Rio+20 vai mudar padrões de produção e consumo; negociadores brasileiros explicam o consenso
“O maior impacto da declaração será na mudança de padrões de produção e consumo. Ficou decidido que vamos adotar um cronograma de dez anos para se fazer a transição a padrões mais sustentáveis”, disse André Corrêa do Lago, negociador-chefe do Brasil na Rio+20. Já o ponto que menos avançou foram os meios de implementação, principalmente o financiamento para países em desenvolvimento.
Com três dias de atraso, depois de negociações que se estenderam várias vezes pela madrugada, diplomatas de 193 aprovaram a declaração “O futuro que queremos”, que será levada ao encontro de chefes de Estado na Rio+20.
A Rio+20 é a Conferência da ONU para o Desenvolvimento Sustentável, que vai até o dia 22 de junho, no Rio. Na quarta (20), chegam chefes de Estado e altos representantes para a reunião de cúpula da Conferência. Eles vão receber das mãos da missão brasileira, que coordenou a fase final da negociação, um texto de 283 parágrafos aprovado por seus representantes diplomáticos nesta terça-feira (19).
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Em uma reunião com a imprensa depois da aprovação do texto, negociadores da comissão brasileira detalharam os aspectos mais trabalhosos da declaração. Confira a seguir.
Plano de ação
Ficou definido pela Rio+20 que os países deverão adotar os “Objetivos do Desenvolvimento Sustentável”(ODS) como metas para atingir esses padrões mais sustentáveis.
Quais serão esses objetivos, ainda não se sabe. A ideia é que eles sejam adotados a partir de 2015, quando a ONU também lançará suas novas Metas de Desenvolvimento do Milênio. O texto da declaração diz apenas que os ODS serão “concisos”, “universais” e “fáceis de entender.”
“O documento da Rio+20 é rico em si. Todo o universo de temas que são contemplados – a erradicação da pobreza, cidades sustentáveis, saúde, oceanos, florestas, biodiversidade – devem estar contemplados nos objetivos”, disse a embaixadora do Brasil na ONU, Maria Luiza Ribeiro Vioti. “Isso nos dá subsídios para prosseguir na definição de metas.”
Estrutura institucional
“Essa questão provocou uma grande divisão até o último momento”, revelou Lago. A Rio+20 deveria encaminhar uma reforma na governança internacional para questões relativas ao meio ambiente. Alguns países defendiam a criação de uma agência da ONU especializada em meio ambiente, proposta a que o Brasil se opôs e que ficou de fora do texto final.
A solução aprovada foi pedir o “fortalecimento” do Programa das Nações Unidas para o Meio Ambiente (Pnuma) e o engajamento de outras instituições internacionais, como o FMI, o Banco Mundial e a OMC à causa.
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“Isso é completamente diferente do que isolar a questão ambiental. Esse debate já foi superado em 92: a melhor forma de lidar com o meio ambiente é integrá-lo ao processo de desenvolvimento”, afirmou.
Como exatamente se dará o fortalecimento do Pnuma, deve ser decidido na próxima Assembleia Geral da ONU, no ano que vem.
Economia verde
Definir “economia verde”, termo novo em negociações internacionais, é uma das atribuições da Rio+20.
O texto aprovado cita a “economia verde”, termo novo nos fóruns da ONU, sempre como parte da expressão “economia verde no contexto do desenvolvimento sustentável e da erradicação da pobreza”. Esta, segundo Correa do Lago, foi a solução encontrada para uma dos pontos mais difíceis de negociação.
“De início, alguns países desenvolvidos queriam colocar a economia verde não como alternativa, mas como termo equivalente a desenvolvimento sustentável”, explicou Lago.
Para os países em desenvolvimento, no entanto, era importante manter a economia verde como um termo assessório, subordinado ao conceito mais amplo de desenvolvimento sustentável. “Economia verde é um caminho, mas não o único caminho. Nesse momento em que temos crise na dimensão econômica, social e ambiental, fica difícil acreditar que algum país tenha encontrado uma fórmula.” Leia abaixo as críticas à economia verde.
