Bolsonaro vai à ONU defender soberania e imagem do Brasil
O presidente Jair Bolsonaro chegará a Nova York na segunda-feira com a intenção de neutralizar a crítica internacional motivada pelas queimadas na Amazônia, mas reafirmando o direito do Brasil de desenvolver a floresta.
Poucos países no mundo têm um afeto generalizado como o Brasil, seja pela sua tradição de diplomacia multilateral e "soft power", seja pela receptividade dos brasileiros ou pelas belezas naturais. Essas qualidades, no entanto, ficaram em segundo plano perante a desconfiança internacional gerada pelo tom das respostas de Bolsonaro às críticas.
O presidente irá se dirigir à Assembleia Geral das Nações Unidas na terça-feira em meio à indignação global pelo tratamento do governo com o desmatamento na Amazônia. O governo acredita que as críticas internacionais são injustas, mas suas ações mostram que está preocupado com as possíveis consequências econômicas do episódio. Fundos de 30 países que movimentam US$ 16 trilhões em ativos exigem ações contra o desmatamento, ao mesmo tempo em que congressistas europeus fazem fila para atacar o acordo comercial entre o Mercosul e a União Europeia. O Parlamento da Áustria rejeitou o acordo nesta semana.
Em resposta, o governo Bolsonaro lançou uma campanha de relações públicas afirmando a soberania do Brasil sobre a Amazônia e o compromisso de proteger e desenvolver de forma sustentável a floresta. Agora, o presidente está levando esta mensagem para a ONU.
"A ONU pode ser uma grande oportunidade para o Brasil se apresentar e esclarecer as linhas da sua política externa e compromisso sobre temas que preocupam e são sensíveis para a comunidade internacional, como é o caso do meio ambiente", afirmou Sergio Amaral, embaixador do Brasil em Washington até o início deste ano.
Resta saber como Bolsonaro acalmará o medo sobre o desmatamento, enquanto afirma o direito do Brasil de desenvolver a Amazônia.
"Estou me preparando para um discurso bastante objetivo. Ninguém vai brigar com ninguém lá", disse Bolsonaro em uma live nas redes sociais na noite de quinta-feira. "Tá na cara que eu vou ser cobrado, porque alguns países me atacam, de uma maneira bastante virulenta, dizem que eu sou o responsável pelas queimadas aí pelo Brasil. Nós sabemos, pelos dados oficiais, que queimada tem todo o ano, infelizmente. Quer que faça o quê?", complementou.
O governo avalia que o clamor internacional é muito desproporcional aos reais danos ambientais.
"Isso foi orquestrado por grupos brasileiros que são sistematicamente contra o governo", disse o ministro das Relações Exteriores, Ernesto Araújo, em entrevista. "Eles querem usar qualquer ferramenta à sua disposição para atacar o governo, mesmo que isso prejudique o país."
O ministro do Meio Ambiente, Ricardo Salles, argumenta que as políticas de desenvolvimento do governo Bolsonaro destacam o quanto os governos anteriores falharam com 20 milhões de pessoas que vivem na região amazônica.
"Este é o primeiro governo que se envolve em uma discussão séria sobre como desenvolver a Amazônia", disse ele. "Os piores indicadores de desenvolvimento humano no Brasil estão na Amazônia e 20 milhões de pessoas moram lá." Salles está atualmente em Nova York, conversando com a mídia internacional sobre as políticas ambientais do governo.
Araujo, assim como o ministro da Segurança Institucional, general Augusto Heleno, e Eduardo Bolsonaro, filho do presidente e candidato a ser o próximo embaixador do Brasil em Washington, estão ajudando Jair Bolsonaro a redigir seu discurso de terça-feira.
"O Brasil expressava uma imagem de grande sociabilidade. Apesar da violência, a diplomacia, a música, a tolerância religiosa, eram aspectos importantes da imagem brasileira. As falas de intolerância modificam essa percepção. Não apenas o Brasil mostrou que o meio ambiente não é prioridade, como também a ciência", disse Andreza dos Santos Souza, diretora do Programa de Estudos Brasileiros da Universidade de Oxford.
Impacto Negativo
A indignação com os incêndios na Amazônia tem potencial para prejudicar o Brasil. Antes do G-7, o presidente francês, Emmanuel Macron, ameaçou anular o acordo comercial UE-Mercosul em função do que descreveu como "mentiras" de Bolsonaro sobre seu compromisso com as mudanças climáticas.
A empresa VF Corporation, dona da Timberland, Kipling Bags e The North Face, suspendeu as compras de couro brasileiro, e os dois maiores investidores da Noruega alertaram as empresas globais sobre a contribuição para danos ambientais. As embaixadas brasileiras também foram alvo de protestos.
A Fitch Solutions Macro Research emitiu dois relatórios alertando para "maior escrutínio" e "riscos econômicos" após os incêndios. "Acreditamos que a preocupação internacional com o desmatamento na bacia amazônica brasileira criará ventos contrários à exportação e entradas de investimentos", escreveu a Fitch.
Para o embaixador Sergio Amaral, o Brasil perdeu rapidamente sua reputação de líder em questões ambientais. Além da repercussão de países ou corporações, consumidores podem começar a rejeitar produtos brasileiros. "Essa mudança é ruim para o país, para a imagem do país e para as percepções dos consumidores sobre os produtos que irão consumir", disse.
O Brasil caiu quatro posições no Country Brand Index, ranking desenvolvido pela consultoria global de branding FutureBrand. Em 2014, o Brasil ocupava a 43ª posição e este ano caiu para 47ª entre 75 países. A pesquisa foi concluída em julho, antes dos incêndios na Amazônia, mas levou em consideração os primeiros seis meses do governo Bolsonaro.
"Amazônia é um tema muito sensível, com grande repercussão no mundo todo. Mas ela se soma a uma série de pautas negativas associadas ao Brasil nos últimos anos. É mais um elemento que enfraquece a marca", disse Daniel Alencar, sócio-diretor da FutureBrand São Paulo. Ele acrescentou, no entanto, que a marca de um país está constantemente em movimento. "A imagem do país é influenciada por milhares de aspectos ao longo do tempo. Nenhum evento isoladamente vai transformar a imagem do Brasil."
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