Economia, imigração e guerras: os desafios do próximo presidente dos EUA
Questões políticas internas e externas devem guiar os primeiros anos do próximo governo dos Estados Unidos. Os eleitores vão às urnas nesta terça-feira (5) com preocupações variadas, que aproximam republicanos e democratas.
As preocupações dos eleitores
Economia está entre os três maiores problemas para republicanos e democratas. Segundo pesquisa do Pew Research Center, o assunto lidera os temas citados pelos trumpistas (93%) e aflige 68% dos apoiadores de Harris na hora de escolher o voto.
Republicanos elencam imigração e segurança pública como os outros dois problemas mais importantes. Preocupações refletem discursos de Trump durante a campanha, marcada por críticas à chegada de estrangeiros no país e pela conexão preconceituosa entre o aumento de imigrantes e o aumento da violência nos EUA.
Para os democratas, o acesso à saúde e as indicações à Suprema Corte são as questões que mais chamam atenção. Em comícios, Kamala afirmou que "o acesso ao sistema de saúde tem que ser um direito" e sugeriu que a eleição de Trump colocaria em risco o Obamacare (Affordable Care Act), criado em 2010 para melhorar o acesso dos americanos a tratamentos de saúde.
Na política internacional, guerras que estão em curso serão desafios para o próximo governo. Os EUA são considerados "peça chave" no conflito entre Rússia e Ucrânia e na incursão de Israel na Faixa de Gaza. A mudança de governo não alterará esse cenário de protagonismo, projetam especialistas.
Política doméstica
Próximo presidente vai precisar levar "números positivos" da economia às prateleiras de supermercados e melhorar a comunicação sobre o assunto. A professora Flávia Loss de Araújo, da Fundação Escola de Sociologia e Política de São Paulo, diz que os índices de recuperação do país após a pandemia não se refletem nos bolsos dos americanos, principalmente dos mais pobres, o que justifica a insatisfação.
O Sistema de Reserva Federal dos Estados Unidos (FED) tem a meta de baixar a inflação do país a 2% ao ano. Em 2022, ela ficou em torno de 8%, atingindo os maiores números em quatro décadas. Agora, ela está pouco abaixo dos 3%.
Você tem hoje uma taxa de desemprego de mais ou menos 4%, analisando o histórico mensal de 2024. Também há um crescimento no PIB em relação a 2023. São bons índices, mas a percepção dos americanos é de que a economia vai mal. O governo Biden tem uma dificuldade de se comunicar com a população para explicar que, na verdade, o que eles estão vivendo é uma recuperação do cenário pós covid e que está indo bem.
Flávia Loss coordenadora da pós em Relações Internacionais da FESP
Dois grandes pacotes na área da economia e da saúde passarão por revisão. A professora de Relações Internacionais da PUC-SP, Luiza Mateo, explicou que o TCJA (Tax Cuts and Jobs Act), que mudou a tributação de empresas dos EUA desde 2018, e o Affordable Care Act, que mudou o acesso dos americanos aos seguros de saúde desde 2010, têm medidas emergenciais que acabarão em 2025.
Imigração e aborto também serão temas importantes e indicações à Suprema Corte podem mudar como decisões sobre o assuntos serão tomadas. Foi uma escolha da Suprema Corte que derrubou, em 2022, decisão "Roe contra Wade", que garantia o direito nacional à interrupção da gestação. Com isso, alguns estados aproveitaram para proibir ou dificultar o aborto, enquanto outros decidiram manter o acesso às clínicas.
Será importante acompanhar as eventuais nomeações para a Suprema Corte dos Estados Unidos, considerando-se a probabilidade de abertura de três posições a serem nomeadas pela próxima presidência.
Luiza Mateo, professora de Relações Internacionais da PUC-SP
Formação apertada do Congresso será problema para próxima presidência. Hoje, há uma pequena vantagem de democratas no Senado e de republicanos na Câmara, uma tendência que deve se seguir nestas eleições. Isso vai ser um problema para a próxima presidência, inclusive na discussão das medidas que estão prestes a expirar.
Um grande desafio para a próxima presidência será governar com um congresso engessado, com maiorias de pequena margem em ambas as casas. Passar novas legislações para políticas econômicas e sociais importantes pode ser difícil tanto para uma presidência democrata como republicana.
Luiza Mateo, professora de Relações Internacionais da PUC-SP
Na Câmara de Deputados são 220 cadeiras dos republicanos e 212 dos democratas. É uma das margens mais estreitas da história dos Estados Unidos. Se cinco republicanos faltarem uma votação, eles perdem a maioria. No Senado, a margem também é apertada, com os democratas com maioria, então tem uma inversão nas duas casas. Se essa tendência continuar, dificulta a governabilidade.
Flávia Loss coordenadora da pós em Relações Internacionais da FESP
Newsletter
DE OLHO NO MUNDO
Os principais acontecimentos internacionais e uma curadoria do melhor da imprensa mundial, de segunda a sexta no seu email.
Quero receberPolítica externa
Situação no Oriente Médio, principalmente em Gaza, deve continuar no radar do próximo presidente. A perspectiva dos pesquisadores, porém, é de que as boas relações com Israel, um grande parceiro americano, não mudem. O mesmo deve ocorrer com o conflito entre Rússia e Ucrânia.
Os candidatos [Harris e Trump] já reforçaram os seus compromissos com Israel e isso não vai mudar. A gente tem um lobby muito forte israelense dentro da política americana. E isso tem um impacto grande em financiamento de campanha, não só para essas presidenciais, mas para todo o legislativo.
Flávia Loss coordenadora da pós em Relações Internacionais da FESP
Ao olhar para a América Latina, presidente precisará pensar sobre o que fazer com a Venezuela. Os EUA compram petróleo do país comandado pelo ditador Nicolás Maduro, que vai assumir novo cargo após vencer eleições questionadas. Além disso, relação com El Salvador, Guatemala e Honduras, países de ondem partem parte dos imigrantes que chegam aos EUA, também ficará em foco.
Tensão no mar do Sul e guerra comercial da China também serão assuntos importantes. O conflito bélico iminente entre China e Taiwan pode escalar e a "continuação" da retaliação financeira ao país liderado por Xi Jinping deve continuar, tanto em um governo democrata quanto em um governo republicano.
A guerra comercial [contra a China] começou com Trump, mas não acabou com Biden. Biden manteve tarifas contra a China, aplicando novas tarifas. A gente vai ver, independente de quem ganhar, uma continuação dessa disputa comercial China-Estados Unidos. Por serem as duas principais potências, pelo menos no nível econômico, a gente vai ver aí uma repercussão para o resto do mundo.
Flávia Loss coordenadora da pós em Relações Internacionais da FESP
Busca por protagonismo em debates globais de governança será desafio. Para a professora Luiza Mateo, o meio ambiente é um tema no qual o próximo governo pode tentar se sobressair em debates internacionais. Os Estados Unidos deixaram o Acordo de Paris sobre o clima durante o governo de Donald Trump e voltaram em 2021, durante o governo de Joe Biden.
Deixe seu comentário