Arma utilizada por terroristas, fuzil AK-47 está presente em toda a França
Carlos Yárnoz
Todos os meses ocorrem na França tiroteios que têm o emblemático fuzil AK-47 (Kalashnikov) como protagonista. A arma de origem russa, preferida por jihadistas e criminosos, prolifera por todo o país. Foi a arma empregada pelos terroristas em todos os últimos atentados, incluindo a chacina da última sexta-feira (13). É uma prova da facilidade com que armas de guerra de todo tipo entram ilegalmente na França.
Ainda na sexta, horas antes do múltiplo ataque jihadista, o governo lançou um "plano nacional de luta contra as armas ilegais". Talvez tarde demais.
Marselha é a principal porta de entrada desses fuzis, e onde são mais utilizados. Uma busca no Google com os nomes da cidade e do mítico fuzil produz 128 mil resultados. É rara a semana em que não há tiroteios na cidade com fuzis AK-47. O último, em 10 de novembro, deixou dois homens de aproximadamente 30 anos mortos em um ajuste de contas no Porto Velho, como informou o promotor da cidade, Brice Robin, o mesmo que cuidou da catástrofe aérea do Airbus 320 nos Alpes.
A exibição mais notável de Kalashnikovs em Marselha ocorreu em 2 de março passado. Poucas horas antes da chegada à cidade do primeiro-ministro, Manuel Valls, mais de dez homens encapuzados portando Kalashnikovs se enfrentaram a tiros no conflituoso bairro de La Castellane. Um comandante da polícia conta que a maioria das Kalashnikovs vem dos Bálcãs, procedentes da guerra dos anos 1990.
Na origem são compradas por algumas dezenas de euros. O intermediário chega a pagar cerca de 500 euros por unidade, e em solo francês são adquiridas por 2.000 euros (cerca de R$ 8.000). A polícia apreende aproximadamente 5.000 por ano. No último foram 5.300, das quais 175 eram armas de guerra. Na segunda-feira (16), foram apreendidas 31, entre as quais um lança-foguetes. É ainda maior o número de armas roubadas: 7.500 em 2014, 80% em casas particulares. Na França, há 4 milhões de armas ilegais.
Os AK-47 estiveram presentes em todos os últimos ataques terroristas na França, nos consumados e nos frustrados. Esse tipo de fuzil foi usado pelos três jihadistas que executaram em janeiro os ataques à revista "Charlie Hebdo" e ao mercado de comida judaica HiperCacher. E no atentado contra o trem Thalys Amsterdã-Paris em agosto passado. Ou na tentativa frustrada de disparar contra duas igrejas de Paris em abril.
Agora, o plano do governo para frear uma proliferação de nível semelhante passa por organizar uma estratégia comum dos países europeus contra os traficantes. E por um maior controle das vendas pela internet, que também é uma via de abastecimento.
Quando esse plano ainda não existia, jihadistas com Kalashnikovs voltavam a semear de cadáveres as ruas de Paris. O fuzil onipresente em todos os conflitos do mundo, mas especialmente nas fileiras terroristas, acabou sendo um peso na consciência insuportável para seu criador, o militar russo Mikhail Kalashnikov.
Poucas semanas antes de morrer, em dezembro de 2013, aos 94 anos, o desenhista da arma mais universal escreveu ao patriarca da Igreja Ortodoxa: "Minha dor espiritual é insuportável. Tenho a mesma pergunta sem solução: se meu rifle tirou a vida de tantas pessoas, serei eu culpado por essas mortes, mesmo que se trate de inimigos?".
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Tradutor: Luiz Roberto Mendes Gonçalves