porrada nisso, cara.

[Luiz Inácio Lula da Silva]: Isso é bom. Se o PT errar, dê porrada no PT também.

[Igor]: Eu dou porrada no PT também. Deixa eu te falar, a gente percebe que em 2018... na verdade, essa é minha análise, tá? Aí vamos ver o que você pensa sobre isso. Em 2018, cara, quando o Bolsonaro é eleito, você considera que ali o Bolsonaro ganhou a eleição ou o antipetismo ganhou a eleição?

[Luiz Inácio Lula da Silva]: Ali eu considero que a sacanagem que fizeram comigo e me prenderam fez com que ele ganhasse as eleições.

[Igor]: Você acha que se fosse o cara, tu ganhava?

[Luiz Inácio Lula da Silva]: Ganharia as eleições no primeiro turno.

[Igor]: Sério?

[Luiz Inácio Lula da Silva]: Sério. Quando me prenderam, eu cresci quinze pontos na pesquisa de opinião pública.

[Igor]: Mas porque te prenderam.

[Luiz Inácio Lula da Silva]: Sabe o que acontece, cara, eu saí do governo com 87% de bom e ótimo, com 10% de regular, e 3% de ruim e péssimo. Com todas as mentiras contadas a meu respeito. Igor, você sabe...

[Igor]: Quando tu saiu estava tudo ótimo.

[Luiz Inácio Lula da Silva]: Você sabe que eu tive 13 horas de Jornal Nacional contra mim? Sabe que eu tive 60 páginas de revistas contra mim? Sabe que eu tive 680 primeiras páginas de jornais contra mim?

[Igor]: É por isso que tu falar sobre regular a mídia, cara?

[Luiz Inácio Lula da Silva]: Eu não falo em regular a mídia.

[Igor]: Daqui a pouco a gente fala sobre isso.

[Luiz Inácio Lula da Silva]: Vamos discutir isso também. O que eu falo é o seguinte: é que é preciso dizer a verdade sempre. Eu se fosse um cara que tivesse cometido o erro, eu teria saído do Brasil. Eu recebi convite para ir embora do Brasil, para ir pra uma embaixada. Como eu queria provar que o Moro é um farsante, falei: Não, vou pra Curitiba. Contra a vontade de muita gente, contra a vontade dos meus companheiros do sindicato, dos meus filhos, do meu partido. Eu falei: Não, eu vou pra lá, eu preciso provar que eles são mentirosos. E ainda contratei um advogado que não é criminalista.

[Igor]: Hum.

[Luiz Inácio Lula da Silva]: É. Contratei um advogado... você não sabe como eu fui criticado. O Lula pegou um jovem que não entende de criminalista, ele não entende não sei das quantas...

[Igor]: Tu estava tentando ser preso?

[Luiz Inácio Lula da Silva]: Eu falei: É esse que eu quero. Eu brinco muito com os advogados, que eu falo o seguinte: Advogado criminalista não sabe defender inocente. O cara tem que ser culpado para ele poder dar o discurso pro cara. Eu não, eu estava muito à vontade. Eu falei: Eu vou provar. Você está lembrado o primeiro depoimento em Curitiba? Eu falei o seguinte: Juiz, você está condenado a me condenar porque você já mentiu demais.

[Igor]: Eu lembro.

[Luiz Inácio Lula da Silva]: E aconteceu exatamente o que eu previa. Então, veja, eu me preparei espiritualmente, psicologicamente, para sair da cadeia. Quando tentaram insinuar que eu deveria fazer um acordo para sair para minha casa, com tornozeleira, eu falei: Eu não troco a minha dignidade pela minha liberdade. Não vou colocar tornozeleira porque eu não sou pombo-correio. E a minha casa não é prisão.

A Janja tá ali, minha mulher, ela chorou pra cacete, que ela queria que eu aceitasse ir pra casa com tornozeleira, meus filhos queriam que eu fosse pra casa, o partido queria que eu fosse pra casa. Não, Lula, sai, vai pra casa. Não, não vou sair pra casa, não. Eu vou sair pra casa quando estiver decretada a minha inocência. Quem me prendeu que assuma a responsabilidade. Por que eu vou sair pra minha casa pro pessoal ficar me xingando? E essa canelinha que mamãe pôs no mundo, pra poder colocar tornozeleira? Não, cara, não é assim que se brinca comigo.

[Igor]: Entendi.

[Luiz Inácio Lula da Silva]: Então, eu fui pra lá, o PT ficou muito desgastado, a companheira Gleisi foi uma mulher da mais alta competência e coragem, porque ela enfrentou, sabe, a gente não aceitou, não tem negociação comigo. Eu quero ser julgado. Quero ser julgado. Porque o Moro é mentiroso. A sentença que ele me condenou, a qual foi o crime que eu cometi? Um ato indeterminado. Pergunta para algum advogado o que é um ato indeterminado. Ninguém sabe o que é, só ele.

[Igor]: É isso que está no processo?

[Luiz Inácio Lula da Silva]: É isso que está no processo. O crime que eu cometi é um ato indeterminado. Então, Igor, o partido foi muito castigado. O partido foi muito castigado.

[Igor]: Mas depois tu foi confirmado isso numa outra...

[Luiz Inácio Lula da Silva]: Houve problema de corrupção na Petrobras? Deve haver, porque a Petrobras tem 82 mil trabalhadores, a Petrobras tem milhares engenheiros, a Petrobras tem milhares de servidores, milhares de pequenas e médias empresas, obviamente que pode ter corrupção. Quando você descobre a corrupção, o que você faz? Prende o ladrão. Mas não prejudica os trabalhadores.

[Igor]: Idealmente.

[Luiz Inácio Lula da Silva]: Você sabe o prejuízo que a Lava Jato deu ao mundo do trabalho? Quatro milhões e 400 mil pessoas perderam o trabalho na indústria de óleo e gás, na indústria de engenharia nesse país; 270 milhões deixaram de ser investidos, e o Estado deixou de arrecadar 58 bilhões em impostos.

