Netos de Hemingway voltam a Cuba pelo mar, refazendo viagem do escritor

Silvia Ayuso

Em Washington (EUA)

  • Enrique de La Osa/Reuters

    John e Patrick Hemingway, netos do escritor, em Havana (Cuba), durante as comemorações dos 60 anos do Prêmio Nobel de Literatura de seu avô, em 2014

    John e Patrick Hemingway, netos do escritor, em Havana (Cuba), durante as comemorações dos 60 anos do Prêmio Nobel de Literatura de seu avô, em 2014

Dois netos do Prêmio Nobel realizam o mesmo trajeto de barco que o escritor fez dos EUA até a ilha em 1934

Em 1934, assim que voltou de um safári na África e com pouco mais de US$ 3.000 que havia recebido de adiantamento por alguns relatos breves, Ernest Hemingway se dirigiu a um estaleiro em Coney Island e comprou um elegante iate esportivo que batizaria de Pilar. Em 19 de julho desse ano, o escritor rumava para Cuba, onde acabaria se instalando alguns anos depois, a bordo de seu barco, especialmente equipado para uma de suas atividades preferidas, a pesca esportiva.

Começava um romance entre o escritor, uma ilha e um barco que acabou se transformando em inspiração literária e em seu único amor e refúgio constantes até sua morte, em 1961. Quase 81 anos depois dessa primeira viagem no Pilar, outros dois Hemingway --seus netos John e Patrick, em outros barcos-- tomaram o mesmo rumo, partindo do mesmo porto, Key West, e com o mesmo destino, Cuba.

Essa é uma viagem "histórica e simbólica", diz John Hemingway a este jornal. E com uma grande carga de recordações e sobretudo de esperança na nova era que começou entre os EUA e a ilha, com o anúncio da normalização de relações em 17 de dezembro passado, após mais de meio século de antagonismo.

O périplo, que começou na última sexta-feira (22) com a partida da flotilha americana, continuará com a participação dos netos do escritor, com mais cerca de 50 pescadores aficionados americanos, no Torneio de Pesca de Agulha Ernest Hemingway, que completa 65 anos.

A bordo de seu amado Pilar, "Papa" Hemingway ganhou o torneio três vezes seguidas, de 1953 a 1955, que acabou recebendo seu nome e ao qual esteve presente pela última vez em 1960, quando se encontrou com Fidel Castro.

Nos últimos anos, alguns americanos participaram do torneio cubano, um dos mais antigos do mundo, segundo seus organizadores, mas tiveram que, primeiro, voar até a ilha para isso. Foi preciso esperar décadas e uma mudança radical na política dos EUA em relação a Cuba para que pudessem zarpar, pelo menos de forma legal, salienta John Hemingway, em seus próprios barcos. Um objetivo que custou meses de trabalho e burocracia para obter as autorizações do governo americano.

Como o embargo continua vigente, é necessária uma licença especial do Departamento de Comércio somente para que um barco parta dos EUA para a ilha e possa regressar. E outra do Departamento do Tesouro para transportar pessoas.

Mas o esforço valeu a pena, segundo Jeffrey Boutwell, do Latin American Working Group Education Fund, organização que está por trás dessa viagem. "Não há outra pessoa que simbolize a amizade entre Cuba e EUA como Ernest Hemingway", afirma.

A primeira visita dos netos de Hemingway a Cuba, em setembro do ano passado, serviu para comemorar o 60º aniversário do Nobel de Literatura que recebeu seu avô. Além disso, eles promoveram a aproximação entre os povos e defenderam os esforços conservacionistas bilaterais com os quais também esperavam estender pontes entre Cuba e EUA.

Oito meses depois, com o 17 de dezembro no meio, seus desejos começam a se cumprir. Ainda falta, entretanto, a liberdade para viajar à ilha de que desfrutou Hemingway, recordam seu neto e Boutwell. Por isso essa viagem também adquire agora um tom reivindicativo que, eles têm certeza, o autor de "O Velho e o Mar" teria aplaudido.

"Não só teria aprovado, como estou certo de que teria se sentido indignado diante da ideia de que os americanos fossem proibidos de viajar livremente a Cuba", declara Boutwell. "Não importam quais fossem as diferenças políticas ou os diferentes governos, Hemingway teria ficado totalmente horrorizado pelo fato de o governo americano restringir as viagens de seus cidadãos ao estrangeiro."

Tradutor: Luiz Roberto Mendes Gonçalves

Receba notícias do UOL. É grátis!

UOL Newsletter

Para começar e terminar o dia bem informado.

Quero Receber

Veja também

UOL Cursos Online

Todos os cursos