Trump é criticado por questionar se Kamala é negra; o que é colorismo?

Donald Trump, candidato republicano à Presidência dos Estados Unidos, indicou que a vice-presidente Kamala Harris usou sua identidade negra para ter vantagens políticas.

Não sabia que ela era negra, até alguns anos, quando ela passou a querer ser conhecida como negra. Porque ela era indiana a todo o tempo e de repente se tornou uma pessoa negra.
Donald Trump à Associação Nacional de Jornalistas Negros

Em um artigo na Bloomberg, a colunista Nia-Malika Henderson destacou que considera a fala uma estratégia de Trump para atiçar a divisão entre a população negra. Ela cita as tensões de longa data entre os negros americanos nativos e aqueles com raízes imigrantes, além do "colorismo" nos Estados Unidos.

O que é colorismo?

O colorismo é um preconceito que pode acontecer entre pessoas de pele negra. Assim como o racismo, ele funciona de forma estrutural na sociedade brasileira e está ligado ao processo de embranquecimento.

Fenômeno gera desigualdades com base no tom de pele, criando relações e cenários discriminatórios.

Esse tipo de preconceito surge da suposição de que a raça impõe limites a algumas pessoas, enquanto permite que outras prosperem, resultando na exclusão de indivíduos com fenótipos africanos.

Na perspectiva do antropólogo Messias Basques, doutor em antropologia pelo Museu Nacional, o colorismo estabelece uma "pigmentocracia", que vai definir os locais de acesso — e quais acessos — essas pessoas terão, de acordo com o tom de sua pele.

Ele destaca que, em uma escala cromática, quanto mais próximo do branco, as pessoas são percebidas como mais humanas, "menos selvagens, tribalizadas, atrasadas e primitivas".

Continua após a publicidade

Uma outra questão que, muitas vezes, aparece aliada ao colorismo é a tentativa embranquecimento da população. Pessoas negras de pele clara são, comumente, chamadas de "morenas" —termo usado para evitar chamar um indivíduo de preto e negar a negritude dele.

Em 1976, o IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística) permitiu que os indivíduos expressassem livremente sua identificação de cor no Censo Demográfico. Entre os mais de 136 registros, incluíam termos como "cor de burro quando foge", "meio-branca", "loira-clara" e "morena castanha". Atualmente, o levantamento padroniza as categorias de cor e etnia como amarelo, branco, indígena, pardo e preto. A população declarada como negra (pretos e pardos) no Brasil constitui mais de 56%.

Apesar de serem a maioria, enfrentam desigualdades sociais que se refletem nos acessos às diversas áreas da sociedade, especialmente entre pessoas mais retintas. O preconceito racial, nesse contexto, considera as características mais evidentes de ascendência africana.

Raízes do colorismo. A presença de pessoas negras de pele clara em locais valorizados pela elite evidencia a dificuldade de inclusão da comunidade negra como um todo, pelo racismo fundamentado em uma hierarquia baseada na pigmentação.

Reação à fala de Trump

A democrata afirmou que Trump promove discurso com desrespeito e hostilidade. "Esta tarde, Donald Trump discursou na reunião anual da Associação Nacional de Jornalistas Negros, e foi o mesmo show de sempre, a divisão e o desrespeito. Deixe-me apenas dizer, o povo americano merece algo melhor", disse ela.

Continua após a publicidade

O povo americano merece um líder que diga a verdade. Um líder que não responda à hostilidade e à raiva quando confrontado com os fatos. Nós merecemos um líder que entenda que nossas diferenças não nos dividem. Elas são uma fonte essencial de nossa força. Kamala Harris durante evento em Houston

Evento causou repercussão negativa. Karine Jean-Pierre, porta-voz da Casa Branca, classificou como insulto a fala de Trump. "Como eles se identificam, isso não é direito de ninguém. É uma decisão de cada um. Só ela [Kamala Harris] pode falar sobre sua experiência. Só ela pode falar sobre como é. Ela é a única pessoa que pode fazer isso. E eu acho que é um insulto para qualquer um. Não importa se é um ex-líder, um ex-presidente. É um insulto." A mãe de Harris era uma imigrante indiana e seu pai, um imigrante jamaicano.

Fonte: Messias Basques, doutor em antropologia pelo Museu Nacional.

*Com reportagens publicadas em 08/09/2021 e 29/01/2024

Deixe seu comentário

Só para assinantes