[Igor]: Mas será que não é por que estava? Não estou defendendo, não, mas será que não é porque estava tão generalizada a parada que não teve jeito?

[Luiz Inácio Lula da Silva]: Deixa eu te falar, se você defender, eu não acho ruim, porque pela quantidade de informações que a pessoa recebeu? O grave é que o Moro conseguiu convencer a imprensa, e o Dallagnol de que as mentiras que eles contavam eram verdades. Aí eles tinham jornalistas na Folha, no Estadão, no jornal O Globo, na TV Globo, SBT, Record, eles tinham. Então era um processo de massificação. Então eu não condeno as pessoas que acreditavam, não. Porque as pessoas não tinham nem chance de pensar.

Agora, eu precisava provar o contrário. Eu precisava provar, e, graças a Deus, eu provei, saí da cadeia maior do que entrei, e estou aqui na disputa. Eu tenho certeza que meus adversários jamais imaginavam que eu ia estar na frente deles. Jamais imaginavam.

[Igor]: Assim, tu acabou, estava sendo investigado, um monte de processo, se não me engano, dos quatro principais que são? o lance, duas coisas, dois processos têm a ver com o Instituto Lula, o lance do triplex e o lance do sítio em Atibaia, desses quatro, parece que dois foram? tem que começar de novo, né?

[Luiz Inácio Lula da Silva]: Eu fiquei livre dos 26 processos que tiveram contra mim, fiquei livre, sabe, em dois processos votados na ONU, um em Genebra e um, sabe, e o outro também em Genebra pela ONU, e fui absolvido pela Suprema Corte. Ou seja,
não tem mais processos contra mim. Não tem mais processo.

[Igor]: Absolvido é forte, Lula.

[Luiz Inácio Lula da Silva]: Foi anulado.

[Igor]: Isso.

[Luiz Inácio Lula da Silva]: E aí o William Bonner foi muito decente

[Igor]: Foi, eu assisti.

[Luiz Inácio Lula da Silva]: Quando eu fui ao debate, ele falou: "Presidente, o senhor não deve nada à Justiça. Tá?" Porque eu venci 26 processos. Aquele famoso processo do PowerPoint, que eu tinha montado uma rede de quadrilha, aquele processo, sabe, eu ganhei aquele processo em Brasília. Eu pensei que iam acabar todos quando eu ganhei aquele, mas não, eles continuaram, porque o objetivo era me tirar das eleições. Esse era o problema. Então, Igor, é o seguinte, eu voltei sem mágoa.

[Igor]: Sem mágoa?

[Luiz Inácio Lula da Silva]: Esse coração velho está apaixonado.

[Igor]: Lula, esse é um medo que eu tenho, cara, de tu estar meio vingativo.

[Luiz Inácio Lula da Silva]: Não tenha, não, porque eu não tenho idade e nem posso utilizar um cargo para ser vingativo. Eu voltei porque eu acredito que é possível melhorar a vida do povo brasileiro. Eu voltei porque eu quero cuidar da família. Eu vivi com minha mãe, minha mãe largou do meu pai com oito filhos, e ela cuidou dos oito filhos com a maior decência do mundo, todos pobres, mas honrados. Eu fui o primeiro filho da minha mãe a ter um diploma primário, a ter um diploma de curso técnico. Por conta disso, eu fui o primeiro a ter uma casa, o primeiro a ter uma televisão, o primeiro a ter uma geladeira, sabe? Então, eu prezo muito essa questão da família, da criação, da educação, da mãe.

Eu fui criado numa geração em que a mãe da gente era uma deusa, a gente não respondia, a gente não falava: "O quê?" A gente não falava "O quê?", não! Tinha que falar: "Senhora?", sabe? Eu sou um cara, que uma das coisas que eu adoro, a Janzinha, que ela pedia bênção para a mãe dela antes de dormir. Todo dia. E pedia bênção a hora que acordava. Eu acho isso bonito pra caramba. "Bênção, mãe. Bênção, pai". Hoje você não vê mais isso. Você não vê mais isso também porque as pessoas não cuidam muito, com muito respeito, então, eu gosto da questão da família, eu gosto, sabe, você não sabe a loucura que era a minha família de final de semana, era todo mundo junto. Todo mundo junto, discutia-se futebol, discutia-se qualquer coisa.

[Igor]: Inclusive amanhã tu vai ficar triste, né, cara?

[Luiz Inácio Lula da Silva]: Hein?

[Igor]: Amanhã tu vai ficar triste.

[Luiz Inácio Lula da Silva]: Por quê?

[Igor]: Porra, tem o Corinthians e Flamengo amanhã, pô.

[Luiz Inácio Lula da Silva]: Ó, vou lhe contar uma coisa?

[Igor]: Flamengo e Corinthians.

[Luiz Inácio Lula da Silva]: Vou lhe contar uma coisa: o Coringão vai massacrar o Flamengo.

[Risos, falatório]

[Luiz Inácio Lula da Silva]: A Janja...

[Igor]: Tu não falou que político não mente, porra?

[Luiz Inácio Lula da Silva]: A Janja é flamenguista, e você vai ver: o Corinthians vai ganhar a Copa do Brasil. Contra o Flamengo. E se o Flamengo vacilar, vai perder do Athletico Paranaense e não vai ser nem...

[Igor]: Porra, não vai, não tem como, não?

[Luiz Inácio Lula da Silva]: ? da Libertadores.

[Igor ri]

[Igor]: Não tem como não, cara.

[Luiz Inácio Lula da Silva]: Mas viu, ô Igor, uma coisa é importante, olha, deixa eu dizer uma coisa pra você: uma coisa muito importante é que eu valorizo muito as pessoas que vencem na vida, cara. Eu, quando vejo um cara como você ter o sucesso que tem, ver outras pessoas em? menores, sabe, crescerem, quando eu vejo um moleque pobre ficar futebol... ficar famoso no futebol, eu acho aquilo? extraordinário.

[Igor]: Tu ficou puto com o Neymar?

[Luiz Inácio Lula da Silva]: Por quê?

[Igor]: Porque ele fez lá o 22 e tal?

