Boulos fez campanha equivocada, diz Safatle: 'Cabe à esquerda ser esquerda'
A campanha de Guilherme Boulos (PSOL) para a Prefeitura de São Paulo foi "completamente equivocada" por acenar a pautas de centro —como o incentivo ao empreendedorismo—, e deixar de encampar as bandeiras tradicionais de esquerda, afirmou o filósofo Vladimir Safatle, ao UOL News desta terça-feira (28).
Para o filósofo, Boulos e o PSOL precisa discutir estes acenos e entender quais temas precisarão abraçar e defender. "Só cabe à esquerda ser esquerda", disse.
Acho que [a campanha] foi completamente equivocada. Completamente equivocada. Eu acho também que o PSOL precisa pensar muito a respeito do que está acontecendo. A gente passou de cinco prefeitos para zero.
Sou professor do Instituto de Psicologia da USP e fazemos pesquisas há anos sobre como o empreendedorismo é uma fonte brutal de sofrimento psíquico. Você tem hoje no Brasil uma situação do trabalho completamente desregulada(...): 13,5% da população brasileira está com transtornos depressivos, 9,7% está com transtornos de ansiedade. (...) Não é um modelo possível.
Nesses dois anos de governo, o governo Lula não tentou revogar a reforma trabalhista, nem tensionou isso politicamente. Ele não tentou apresentar um projeto para diminuição da jornada de trabalho, que é um tópico clássico da esquerda.
A sociedade vê ativamente que a gente não tem uma alternativa, no sentido forte do termo. Ele acha que, no final das contas, a extrema-direita é muito mais realista, porque ela diz 'olha, a situação é essa, o sistema é esse, agora é cada um por si, quem sobreviver vai sobreviver'. O discurso pode ter milhões de furos, mas ele é coerente. O nosso não é. Esse é o problema, ao meu ver.
Vladimir Safatle
'Cabe à esquerda ser esquerda'
Na entrevista, Safatle lembrou a derrota de Marcelo Freixo (PT) para Cláudio Castro (PL) nas eleições ao governo do Rio de Janeiro em 2022, e como a flexibilização do discurso não foi suficiente para ganhar votos.
A mudança de discurso para fins eleitorais e de alianças políticas não faz com que o eleitor acredite no projeto, afirmou o filósofo.
Eu acho que o grande erro do Boulos foi não ter sido Guilherme Boulos. O eleitor não vai acreditar em você, por mais que você faça. A gente já teve a experiência do Freixo, no Rio de Janeiro. Foi a mesma coisa. O Freixo tentou ir para o centro. O que ele ganhou? Nada. A gente não ganhou um voto.
Entre outros erros brutais, [Boulos] fazer uma live com o Pablo Marçal, normalizando o Pablo Marçal, dando uma avenida para ele crescer posteriormente, e quando a gente teve, eu vi a pesquisa, 1% dos eleitores dele, mas com um preço impagável.
Não dá para você fingir o que você não é. Se você entrou na política dizendo 'olha, eu sou a favor de resolver o problema da moradia habitacional de qualquer forma, de um jeito ou de outro'.
Eu acho que ele tinha que aproveitar isso. Falar: 'Eu vou entrar e vou resolver esse problema, custe o que custar, vocês podem ter certeza. Se em três anos isso não estiver resolvido, vocês podem me tirar'.
Ele foi falar a questão da moradia de rua no final, na última semana. Mais uma vez, eu insistiria no seguinte: só cabe à esquerda ser esquerda.
Vladimir Safatle
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