Se quisesse fazer algo errado, não iria consultar o TSE, diz dona de rádio
Lídia Prata Ciabotti almoçava em sua casa em Uberaba (MG), ontem, quando descobriu ter sido dragada para a acirrada corrida pelo Planalto entre o presidente Jair Bolsonaro (PL) e o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT). A empresária alega que a rádio da qual é proprietária deixou de veicular 100 inserções da coligação do presidente por falhas operacionais e lamenta que agora os candidatos tentam imputar má-fé à emissora.
"Estamos no fogo cruzado. O PL acha que não colocamos [as inserções no ar] porque somos contra ele. O PT acha que não colocamos porque queremos concentrar inserções do PL no final [da campanha]", disse em entrevista exclusiva ao UOL Notícias.
Segundo Lídia, o PL, partido do presidente, foi informado pela rádio sobre a situação em 10 de outubro. Desde então, duas semanas transcorreram sem que a campanha de Bolsonaro reclamasse. Ela ressalta que o aviso partiu da própria emissora, que fez contato telefônico.
Ela se vê como uma empresária de uma cidade do interior de Minas Gerais que virou alvo dos interesses dos candidatos que disputam a presidente da República. "Essa briga é dos dois. A gente não tem nada a ver com isso."
Foto com Michelle. A situação ficava mais complicada para Lídia conforme a tarde de ontem avançava.
Horas depois da exposição de informações de um e-mail da rádio alertando o TSE sobre as inserções, as redes sociais e os sites de notícias publicavam fotos da empresária com a primeira-dama, Michelle Bolsonaro.
A imagem é de cinco dias atrás no aeroporto de Uberaba e estava no Instagram de Lídia, que aparece de verde e com adesivo do presidente colado no peito. "Tirar foto é próprio da função", justifica.
A empresária é administradora de um grupo de mídia que fez 50 anos em julho e possui jornal impresso, portal online, rádio e revista. Lídia acrescenta que tirou fotos com Fernando Henrique Cardoso (PSDB), Lula e Dilma Rousseff (PT) quando eram presidentes.
Faria foto com Janja? A legenda publicada na rede social também foi fonte de dor de cabeça. Lídia afirma que "fez uma escolha" e a frase foi interpretada como adesão a Bolsonaro. A empresária se apresentou ao UOL Notícias como uma pessoa plural.
"Na época da Dilma, conseguimos migrar [da AM] para FM. Tenho muita gratidão por ela".
Lídia ressalta que receberia e tiraria foto com Janja, caso a esposa de Lula visitasse Uberaba. Acrescenta que coisas mudaram desde os tempos da gestão Dilma: a polarização surgiu e as redes sociais se tornaram populares.
"A diferença é que, na época dos outros presidentes, não tinha Instagram."
Mas agora Lídia está mais comedida. A empresária não permitiu que fossem feitas fotos para a matéria e recusou gravar uma entrevista com a equipe de vídeo do UOL.
Procurou pelo TSE. Esta precaução ocorre porque ontem, enquanto almoçava, Lídia recebeu telefonemas de jornalistas que trabalham em seu grupo avisando que havia um depoimento na Polícia Federal envolvendo a Rádio JM Online na alegação de Bolsonaro de que a eleição não é limpa. Tratavam-se de declarações feitas por Alexandre Gomes Machado, servidor exonerado do TSE por assédio moral.
Além de ter o nome inserido na polêmica, um e-mail enviado por uma funcionária da rádio à Justiça Eleitoral pedindo ajuda para solucionar um problema operacional se tornou público. Foi o que bastou para a rádio ser associada à má-fé na eleição. "Se quisesse fazer errado, não ia consultar o TSE".
A origem da polêmica. De acordo com Lídia, em 7 de outubro, uma sexta-feira, ela e o marido viajaram. Quando retornaram ao trabalho na segunda-feira (10), foram informados que a coligação de Bolsonaro não enviou as peças e 100 inserções deixaram de ir ao ar. A rádio fez contato telefônico com o Tribunal Regional Eleitoral de Minas Gerais em busca de instruções sobre como reparar a situação.
A orientação não veio e o encaminhamento foi procurar o TSE. Nova ligação, e os servidores da Corte explicaram que as coligações dos candidatos não precisam enviar os programas para rádios e TVs. Ainda que os partidos adotem esta prática, o procedimento normal é subir as peças em um servidor. As emissoras entram neste banco e fazem o download para veiculação.
Ocorre que a Rádio JM transmitiu propaganda eleitoral nas últimas sete eleições e sempre recebeu os programas das coligações. Funcionários e diretores sequer sabiam da existência deste servidor com as peças, que se chama repositório. O procedimento foi atualizado e o PL voltou a ter suas inserções levadas ao ar.
PL nunca reclamou da situação. Na mesma tarde de 10 de outubro, uma funcionária procurou o PL e informou sobre o ocorrido. Nenhuma queixa foi feita e a única mudança foi o partido do presidente voltar a enviar e-mails com as inserções.
Ocorre que ainda existia o lapso de inserções não transmitidas e a rádio se preocupou em como resolver a situação.
Lídia ressalta que a emissora é uma concessão pública e precisa estar em conformidade com a lei eleitoral.
Consultado, um advogado orientou a direção a formalizar a situação um e-mail para ter prova escrita de tentativa de solução do caso.
Decepção com servidor exonerado do TSE. Lídia disse que o e-mail não foi enviado a nenhuma pessoa em específico, mas à instituição TSE. Para ser mais preciso: à Coordenadoria de Imprensa, Secretaria de Comunicação e Multimídia.
A empresária reforça que o servidor Alexandre Gomes Machado nunca foi destinatário e estranha que o conteúdo seja levado a depoimento à Polícia Federal. "Em vez de responder para nós, virou esse negócio desse tamanho."
Entre todos os envolvidos neste caso, Lídia lamenta as atitudes do servidor exonerado do TSE. Ela contou ter mais de cem funcionários num negócio que se mantém fundamentado na credibilidade.
"Decepção com quem jogou a gente nessa roubada."
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