[Luiz Inácio Lula da Silva]: Não! Não fico puto, o Neymar tem o direito de escolher o que ele quiser pra ser presidente.

[Igor]: Tá. Mas desculpa, continua.

[Luiz Inácio Lula da Silva]: Eu acho que ele tá com medo que, se eu ganhar as eleições, eu vá saber o que é que o Bolsonaro perdoou da dívida do imposto de renda dele, eu acho que é isso que ele tá com medo de mim.

[Risos]

[Igor]: Caralho, pesado!

[Luiz Inácio Lula da Silva]: Ele agora... Obviamente que o Bolsonaro fez um acordo com o pai dele.

[Igor]: Não sei.

[Luiz Inácio Lula da Silva]: E ele agora tá com um problema com o imposto de renda na Espanha.

[Igor]: Tá, tá?

[Luiz Inácio Lula da Silva]: Sabe? Mas isso não é um problema do presidente, é um problema da Receita Federal, e não meu.

[Igor]: É. Cara, a gente estava falando um pouco da— sobre fake— na verdade, a gente falou um tanto sobre fake news e tal, mas, cara, tá rolando agora um inquérito, o Inquérito 4.781, que é o inquérito das fake news. Basicamente aí, o STF instaurou essa parada aí, eles meio que se sentiram atacados e... Foi o Dias Toffoli que instaurou essa parada, pouco tempo antes de sair, tal, ele mesmo apontou o Alexandre de Moraes, tem uma certa discussão se isso é sequer legal e tal, mas, cara, particularmente eu acho que, pra sociedade, isso é um assunto, além de espinhoso, ele é um assunto muito perigoso, porque ó, eu não sei se eu confio o que— a decisão do que é fake news ou não a um— ao governo, à mão de um político.

[Luiz Inácio Lula da Silva]: Então, mas deixa eu te contar uma história: vamos colocar esse debate na mão da sociedade.

[Igor]: Vamos.

[Luiz Inácio Lula da Silva]: A gente não tem que ter medo do debate, vamos definir o que é fake news e o que não é. Você não pode utilizar um instrumento poderoso...

[Igor]: Você acha que a sociedade se envolve nessa definição, né?

[Luiz Inácio Lula da Silva]: Nós temos que fazê-la discutir.

[Igor]: Tá.

[Luiz Inácio Lula da Silva]: Veja, você não pode criar um instrumento poderoso? sabe?

[Igor]: Pode virar censura.

[Luiz Inácio Lula da Silva]: Quando esse mundo digital e deixar à revelia pra cada um fazer o que bem entende.

[Igor]: Fake news é algo velho, é que agora tá potencializado.

[Luiz Inácio Lula da Silva]: Não, veja: a mentira é uma coisa antiga.

[Igor]: É.

[Luiz Inácio Lula da Silva]: Até sofisticou de fake news.

[Igor]: É.

[Luiz Inácio Lula da Silva]: Isso graças ao Trump.

[Igor]: É, é, é?

[Luiz Inácio Lula da Silva]: Mas veja, deixa eu lhe falar uma coisa: é que, antigamente, você contava um mentira, você chegava pro teu pai, falava: "Ô pai, eu fui bem na escola, meu boletim só tem dez!", e você só tinha vermelho no boletim, não tinha passado, e só você e teu pai sabiam. Agora, não. Agora o cara se tranca no quarto dele, e pega o seu celular, e fala mal da mãe de todo mundo, do pai de todo mundo, sem nenhuma responsabilidade!

A gente não pode? o cara promove a morte, promove a violência, promove o tumulto; não é possível! Ao invés de a gente chamar, sabe, rede? rede social, sabe, não é uma rede social, porque tem muita coisa que não é social. Então, é preciso que as pessoas saibam o que é que é normal.

[Igor]: Já parou pra pensar sobre qual seria a melhor maneira de fazer isso aí? Porque, ó, uma das ideias e das propostas que eu já ouvi é: "Cara, pra ter um perfil no Twitter ou sei lá o quê, tu precisa registrar um documento", por exemplo. Fica mais difícil do cara... aí, quando o cara falar uma parada, meio que todo mundo sabe quem é.

[Luiz Inácio Lula da Silva]: Então, mas deixa eu te perguntar: mas você não acha que é bom a gente saber quem é?

[Igor]: Eu acho, eu acho.

[Luiz Inácio Lula da Silva]: Eu era presidente, tinha um grupo, assim, "Morte ao Lula"—

[Igor]: Depende, na verdade.

[Luiz Inácio Lula da Silva]: "Morte ao Lula."

[Igor]: Horrível.

[Luiz Inácio Lula da Silva]: Você acha que é normal, isso?

[Igor]: Não. Mas lugares onde a democracia não existe?

[Luiz Inácio Lula da Silva]: Você sabe a quantidade de mentiras? "Você sabe que meu filho é dono da JBS?" "Você sabe que meu filho, a universidade do. de Piracicaba, a Esalq, aquela coisa bonita, é a casa do meu filho?" "Você sabe que meu filho tem um carro de ouro que apareceu no Uruguai?" É tudo fake news! Tudo mentira! E como é que você pode permitir que as pessoas façam isso sem que haja nenhum critério de punição ou de proibição disso?

[Igor]: Concordo que precisa de um debate.

[Luiz Inácio Lula da Silva]: Nós temos que confiar na sociedade. Vamos fazer um debate. Faz um debate na sociedade e vamos tentar discutir qual é o melhor caminho pra que você não seja censurado, pra que você não confunda uma coisa que você fala que é correta, que é uma divergência política, uma divergência cultural, sabe, com uma provocação, com uma mentira deslavada. Por exemplo...

[Igor]: Existem pessoas estão sendo... por exemplo, pessoas... como, vou citar aqui alguém bem controverso que eu nem concordo, mas, pô, tem o Allan dos Santos, por exemplo, que foi extirpado das redes sociais, tem o velho da Havan, extirpado das redes sociais também. Eu não sei se isso é... se isso é benéfico.

