Com Datena e vice de Nunes, segurança pública turbina eleição de SP

A pré-candidatura do apresentador José Luiz Datena (PSDB) e do coronel da PM Ricardo Mello Araújo (PL) como vice na chapa do prefeito Ricardo Nunes (MDB) alçam o tema da segurança pública ao centro do debate na corrida eleitoral de São Paulo.

O que aconteceu

Pré-candidatos vão explorar a sensação de insegurança da população. Apesar de ser atribuição do governo estadual, que comanda as polícias, a segurança pública é assunto recorrente nas disputas municipais. Em São Paulo, Datena ficou famoso por apresentar programa policial na TV, e a direita, nas figuras do ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) e do governador Tarcísio de Freitas (Republicanos), indicou o ex-comandante da Rota para vice de Nunes.

Eleitores apontam segurança como principal problema de São Paulo. Pesquisa Datafolha mais recente mostra que o tema é a maior preocupação para 23% dos paulistanos — seguido da saúde, com 16%. Na Quaest, divulgada nesta quinta-feira (27), a violência é citada por 29% dos entrevistados.

Pré-campanhas apostam em grupos de trabalho sobre o assunto e em contribuições de eleitores para elaborar propostas. Críticas à atual gestão de Nunes vão desde o baixo efetivo da GCM (Guarda Civil Metropolitana) até pouco avanço de políticas para a "cracolândia" — o que o prefeito nega.

Nunes cita aumento de agentes da GCM e câmeras de monitoramento como conquistas. O efetivo de guardas saiu de 5.500 para 7.000, segundo a equipe do prefeito. Sua pré-campanha quer consolidar ações propostas pela população para o plano de governo — foram feitas 32 reuniões regionais presenciais, além contribuições enviadas por aplicativo.

A expectativa no entorno de Nunes é que o vice se torne um ativo para alcançar votos, embora a trajetória na Rota também preocupe. "Um coronel representa uma escolha populista, eleitoreira, mas é uma resposta ao que a população quer ouvir, e a esquerda não está falando sobre isso", afirma Felippe Angeli, coordenador de advocacy do Justa.

Pré-campanha de Guilherme Boulos (PSOL) estuda propostas que envolvam os governos estadual e federal. Apesar da força do tema na direita, a equipe afirma que ele não vai fugir de abordar o assunto — incluindo a "cracolândia".

Aliados de Boulos afirmam que a chegado do ex-Rota à corrida não amenizará a sensação de insegurança da população. Segundo Angeli, a esquerda precisa se apropriar da discussão na segurança pública. "Os campos mais reacionários surfam bem na exploração do tema", disse.

PSDB diz que pesquisas internas mostram Datena como nome que teria melhor desempenho na segurança se fosse eleito. No lançamento da pré-candidatura, o apresentador criticou a suspeita de ligação do PCC com as empresas de ônibus. Ele tem explorado a operação do Ministério Público e afirmado que, se eleito, "o paulistano não vai pagar passagem" para facção.

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A coordenação da pré-campanha de Tabata Amaral (PSB) aposta em melhorias na zeladoria urbana. Para a GCM, a equipe sugere um sistema de metas e a atuação dos agentes em ocorrências menores, como barulho. "A PMar não tem condições de atender a esse tipo de solicitação, que é número 1 de reclamação", afirma Leandro Piquet, que coordena o grupo de segurança pública da deputada.

Pablo Marçal (PRTB) afirmou que, se eleito, convidará Mello Araújo para ser secretário da Segurança Urbana. Questionado sobre propostas para área, ele mencionou que quer apoiar ONGs que atuem com moradores em situação de rua — essa parcela da população é atendida pela Secretaria de Assistência e Desenvolvimento Social.

'Policialização da política'

Preocupação com a segurança pública está presente em todas as classes sociais, ainda que de diferentes formas. "Em áreas como saúde e educação, pessoas ricas podem pagar para ficar fora do sistema. No caso da segurança pública, isso não acontece. Pessoas com maior poder aquisitivo também são afetadas, ainda que pessoas negras e periféricas sejam mais as principais vítimas", diz o advogado Angeli.

Redes sociais ampliam a disseminação de conteúdos violentos. "Hoje todo mundo tem um grupo no Whatsapp pelo qual fica sabendo dessas coisas", diz Natália Pollachi, gerente de projetos do Instituto Sou da Paz. Para ela, apesar da queda no número de furto, ocorrências como extorsões e violência contra mulheres têm maior impacto no imaginário coletivo.

O fenômeno de candidatos com carreiras policiais e militares na política não é recente, mas ganha força. Um levantamento do Fórum Brasileiro de Segurança Pública mostrou que a presença das forças de segurança na Câmara dos Deputados aumentaria 35,7% em 2023. Dos 1.888 candidatos na disputa, 38 foram eleitos, incluindo três oficiais do Exército. Em 2018, 28 nomes da categoria se elegeram deputados federais.

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Entrada na política é incentivada por entidades policiais. "Há uma tendência colocada e uma consciência de grupos organizados nesses segmentos para criar um projeto político", diz o coordenador de advocacy do Justa. Contudo, o ideal, segundo Natália, seria que, quando uma pessoa com carreira pública se candidatasse, passasse por um período de afastamento da instituição. "Seria o mais adequado para evitar o risco de policialização da política", diz.

"Só pode falar em segurança pública quem tem uma arma na mão". Essa concepção, segundo Natália, ganha espaço no imaginário dos eleitores — como se policiais e militares fossem "detentores do conhecimento em segurança pública." "O vice de Nunes e o Datena são um reflexo disso e, ao mesmo tempo, impulsionam esse fenômeno", afirma.

O que compete aos municípios

População desconhece atribuições da segurança no âmbito municipal. Ao mesmo tempo que o tema está entre as maiores preocupações dos eleitores, há uma cobrança por policiamento ostensivo — atividade que compete à administração estadual.

Papel dos municípios na segurança pública é prevenir a violência. "As atividades preventivas conflitam um pouco com o imaginário que se forma em torno do tema", diz Natália. Segundo ela, as atribuições passam mais pelo monitoramento do que combate ao crime.

Monitoramento da violência nas escolas, atenção à violência contra mulheres e iluminação. "Caberia à administração municipal desenvolver políticas de atenção às mulheres, incentivar as guardas municipais a compartilhar informações com as polícias, colocar as guardas em posições mais estratégicas e melhorar a iluminação pública em determinados pontos da cidade", diz ela.

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