Meios de implementação
Os meios de implementação foram um ponto de negociação “dificílimo”, nas palavras do secretário-geral do comitê brasileiro na conferência, Luiz Alberto Figueiredo.
É também a área em que houve menos avanço, na avaliação dos negociadores.
“Para os países de menores recursos, teria sido da maior importância que os países desenvolvidos aumentassem os financiamento para o desenvolvimento sustentável global. Infelizmente, a crise internacional prejudicou e os recursos não apareceram”, disse Figueiredo.
Para ele, também foi importante o fato de “não haver retrocesso” com relação à propriedade intelectual de tecnologias importantes ao desenvolvimento sustentável.
“O que ficou no texto foram os clássicos das exigências do mundo em desenvolvimento com relação a financiamento e à transferência de tecnologia”, disse Figueiredo.
O texto ainda cria um “fórum de alto nível” para que os países continuem discutindo os meios de implementação a serem adotados.
Temas polêmicos do documento
O problema | O que é | A briga |
Meios de implementação | Medidas concretas para o financiamento e a transferência de tecnologia para a adoção de energia limpa e outros projetos sustentáveis, sobretudo nos países em desenvolvimento | O G77+China (grupo dos países em desenvolvimento, inclusive Brasil) propôs a criação de um fundo de US$ 30 bilhões anuais para a promoção do desenvolvimento sustentável; os países desenvolvidos se opõem, dizendo que já existem outros mecanismos de financiamento disponíveis, e apontam a crise econômica como um empecílho |
Economia verde | Os países debatem sobre a definição do termo. Refere-se, de modo geral, a maneiras de integrar padrões mais sustentáveis a modelos de produção e consumo | Alguns países em desenvolvimento temem, entre outros problemas, que a adoção do termo "economia verde" como expressão corrente nas negociações dê margem a pressões internacionais e protecionismos (veja mais abaixo) |
Princípío das responsabilidades comuns, porém diferenciadas | Diretriz da política internacional acordada na Rio92, diz que países ricos devem arcar com a maior parte dos custos ambientais por terem se desenvolvido às custas de energias poluentes | Países em desenvolvimento fazem questão de reafirmar o princípio expressamente no texto; delegações como as dos Estados Unidos, União Europeia, Japão e Canadá não acham necessário reafirmar o compromisso já assumido |
Regulamentação sobre oceanos | Há uma lacuna na legislação internacional com respeito à biodiversidade e recursos naturais localizados em alto mar, fora da área de jurisdição de cada país; delegações discutem a criação de áreas de reserva marinha em águas internacionais, a responsabilidade pela acidificação dos mares e a divisão equitativa dos recursos minerais suboceânicos | Países como Estados Unidos, Canadá e Venezuela se opõe a um tratado internacional de proteção do alto mar |
Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS) | Estabelecimento de metas para o desenvolvimento sustentável dos países, à semelhança das Metas do Milênio adotadas pela ONU em 2000. Os ODS seriam fixados para garantir avanços nos três aspectos do desenvolvimento sustentável - econômico, social e ambiental | Países divergem sobre o conjunto dos ODS e o cronograma para o estabelecimento de prazos e metas |
Governança | Reforma das instituições e fóruns internacionais que hoje regulam os acordos quanto a meio ambiente e sustentabilidade dentro do sistema ONU para facilitar a implementação de ações | Uma das questões em discussão é o fortalecimento do Programa das Nações Unidas para o Meio Ambiente (Pnuma). A promoção do Pnuma à condição de agência especializada, com mais autonomia e capacidade de implementação, já foi descartada pelos diplomatas; ainda havia debate, no entanto, sobre as medidas a serem adotadas para fortalecer o programa |
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