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Chávez compara entrada da Venezuela no Mercosul à eleição de Lula e diz que "nosso norte é o sul"

Mapa do Mercosul após a entrada da Venezuela no bloco - Arte/UOL
Mapa do Mercosul após a entrada da Venezuela no bloco Imagem: Arte/UOL

Fabrício Calado

Do UOL, em Brasília

31/07/2012 14h19Atualizada em 31/07/2012 17h08

O presidente da Venezuela, Hugo Chávez, disse nesta terça-feira (31) durante cerimônia de incorporação da Venezuela ao Mercosul, em Brasília, que "nós agora estamos na nossa exata perspectiva histórica. Nosso norte é o sul. Estamos hoje onde deveríamos ter estado sempre".

A cerimônia foi realizada no Palácio do Planalto, em Brasília. O presidente venezuelano disse ainda que a entrada de seu país no Mercosul é um evento que "forma a história" e se assemelha à primeira eleição de Luiz Inácio Lula da Silva como presidente do Brasil.

"Sinto que o evento de hoje tem alguma semelhança com o dia em que este povo querido do Brasil elegeu como seu presidente Luiz Inácio Lula da Silva. O povo do Brasil elegeu o Lula e começou a mudar a história", disse Chávez.

Para Chávez, "há tempos a Venezuela devia ter entrado no Mercosul". Sem citar diretamente o Paraguai, país temporariamente suspenso do Mercosul e que era contra a incorporação da Venezuela, Chávez disse que "algumas correntes à direita" impediam a entrada de seu país no bloco. "Os mesmos que aplaudiam a Alca (Área de Livre Comércio das Américas criticam a entrada da Venezuela. As críticas são válidas, mas para nós é de grande interesse sair deste modelo econômico".

A presidente Dilma Rousseff, que abriu a cerimônia e falou antes de Chávez, afirmou que "o Mercosul se torna a quinta economia mundial com a Venezuela, e consolida-se como potência energética e potência alimentar global". Além de exaltar o Mercosul, Dilma usou sua fala para criticar a crise política causada pelo impeachment do presidente do Paraguai, Fernando Lugo, há cerca de um mês. Segundo Dilma, os países que integram o bloco "têm um compromisso inequívoco com a democracia". "Nossa perspectiva é que o Paraguai normalize sua situação", disse.

A entrada da Venezuela no Mercosul acontece à revelia do Paraguai, suspenso do bloco até 2013. Além de Chávez e da presidente Dilma Rousseff, também participaram da cerimônia os presidentes do Uruguai, José Pepe Mujica, e da Argentina, Cristina Kirchner.

Mujica disse que hoje "o mundo industrial está em crise, e nós estamos quase historicamente acostumados com [uma situação em] que, quando o mundo industrial está em crise, pobres de nós. No entanto, parece hoje que os pobres são eles [os países industrializados]. Nossos emigrados à Europa estão voltando. Acertamos tanto nossas políticas – um pouco porque a dor nos ensinou, afinal, estamos em outro mundo. Nunca tivemos uma oportunidade como esta".

Última a falar, a presidente argentina, Cristina Kirchner, disse que "a entrada da Venezuela fecha, definitivamente, a equação do que será o século 21: energia, minerais, alimentos, ciência e tecnologia". Ela também comentou sobre o sentimento de integração que permeia os países do bloco:

"Não nascemos, nenhum de nós quatro, de um repolho. Não somos projetos individuais, mas sim de um projeto coletivo. Representamos essa força social e histórica dos nossos povos, que se juntam para marcar, por fim, que a solidão acabou, porque nós nos encontramos".

Início do processo

A cerimônia desta terça-feira (31) não significa a entrada automática da Venezuela no Mercosul. O processo de incorporação do país ao bloco agora fica a cargo de um grupo de trabalho que terá 180 dias, a partir de 13 agosto, para definir um cronograma de adequação da Venezuela ao grupo. O prazo é prorrogável pelo mesmo período de 180 dias.

Ainda assim, é menos que os quatro anos que até então valiam para a maioria dos protocolos de adesão. Os países do Mercosul trabalham para reduzir os prazos para a adoção, por exemplo, da TEC (Tarifa Externa Comum), o imposto cobrado de produtos de fora do bloco. Como a tarifa média de importação venezuelana é próxima à média do Mercosul (12,5% contra 11%), a avaliação é que o processo pode começar a partir de janeiro.

Aviões da Embraer

Além da incorporação da Venezuela ao bloco, Chávez e Dilma assinararam convênio para a compra de aeronaves da Embraer pela Venezuela. Não foram revelados os valores do contrato da Venezuela com a Embraer. Chávez se limitou a dizer que “é milionário o acordo, são várias centenas de milhares de dólares”, na noite de segunda-feira (30), após jantar com a presidente Dilma Rousseff no Palácio do Alvorada.

Segundo a Reuters, o negócio prevê inicialmente a compra de seis aeronaves por US$ 270 milhões (aproximadamente R$ 552 milhões). O negócio, porém, pode chegar a US$ 900 milhões (aproximadamente R$ 1,8 bi) caso seja exercida a opção de compra de mais 14 aeronaves.

De acordo com Chávez, o contrato com a Embraer “é um projeto até modesto em relação ao mapa de projetos que temos com o BNDES, a Refinaria Abreu e Lima, alianças petroleiras, energéticas”, disse.

As negociações foram feitas pelo Brasil com a empresa de aviação estatal da Venezuela, a Conviasa. A Embraer venderá as aeronaves 190AR, que possuem entre 98 e 114 assentos.

Novo mapa do Mercosul

Segundo o Ministério das Relações Exteriores, com o ingresso da Venezuela o Mercosul contará com uma população de 270 milhões de habitantes (70% da população da América do Sul), um PIB a preços correntes de US$ 3,3 trilhões (83,2% do PIB sul-americano) e um território de 12,7 milhões de km² (72% da área da América do Sul).

ORIGEM DO BLOCO

O Mercosul surgiu em 1991 para reforçar a integração regional e como ferramenta de parcerias entre Brasil, Argentina, Uruguai e Paraguai (temporariamente suspenso). Tem como países associados Bolívia, Chile, Colômbia, Equador e Peru, e como observadores o México e a Nova Zelândia.

A entrada da Venezuela, diz o Itamaraty, altera o posicionamento estratégico do bloco, que passa a estender-se do Caribe ao extremo sul do continente. Ainda segundo o Itamaraty, com a Venezuela, o Mercosul se afirma como potência energética global em recursos renováveis e não renováveis.
A notícia do ingresso da Venezuela inspira Bolívia e Equador a negociarem sua incorporação ao bloco. Por ora, não há previsão para isto acontecer.

*Com agências