[Luiz Inácio Lula da Silva]: Você não precisa extirpá-lo, você só tem que educá-lo! Ele tem que saber que ele não pode fazer o que ele quer. Tem um limite. A democracia tem um limite. A democracia te permite ter um espaço desde que você não atente contra os outros. Sabe? As provocações que existem, as mentiras são coisas tão absurdas, Igor, que nós temos que encontrar um jeito. E quem vai dar o jeito são pessoas como você, que são especialistas nesse mundo digital. Não é o Lula, que eu sou um cara ainda analógico.

[Igor]: Você não tá pensando no Brasil com a indústria 4.0?

[Luiz Inácio Lula da Silva]: Eu penso, eu penso. Eu penso, tudo que eu penso, não, eu acho que nós temos que nos preparar pra isso. Eu vou contar uma coisinha. Houve, em maio, desse ano, houve uma discussão no Instituto Lula, e eles criaram uma cartilha Lula Play. Sabe, Janjinha? Cartilha Lula Play. Então o que nós propusemos? Regulamentar a profissão de desenvolvedor como garantia de direito para os trabalhadores da indústria. Criar cursos técnicos e de ensino superior para desenvolvedores de jogos. Revisar a legislação de banda larga para extinguir o limite de consumo de dados e melhorar a velocidade da conexão. Incentivos fiscais e financiamento adequado para criação de novas empresas do setor. Sacou? Sacou que nós estamos atinados a esses problemas? Porque é o novo mundo.

[Igor]: Dá pra gente ser protagonista?

[Luiz Inácio Lula da Silva]: É o novo mundo do trabalho. Hoje quando você vai discutir a questão de emprego, o que eu tô propondo? Que a gente junte os empresários, eu já conversei, inclusive, o Josué da Fiesp, você junta as universidades para que a gente discuta esse mercado de dados, essa loucura digital. Como é que a gente vai preparar essa juventude pra usar bem se eles não têm possibilidade de estudar? Por isso é que eu vou voltar a criar o Prouni, o FIES, sabe? Eu quero que a molecada estude engenharia! Pra molecada saber, ser todo mundo campeão em game, ser todo mundo fazedor de software. Porque é assim que o Brasil vai crescer.

[Igor]: Porque a outra, as outras indústrias, a gente vê que já perdeu o bonde. Talvez agora na indústria 4.0, que seja tudo isso aí que você tá falando, desenvolvedor, inteligência artificial e tudo mais, seja onde a gente possa ser protagonista mesmo, até porque a gente tem a chance de sair dessa crise numa posição vantajosa, que eu já conversei com alguns economistas.

E esse é um outro ponto, conversei com alguns economistas e eles consideram que a gente tá hoje numa posição vantajosa em relação a outros países nessa crise que tá rolando no mundo.

[Luiz Inácio Lula da Silva]: Deixa eu te falar, nós estamos vantajosa com relação a América do Sul, mas veja, a China e os Estados Unidos é que são os donos da bola. Mais a Coreia.

[Igor]: Mas a China tá enfrentando agora uns problemas também.

[Luiz Inácio Lula da Silva]: O que precisa é o Brasil se entender como um país grande. E que, portanto, nós temos que colocar a nossa juventude pra estudar, se aperfeiçoar, sabe, e mandar muita gente estudar lá fora em universidades, sabe, pra que a gente seja competitivo, pra que a gente possa disputar mercado.

[Igor]: Concordo.

[Luiz Inácio Lula da Silva]: Esse é o Brasil do futuro. Esse é o Brasil, Igor, que tá mais na tua mão do que na minha.

[Igor]: Na minha? Tu que vai virar presidente, pô.

[Luiz Inácio Lula da Silva]: Não precisa virar presidente, basta ser um ser humano criativo e um ser humano propositivo. Cada um de nós pode contribuir com umas coisas no mundo que a gente tá, no lugar que a gente tá. A única coisa que a gente não pode é ser passivo. A única coisa que a gente não pode é ser neutro, "eu sou neutro, eu não gosto disso, não gosto daquilo", não, cara. Sabe o que eu digo pra juventude? Eu digo o seguinte: "Você não gosta de política? Você acha que todo mundo é ladrão? Você acha que todo mundo é corrupto? Só você é honesto? Então entra você na política, pô. Vá você fazer as coisas. Seja eleito deputado. Porque é assim...

[Igor]: Se chegar lá, fodeu também, pô.

[Luiz Inácio Lula da Silva]: É assim que a gente conserta o mundo, Igor. Eu tenho um radialista muito famoso aí que vivia querendo ser prefeito, sabe? E quando tem enchente num lugar, ele fala: "Cadê o prefeito? Cadê o perfeito?". A Marta Suplicy foi pra Paris, e São Paulo tá cheio. Eu falei: "Seja candidato a prefeito. Eu quero saber se você vai beber água quando der enchente". Porque a natureza, cara, quando ela se movimenta, ela passa por cima de tudo que você acha que não vai acontecer.

Então é preciso que a gente tenha um pouco de cuidado ao fazer o julgamento das pessoas. Sabe? Não tem ninguém 100% bom nem tem ninguém 100% ruim. Todo mundo tem um pedaço bom e um pedaço ruim.

[Igor]: Ninguém é puro.

[Luiz Inácio Lula da Silva]: Eu, no meu caso, meu pedaço bom é melhor.

[Igor]: Cara, a Gleisi tá falando ali de horário, como você tá?

[Luiz Inácio Lula da Silva]: Eu não sei se vocês querem acabar agora.

[Igor]: Pelo menos tem umas três paradinhas aqui que eu tenho que falar contigo, cara. Tá. Então vamos lá. Deixa eu pegar aqui umas três. Ó, por exemplo, tem um aqui que não tem como eu deixar passar, cara, que é... qual que foi, qual foi o cálculo que você fez, o cálculo político que você fez pra botar o Alckmin na tua chapa? Porque assim, você sabe, assim, pra mim fica muito claro o movimento político que você tá fazendo, um movimento que não é de extremos, é um movimento de dialogar com uma galera assim que, pô, antigamente era teu adversário, e portanto você meio que agrega uma galera ali que não estava contigo antes, você sinaliza que, "ó, tô aqui conversando com todo mundo".

