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Além de vender avião, novo presidente mexicano abre mão de casa oficial

Casa Lázaro Cárdenas, a primeira construída no complexo de Los Pinos e uma das menores. Foi usada pelo último presidente, Enrique Peña Nieto - Eloisa Farrera, colaboração para o UOL
Casa Lázaro Cárdenas, a primeira construída no complexo de Los Pinos e uma das menores. Foi usada pelo último presidente, Enrique Peña Nieto Imagem: Eloisa Farrera, colaboração para o UOL

Eloísa Farrera

Colaboração para o UOL, da Cidade do México

10/12/2018 04h01

Los Pinos, a residência oficial dos presidentes do México desde 1934, amanheceu diferente no primeiro dia do mês: os portões verdes estavam abertos, não havia soldados ou trancas impedindo a passagem, e orquestras musicais ocupavam os jardins.

O novo presidente mexicano, Andrés Manuel López Obrador, de esquerda, tomou posse no início de dezembro e, tentando passar uma mensagem de austeridade e fim de privilégios, anunciou medidas como colocar à venda o avião oficial e abrir mão da luxuosa residência oficial. Ele vai continuar na mesma casa até o ano que vem, esperando o filho terminar o ano escolar. Depois, disse que vai morar de aluguel.

No primeiro dia de visita, estima-se que mais de 50 mil pessoas tenham passado por Los Pinos, complexo luxuoso formado por diversas edificações, salões e áreas verdes. São 56 mil metros quadrados, o equivalente a oito Palácios da Alvorada, no Brasil, ou 14 Casas Brancas, nos Estados Unidos. 

"Bem-vindo, povo do México", dizia uma placa feita com rosas brancas em um dos novos acessos para pedestres. Nas escadas onde em 2014 a ex-primeira-dama Angelica Rivera posou para uma revista social, mexicanos descalços e indígenas contrastavam com a opulência palaciana do recinto que deixou de ser a residência dos presidentes mexicanos.

"Olhe os armários!", "Tem um cinema privado!", "E a cozinha ...!", foram algumas das expressões dos visitantes.

Impressionados --mas não de maneira positiva

Escritório presidencial na 'Casa De la Madrid' - Eloisa Farrera, colaboração para o UOL - Eloisa Farrera, colaboração para o UOL
Escritório presidencial na 'Casa de la Madrid'
Imagem: Eloisa Farrera, colaboração para o UOL

"Estou impressionada, mas não de maneira positiva. Surpreende-me que isto exista neste momento, que estas pessoas vivam assim, que Peña tenha vivido assim, enquanto outras pessoas vivem de forma precária”, disse David Ledesma.

"Los Pinos tornou-se em grande parte uma espécie de emblema do que não deveria estar no uso do dinheiro público. O uso das instalações da residência oficial não andou de mãos dadas com os interesses da sociedade", acrescentou a conhecida jornalista mexicana Carmen Aristegui.

No complexo de Los Pinos é possível visitar várias casas de ex-presidentes: a Casa Miguel Alemán, a maior e mais luxuosa e aquela onde a maioria viveu; a Casa Miguel de la Madrid, onde hoje existe uma grande sala para reuniões e conferências, e a Casa Lázaro Cárdenas, que abrigou o escritório do atual ex-presidente Enrique Peña Nieto (2012-2018).

Existem também várias salas, jardins e praças. Há ainda um passeio, a Calçada dos Presidentes, o edifício Molino del Rey e o Museu do Estado-Maior Presidencial.

Em 1934, o presidente Lázaro Cárdenas decidiu não morar no Castelo de Chapultepec, a antiga residência presidencial, para que o público pudesse visitá-lo e se mudou para Los Pinos. Mas o espaço habitacional austero virou, novamente, um espaço de luxo e ostentação. E, agora, o presidente de esquerda López Obrador decidiu abri-lo como espaço cultural.

Sala de conferências na 'Casa De la Madrid' - Eloisa Farrera, colaboração para o UOL - Eloisa Farrera, colaboração para o UOL
Sala de conferências na 'Casa de la Madrid'
Imagem: Eloisa Farrera, colaboração para o UOL

Para muitos, a medida soa como um anúncio populista. López Obrador defende dizendo que além de um novo governo, inaugura no país uma nova mentalidade política, dedicada a atacar a injustiça social e a desigualdade econômica avassaladora.

Em seus discursos iniciais, o novo presidente promete viver sem luxos e governar para todos, "mas em primeiro lugar para os pobres" e exercer uma "austeridade republicana".

"[Esta austeridade] não significa, como se pensa em outros países, um mero conjunto de ajustes nos gastos produtivos e sociais do orçamento. Aqui entendemos não apenas como uma questão administrativa, mas como uma política de princípios, pois implica acabar com os privilégios da alta burocracia", disse.

Corte na carne

Lopez Obrador também cortou seu salário em 40% e viverá em um espaço adaptado para ele, sua mulher e seu filho de 12 anos no Palácio Nacional, o escritório executivo localizado no centro histórico. Mas eles vão se mudar para lá depois de Jesus Ernesto, seu filho, terminar o ano escolar. 

"Eu não estou acostumado a morar em mansões (...). Eu preciso de muito pouco espaço, é só ter uma cama e onde pendurar a rede", disse ele em setembro passado. O Palácio Nacional permanecerá aberto ao público e seguirá sem grades ou agentes de segurança.

O governo federal também mandou reduzir, via Congresso, os salários dos altos funcionários públicos e aumentar para os cargos mais baixos. Também suspenderá os seguros de saúde privados e as poupanças.

Ninguém pode viajar em aviões particulares ou helicópteros à custa do Tesouro e não haverá compras de veículos para os funcionários. O governo também reduzirá os gastos com publicidade em 50% e diminuirá o número de escritórios administrativos no México e no exterior.

O governo do México, classificado na 135ª posição entre 180 países no Índice Internacional de Transparência sobre a Corrupção, tenta passar uma imagem do início de uma nova era.