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Bento 16 não fez mais para combater a pedofilia porque não quis, dizem entidades

Fernanda Calgaro

Do UOL, em Brasília

11/02/2013 17h50

Grupos que representam vítimas de abusos sexuais supostamente cometidos por membros da Igreja Católica afirmam que o papa Bento 16 não fez mais para combater esse tipo de crime porque não quis.

O pontífice anunciou a sua renúncia nesta segunda-feira (11) e ficará no cargo até 28 de fevereiro.

Pedofilia na Igreja Católica

As denúncias mais graves de pedofilia na igreja atingiram seu auge em 2009 e 2010. Segundo elas, dioceses locais e o próprio Vaticano foram cúmplices no acobertamento de inúmeros casos de pedofilia, hesitando em punir padres pedófilos e às vezes mudando-os para postos nos quais continuaram a praticar abusos.

Enquanto algumas autoridades católicas inicialmente qualificaram as acusações de serem parte de uma campanha contra a Igreja, o papa aceitou a responsabilidade pelos episódios, falando em "pecados dentro da Igreja".

Bento 16 encontrou vítimas e emitiu pedidos de desculpas inéditos. Enfatizou que os bispos notifiquem os casos de abusos e introduziu novas regras para apressar a apuração de denúncias de pedofilia.

Para os simpatizantes de Bento 16, ele foi o papa que mais agiu contra os abusos.

Críticos, porém, dizem que foi necessário um bom tempo para que o alemão compreendesse a seriedade dos crimes que lhe eram notificados e ele permitiu que os abusos ficassem sem resposta por anos para evitar arranhar a imagem da Igreja.

Nos oito anos em que esteve à frente da Igreja Católica, vieram à tona diversas acusações de abusos que, durante décadas, foram acobertados pela Igreja. Os escândalos atingiram países como Irlanda, Alemanha, Estados Unidos e Bélgica.

“Poder ele tinha. É um dos homens mais poderosos do mundo e certamente o mais rico. Mas ele não fez muito além de se desculpar e fazer promessas vazias”, afirmou Barbara Dorris, uma das diretoras do grupo norte-americano Snap (Survivors Network of those Abused by Priests --do inglês, “rede de sobreviventes dos abusados por padres”).

“Ele poderia ter afastado clérigos americanos que comprovadamente eram abusadores, mas não fez. Por que não?”, questiona.

O perfil conservador de Bento 16 foi o principal entrave para se avançar no combate aos abusos, segundo a inglesa Anne Lawrence, que coordena a entidade britânica Macsas (Ministry and Clergy Sexual Abuse Survivors) --na tradução livre "sobreviventes de abuso sexual pelo clero".

“Não há ninguém mais à direita do que ele. Por anos, antes de se tornar papa, ele teve acesso a documentos com relatos de abuso e nada fez. Quando virou papa, não houve nada de concreto. É lamentável”, critica.

Para Anne Lawrence, a renúncia do papa não causa apenas surpresa ao mundo, mas revela uma profunda divisão na Igreja Católica.

“Todos os demais papas morreram no cargo. É muito pouco ele dizer que não se sente bem para abandonar o posto. E também é de se estranhar que, se a saúde está mesmo debilitada, Bento 16 não tenha debatido o problema com seus assessores. Até mesmo Jesus comentou com seus apóstolos que seria crucificado. A Igreja hoje vive internamente uma intensa batalha pelo seu comando”, avalia Anne.

Embora comemorem a saída de Bento 16, a grande questão para as entidades que defendem as vítimas de abuso é quem será o seu sucessor.

“Esperamos que nestas suas últimas duas semanas como papa, Bento 16 dê diretrizes para quem vier a sucedê-lo.”

Anne, por outro lado, se diz mais descrente. “Se ele não fez nada em oito anos, não será agora em duas semanas que irá tomar uma atitude.”

De qualquer maneira, ela afirma que, caso seja eleito um papa mais liberal, isso poderá indicar um desconforto da Igreja com a atuação conservadora de Bento 16.