Só que tu, lá na base, e eu converso com uma galera, por exemplo, do Capão Redondo, você deve conhecer o Ferréz, eu converso com o Ferréz também, e tem uma galera nesses lugares que fala assim: "Porra, cara, como é que o Lula junta com o Alckmin, cara? Que porra é essa?". Então assim, você ganha de um lado, você perde de outro, como é que tu faz esse cálculo?

[Luiz Inácio Lula da Silva]: Aprenda uma coisa que eu aprendi há muito tempo atrás, uma frase dita pelo Paulo Freire: De vez em quando você tem que juntar os divergentes para vencer os antagônicos.

[Igor]: Tá.

[Luiz Inácio Lula da Silva]: O que aconteceu?

[Igor]: Então, de certa forma, vale qualquer aliança?

[Luiz Inácio Lula da Silva]: Qualquer, não. O Alckmin não é qualquer coisa. O Alckmin é um cara que foi quatro vezes governador de São Paulo, o estado mais importante da federação, ganhou todas que disputou com o PT, significa que ele tem alguns méritos.

[Igor]: Mas é muito estranho vocês juntos, cara.

[Luiz Inácio Lula da Silva]: Eu chamei ele para ser vice porque eu acho que nós vamos pegar o Brasil numa situação pior do que eu peguei em 2003, nós então precisamos consertar esse país. Nós precisamos consertar o país. Fazer o país voltar à normalidade, fazer com que o Congresso cumpra com as suas funções, o Executivo execute, o Poder Judiciário julga, e conversar com muita gente, com muito empresário, para que a gente coloque todo mundo para salvar esse país.

E o Alckmin tem condições de conversar com um grupo de pessoas que eu não consigo conversar. É isso. Então, ele veio para ajudar a aumentar o leque de pessoas com quem a gente tem que conversar. E sobretudo a possibilidade de ajudar o Haddad a ganhar as eleições em São Paulo. É isso, é muito simples.

Você está lembrado que em 2002 eu fui procurar um empresário, o José Alencar tinha uma empresa de 17 mil trabalhadores em Minas Gerais. Eu jamais imaginei ter um empresário de vice. Quando eu vi o discurso dele, eu falei: "É esse". E levei ele pra ser meu vice.

Então o Alckmin é assim, o Alckmin surpreende, é uma figura de boa índole, está fazendo o trabalho extraordinário comigo, e eu tenho certeza que nós somos a dupla que vai recuperar esse país para o povo brasileiro voltar a sorrir. Tenho certeza disso.

[Igor]: Tá. Boa sorte nesse sentido.

[Luiz Inácio Lula da Silva]: O pessoal tá me pressionando para ir embora, não sei. Mas se você tiver alguma pergunta essencial, me faça, uma ou duas perguntas que eu tenho que ir embora.

[Igor]: Tá. Eu tenho pelo menos mais duas aqui. Vamos lá. Cara... a gente acabou de falar. Cara, a gente falou rapidamente também sobre questão de que você considera que no segundo turno com o Bolsonaro é muito difícil de gente debater, de falar sobre plano de governo, tudo mais. Eu entrei lá no site oficial, e você tem exatamente quinze propostas meio genéricas, chamou atenção, podia ser treze, não sei por que tu botou quinze.

Mas, cara, por que a gente... não tem um plano de governo. Por que a gente vota no Brasil como se fosse um concurso de bom mocismo?

[Luiz Inácio Lula da Silva]: Não, não, o PT sempre apresentou programa de governo. Dessa vez sabe qual foi a novidade? Nós fizemos aquela proposta com quinze pontos e abrimos na internet para que a sociedade possa participar e dar sugestão para o nosso programa de governo. Já tem mais de 20 mil sugestões.

[Igor]: Mas tu ia apresentar um programa de governo que parece que a galera do PT falou: Pô, não apresenta nada, não. Vai ser difícil de fazer aliança.

[Luiz Inácio Lula da Silva]: É que quando a gente... sabe, é que quando a gente já governou, as pessoas já sabem mais ou menos o que eu vou fazer.

[Igor]: Não sei, porque agora tu tá se juntando com o Alckmin, tu aparece com o Meirelles. A galera não sabe muito bem o que vai acontecer.

[Luiz Inácio Lula da Silva]: Mas o Meirelles foi importante pra mim no Banco Central.

[Igor]: Eu não duvido.

[Luiz Inácio Lula da Silva]: Deixa eu te falar uma coisa: Quando eu ganhei em 2003, eu dizia que se eu conseguisse acabar com a fome, eu tinha cumprido. E nós acabamos com a fome. Agora, a fome voltou pior. A fome voltou muito pior, Igor. Você tá vendo São Paulo a quantidade de gente dormindo na sarjeta. Hoje eu passei embaixo daquele viaduto na Praça Roosevelt, dá pena de ver a quantidade de criança dormindo na calçada. Dá pena. Isso não pode acontecer no país que já foi a sexta economia do mundo. Isso não pode acontecer. E está acontecendo. Então nós vamos tentar consertar esse país.

[Igor]: E isso tá tudo lá no teu plano de governo?

[Luiz Inácio Lula da Silva]: Eu tenho fé em Deus, eu tenho fé em Deus que você vai me chamar aqui, quando eu tiver um ano e meio de mandato, porque se não for para fazer isso, é melhor não ganhar, cara.

Só tem sentido eu ganhar porque eu acredito, como acredito em Deus, que a gente pode fazer as coisas acontecerem. As pessoas precisam voltar a sorrir nesse país. Quando eu brinco, eles não gostam quando eu brinco que nós vamos voltar a nos reunir no final de semana e comer um churrasquinho com uma picanhazinha, tomando uma cerveja gelada, é uma coisa fantástica para a sociedade brasileira ter o direito de voltar se reunir no final de semana para fazer uma festa em família, acabar com esse ódio, construir a paz. É tudo isso que eu preciso.

Ah, o Lula é a favor do aborto? Eu sou contra o aborto. Eu sou contra o aborto, porque o aborto não é bom nem pro pai, nem pra mãe, nem pra ninguém.

[Igor]: Mas tu é contra o aborto pessoalmente ou como política de estado?

[Luiz Inácio Lula da Silva]: Sou contra o aborto pessoalmente. Quem tem que decidir se o aborto é bom ou não é a lei, não é o presidente da República.

[Igor]: Concordo.

[Luiz Inácio Lula da Silva]: É preciso parar de fetiche, é preciso parar de inventar coisas a respeito das pessoas.

[Igor]: Só porque você precisa ir embora, tinha mais um milhão de coisas para falar contigo, quem sabe na próxima oportunidade. Mas comenta para mim rapidinho o que você pensa sobre teto de gastos e reforma trabalhista.

[Luiz Inácio Lula da Silva]: Eu sou contra o teto de gastos. E vou lhe contar porque eu sou contra o teto de gasto. Quando eu ganhei as eleições em 2003, o Brasil tinha uma inflação de 12%, o Brasil devia para o FMI, e tinha 12% de desemprego. Nós baixamos a inflação para 4.6%, nós reduzimos a dívida que era de 60.5 do PIB, a dívida interna bruta, para 37.7, nós pagamos o FMI, emprestamos 15 bilhões para o FMI, e ainda juntamos 370 bilhões de dólares, coisa que o Brasil nunca tinha. E geramos 22 milhões de empregos. Fizemos o maior programa de inclusão social. Por isso é que eu sou contra o teto de gastos.

Teto de gastos para garantir o quê? Para garantir que os banqueiros recebam o deles? E o povo pobre? Eu não posso melhorar a saúde por causa do teto de gastos, não posso melhorar a educação por causa do teto de gastos, não posso fazer creche por causa do teto de gastos. Ou seja, só vale a pena pagar os juros para os banqueiros?

[Igor]: Isso é um problema, pagar juros para banqueiros. Inclusive, não faz parte do teto de gastos.

[Luiz Inácio Lula da Silva]: Eu não acho que educação seja gasto. Educação é investimento. Cuidar da saúde das pessoas é investimento. Nós precisamos tratar as pessoas com um pouco mais tenho decência, Igor. Esse negócio de teto de gastos foi inventado para segurar dos banqueiros o que é deles. Ninguém quer discutir teto de política social, ninguém quer discutir teto de crescimento da economia, teto de aumento de salário. Não, as pessoas só querem evitar que a gente cuide das pessoas mais pobres.

[Igor]: A reforma?

[Luiz Inácio Lula da Silva]: Eu sou contra. A reforma trabalhista, veja, a gente não quer voltar ao que era no passado, porque a legislação trabalhista era de 1943. Mesmo movimento sindical, ele quer adequar...

[Igor]: Os mesmos problemas que têm agora?

[Luiz Inácio Lula da Silva]: A atualidade, cara, a gente quer atualizar. A Espanha acaba de fazer uma atualização. Por exemplo, esse pessoal que trabalha com aplicativo. Esses caras tiveram uma regulação, eles têm que ter jornada de trabalho, eles têm que ter, sabe, Descanso Semanal Remunerado, eles têm que ter algum direito, porque inventaram que eles são empreendedores, eles não são empreendedores, cara. Sabe? O cara, se bater o carro e quebrar, ele está ferrado; se ele se ferir, ele está ferrado.

Então nós precisamos fazer uma regulação em que a gente garanta às pessoas um mínimo de seguridade social. Sabe? Se ele se machucar, a família dele tem que ter alguma coisa. Ele tem que ter uma Previdência. Porque também o cara fica carregando comida nas costas, conforme sentindo o cheiro da comida, e sem dinheiro para comprar. Lógico que se o cara quiser trabalhar por conta própria, temos que incentivar ele trabalhar por conta própria e criar algumas condições de ele sobreviver. Porque todo mundo sonha em trabalhar sem ter patrão. Todo mundo sonha.

Eu quando era torneiro mecânico, eu sonhava em pedir a conta e trabalhar de táxi. Olha que bobagem! Montar um bar. Se eu montasse um bar, eu bebia tudo, cara. Sabe, então... então, sabe, mas hoje não, hoje tem mais alternativa para as pessoas, Igor. E nós temos que dar mais oportunidade para as pessoas, sabe? Então eu digo sempre o seguinte, a gente não nasceu para ser pobre, a gente não gosta de comer coisa ruim, a gente quer coisa boa.

É preciso que as pessoas tenham um pouco de respeito pelas pessoas pobres. Será que as pessoas pensam que quem está dormindo embaixo dos viadutos aí fez opção por aquilo?

[Igor]: Pelo amor de Deus, não.

[Luiz Inácio Lula da Silva]: Não fez, cara. Todo mundo quer uma casinha, Igor. Todo mundo quer uma casinha. E nós fizemos um programa chamado Minha Casa, Minha Vida, que foi o maior programa habitacional da história desse país. Contratamos quatro milhões e cem mil casas. As pessoas que ganhavam pouco não pagavam e a escritura saía no nome da mulher. Nós temos que voltar com esse programa. Sabe? Todo mundo, todo mundo quer ter um empreguinho e ganhar um bom salário. Todo mundo quer que o filho ande bem vestido, as crianças iam para a escola com a barriga cheia, isso não é exagero, isso é o mínimo que a Bíblia diz que a gente tem que ter, que a Constituição diz que gente tem que ter. Por que negar?

Veja uma coisa absurda, está na Constituição que a mulher e o homem têm que salário igual se fizer trabalho igual. A mulher ganha, sabe, 60% do que ganha o homem. Então essa é uma coisa que nós vamos regular. Nós vamos regular. Pode ficar certo que nós vamos regular para a mulher ganhar igual ao homem se ela fizer a mesma função; e às vezes a mulher tem mais competência do que o homem.

[Igor]: Quando tu fala em regulação de mídia, tu não está falando de censura, não é?

[Luiz Inácio Lula da Silva]: Eu não estou falando em censura. Eu sou inimigo da censura. Entrei na política contra a censura. O que eu quero fazer é o que eu estou dizendo, tem coisa que a sociedade tem que participar para mudar. Sabe, eu não vou citar coisa aqui, mas tem canal de televisão, sabe, que só fala asneira, só fala grosseria, só ofende. Nós temos que ter uma regulação. A última regulação da mídia eletrônica é de 62! Então nós precisamos chamar a sociedade para discutir.

[Igor]: Se você fala em chamar a sociedade, eu fico mais tranquilo.

[Luiz Inácio Lula da Silva]: A gente pode fazer uma regulação como a legislação inglesa, como a legislação americana, como a legislação? Ninguém quer uma regulação como Cuba. Ninguém quer. Ninguém quer uma rádio que só fala aquilo que interessa ao governo, a televisão que só fala ao que interessa o governo, ninguém assiste, ficaria chato pra caramba.

O que nós queremos é uma coisa plural, que todo mundo ia ter direito a participar, que a oposição tenha direito de resposta, que as pessoas ofendidas tenham direito de resposta, é o mínimo. Veja, se você falar uma coisa aqui, no teu programa, e ofender alguém, e esse alguém ligar para você e falar: "Companheiro, a gente pode ter o direito de resposta?", você não vai dar?

[Igor]: Geralmente, sim.

[Luiz Inácio Lula da Silva]: É lógico, você tem que dar a chance de a pessoa provar, Igor. Então é isso que nós queremos. Nós queremos. Eu não sei se a gente consegue fazer tudo isso, mas, por exemplo, você pega os canais de televisão, todos eles têm retransmissores, a Record tem retransmissor, a Globo, o SBT. Agora, nos estados não tem programa local, a única liberdade que eles têm é fazer o jornal das sete da manhã, o jornal do meio-dia e o jornal das oito da noite, meia hora de jornal. O restante é divulgando o dia inteiro os enlatados, sabe, que a Matriz riso de São Paulo reproduz.

Você não acha que era justo criar condições, para que tivesse três, quatro ou cinco horas de programação local, regional, para dar emprego para artista lá, para dar emprego para a câmara lá, pra dar emprego para um monte de gente lá?

Não, deixa eu te contar: não é na canetada, não. É que é muito fácil, o cara ganha uma retransmissora lá e o cara fica ganhando o percentual da publicidade, sem nenhum compromisso de nada. Sabe? A RBS, no Rio Grande do Sul, tinha programa local. Eu conheci no Maranhão, tinha uma cidade lá que tinha um programa do SBT que era local, programa de auditório!

[Igor]: Porra!

[Luiz Inácio Lula da Silva]: Sabe? Então, é preciso mudar, gente, nós estamos no século XXI, a gente tá repetindo a mesma coisa do século XX!

[Igor]: Vamos pra internet, pau no cu da TV.

[Luiz Inácio Lula da Silva]: Nós temos nove, nós temos nove pessoas que são donas de todos os meios de comunicação no Brasil.

[Igor]: Isso é estranho. Isso é horrível, cara.

[Luiz Inácio Lula da Silva]: Sabe? Então, a internet...

[Igor]: Também tem cinco bancos, também é horrível.

[Luiz Inácio Lula da Silva]: A internet é uma coisa muito importante. Muito, muito importante. Eu lembro que a internet, quando surgiu, todo mundo achava que seria a revolução, que todo mundo... muito jornalista pediu a conta pra ganhar dinheiro na internet; não deu certo, por que?

[Igor]: Pra alguns não deu.

[Luiz Inácio Lula da Silva]: Pra muitos não deu.

[Igor]: É.

[Luiz Inácio Lula da Silva]: Sabe? Nem todo mundo, cara, tem a sorte que você teve e outros companheiros. Faz uma coisa que, "pá!", dá certo, acerta na mosca e vamos em frente. Sabe? Isso eu acho louvável, eu acho legal, acho muito interessante, sabe? E eu fico mais feliz ainda quando eu vejo que você é um cara que se formou pelo Prouni, cara.

[Igor]: Eu fiz Letras.

[Luiz Inácio Lula da Silva]: O Prouni foi a coisa mais extraordinária. Você sabe que eu sonhava em colocar os pobres na universidade e a gente não tinha... eu pensei em até utilizar o Fundo de Garantia. Aí, de repente, a mulher do Haddad pensou uma ideia, falou pro Haddad, o Haddad falou comigo, eu falei: "Porra, nós vamos trocar a dívida que as universidades têm com bolsa de estudo e vamos colocar gente da periferia".

[Igor]: Minha faculdade faliu, estava sendo... estava sendo demolida hoje, eu acho.

[Luiz Inácio Lula da Silva]: Não, é que foi a mulher do Haddad, a Ana Estela, que pensou nisso num projeto pra São Paulo. Aí depois nós aproveitamos a nível nacional. Você não tem noção do milagre disso. Você não tem noção, eu viajo o Brasil inteiro, a quantidade de pessoas que ficam gritando com um papelzinho na mão: "Lula, eu sou do Prouni, eu sou do Prouni, obrigado!".

[Igor]: A minha esposa é do Prouni também.

[Luiz Inácio Lula da Silva]: "Eu sou o primeiro da minha família a ter um diploma, eu sou o primeiro!" Então, cara, nós vamos fazer mais. Eu quero mais doutor. Eu quero mais filho de empregada doméstica médico. Sabe, é assim que o mundo vai pra frente: quando os pobres tiverem todos os dentes na boca, sorrindo de alegria, barriguinha cheia, sabe? É tudo que eu quero.

[Igor]: Cara, muito obrigado?

[Luiz Inácio Lula da Silva]: Este país feliz.

[Igor]: Vão acabar me batendo, então eu preciso mesmo deixar você ir embora. Bom, pra vocês que assistiram aí, não esquece também... não esquece de se inscrever aqui, de dar o like. Ô Lula, pô, como é que as pessoas te acompanham nas redes sociais, cara?

[Luiz Inácio Lula da Silva]: Não sei.

[Risos]

[Igor]: Então, ó, procura "Lula" aí no Google que você acha, tá bom?

[Luiz Inácio Lula da Silva]: Ó, lá em casa, quem cuida...

[Igor]: Como é? Lula.com.br.

[Luiz Inácio Lula da Silva]: Ó, no Instituto quem cuida... lá em casa quem cuida é a Janja.

[Igor]: Tá.

[Luiz Inácio Lula da Silva]: No PT é o Grazia...

[Igor]: Cara, essa foi uma resposta muito, muito sincera, né? "Sei lá, porra!"

[Risos]

[Luiz Inácio Lula da Silva]: E não me preocupo, sabe? Eu não quero... veja: eu sou um cara, sabe, que eu não tô... não tenho essa preocupação, mais.

[Igor]: Cara, é uma pena, de verdade, que a gente... que você precisa ir embora, de verdade. Mas, cara, muito obrigado.

[Luiz Inácio Lula da Silva]: Mas me chama outra vez, pô.

[Igor]: Eu te chamo outra vez, eu te chamo outra vez.

[Luiz Inácio Lula da Silva]: Me chama outra vez. Se eu for presidente você me chama?

[Igor]: Tá.

[Luiz Inácio Lula da Silva]: Sabe?

[Igor]: Tá.

[Luiz Inácio Lula da Silva]: E se eu não for, você me chama também.

[Igor]: Tá bom!

[Luiz Inácio Lula da Silva]: Sabe por quê? Porque, não sendo candidato, eu posso falar coisa que aqui, como candidato?

[Igor]: Eu entendo.

[Luiz Inácio Lula da Silva]: Sabe que o mundo é cheio de frescura, muito?

[Igor]: Eu entendo.

[Luiz Inácio Lula da Silva]: Sabe, o jogador de futebol pode fazer o que quiser, o artista pode fazer o que quiser, a artista pode fazer, mas o político, não, ele tem que ser assim, durão. Sabe? Tudo, até o sorriso. O Stuckert vive: "Sorri, presidente, sorri, presidente!".

[Igor ri]

[Luiz Inácio Lula da Silva]: Sabe? Não tem...

[Igor]: Tá com você há 22 anos, deve saber o que tá falando.

[Luiz Inácio Lula da Silva]: Mas, Igor, deixa eu te falar uma coisa, olha, não é pro Lula, não: se você puder ajudar a desmontar a rede de fake news nessa campanha, ajude, cara. Ajude. Você estará prestando um serviço extraordinário à sociedade. Sabe, se você puder, todo programa teu, falar: "Gente, vamos votar, vamos votar, é importante votar". Sabe?

[Igor]: Eu considero que seja importante votar também, eu considero.

[Luiz Inácio Lula da Silva]: Porque, sabe... Mas fala isso. Você tem um público extraordinário, convença as pessoas a ir votar. Sabe, é importante. Não precisa dizer "vá votar no Lula". Não precisa dizer, não vou exigir tanto de você assim. Sabe? Mas, de qualquer forma? Você até parece comigo.

[Igor]: Caralho, já ouvi isso tantas vezes, cara!

[Risos]

[Igor]: Mas obrigado, Lula, obrigado por vir, todo mundo que veio aí, obrigado.

[Luiz Inácio Lula da Silva]: Deixa eu contar: foi um prazer te conhecer. Eu imaginei...

[Igor]: Deixa eu ver tu de oclinho, bota o oclinho aí, deixa eu ver.

[Luiz Inácio Lula da Silva]: Esse aqui é quando eu quero parecer intelectual.

[Igor]: Caralho! Ó lá, Gianzão.

[Luiz Inácio Lula da Silva]: Foi disso aqui que a Janja se apaixonou.

[Risos]

[Igor]: Obrigado, cara.

[Luiz Inácio Lula da Silva]: Deixa eu contar: eu tô agradecido você ter me convidado pra vir aqui, porque a gente precisa ter liberdade pra falar as coisas que o povo precisa ouvir, sabe? Eu...

[Igor]: E é importante parar de pregar pra convertido.

[Luiz Inácio Lula da Silva]: Deixa eu te contar uma coisa, cara, vou contar uma coisa: eu sei o que é a fome. Você sabe que, na minha terra natal, onde eu nasci, Garanhuns, eu vim comer pão pela primeira vez em São Paulo com sete anos de idade. Lá, o café que gente tomava era uma cuia de farinha.

[Igor]: E tu comia o que lá?

[Luiz Inácio Lula da Silva]: Farinha com café. Farinha fazia...

[Igor]: Minha mãe conta essa história.

[Luiz Inácio Lula da Silva]: A gente pegava café, colocava farinha, pegava o café, jogava lá, fazia um mingau, e aquilo que você comia. Sabe? E eu tô hoje fortão, bonito, ó.

[Igor]: 76 anos.

[Luiz Inácio Lula da Silva]: Até casei, porra.

[Igor]: Até casou, porra. Cara, obrigado, desculpa a equipe aí se eu passei um pouco do tempo. Vocês que assistiram aí, muito obrigado também, entra lá lula.com.br, né? E não se esquece também de se inscrever e dar o like aqui, e a gente vai continuar...

Segue nós também, qual é, Gian, o teu? @_gianzao, e eu sou @igor.3k, tá bom? Segue nós. Ele tá falando pra tu falar alguma coisa. O que é?

[Luiz Inácio Lula da Silva]: Fala o que você quer.

[Igor]: Ah, é, teu Instagram, porra.

[Luiz Inácio Lula da Silva]: Ele é responsável pelo Instagram.

[Igor]: Qual é o Instagram dele, cara? @lulaoficial. Segue lá no Instagram. Vai estar aqui no comentário fixado também, tá bom? Então muito obrigado todo mundo aí. Boa noite.

[Luiz Inácio Lula da Silva]: Agora você me ofereceu uma coisa pra beber, eu falei que não, mas agora eu quero tomar pelo menos uma água gelada ali.

[Igor]: Tá bom, tá bom. Tudo o que você quiser aqui, cara. Obrigado. Valeu, gente. Tchau.