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Aquecimento global está levando novas espécies ao Ártico, mostra expedição russa

Ignacio Ortega

Em Moscou (Rússia)

26/11/2012 16h18

O Ártico recebe novas espécies animais e vegetais devido ao aquecimento global, assegura a bióloga e ornitóloga russa Maria Gavrilo, que acaba de retornar de uma expedição de três meses ao arquipélago.

"Encontramos menos gelo e, em consequência, mais pássaros, plantas, fungos e mosquitos do que antes. Além disso, avistamos baleias nunca antes vistas em latitudes tão setentrionais do planeta", afirmou.

A expedição científica russa, que incluía especialistas em botânica, zoologia e oceanografia, chegou à conclusão que, devido à redução da superfície da camada de gelo e seu derretimento cada vez mais precoce, "as condições para a vida animal e vegetal são, agora, mais benignas" na região do mar de Barents.

"O que ainda não sabemos é se a presença no Ártico de fauna e flora desconhecida para estas latitudes se deve ao já conhecido aquecimento global temporário ou a uma mudança climática mais durável", ponderou a russa.

Em particular, Maria encontrou quatro espécies de pássaros incomuns para o arquipélago - gaivota de Sabine, gaivota grande, pato marinho de cauda longa e vários tipos de marrecos -, além de três novas classes de mosquitos e baleias-fin.

"Trata-se de baleias sulinas. As correntes de água quente se dirigem para o norte e as baleias simplesmente seguem os organismos dos quais se alimentam. Mas é preciso reconhecer que estes animais são um bom indicador, já que se encontram no alto da pirâmide alimentar", apontou.

Segundo Maria, não resta dúvida de que a redução da camada de gelo ártica durante os últimos 10 e 20 anos é uma "anomalia". "Certos tipos de gaivotas e os ursos polares são os que mais sofrem com o derretimento cada vez mais prematuro. Concretamente, os ursos são maus caçadores em terra firme", disse.

Contudo, a zoóloga russa diz acreditar na teoria cíclica da mudança climática e lembra que alguns cientistas já preveem em breve um esfriamento do planeta à vista dos processos em andamento no Sol.

"Já houve épocas mais quentes do que agora e não aconteceu nenhuma catástrofe. Alguns acreditam que o clima está mudando devido à ação do homem e que o dano é irreversível. Eu, por outro lado, acho que a natureza continua sendo mais forte do que o ser humano. Não estamos perante um aquecimento eterno."

Em sua opinião, a principal ameaça para a natureza é a agressiva ambição comercial do homem e seu desejo de ter acesso a territórios inóspitos como o Ártico. "O gelo cede, aparecem novas terras e isto atrai o homem. O perigo reside no acesso do homem às plataformas continentais, as perfurações na busca de petróleo e a pesca intensa", advertiu.

Maria considera que não importa o que digam, não há meio seguro de extrair hidrocarbonetos, por isso que "até que apareça essa tecnologia, seria preciso impor uma moratória em todo o Ártico".

"Sou otimista por natureza, mas não tenho ilusões. O Ártico não é como a Antártida, que é propriedade da comunidade internacional. A soberania do Ártico é disputada por diferentes países. Ou seja, depende da vontade dos governos", explicou.

Por isso, ela se opõe ao acesso à região de potências que não são limítrofes com a região como Índia e China, que ultimamente estão muito interessadas na região.

"O Ártico e a Antártida são, como diziam os cientistas soviéticos, a cozinha do clima da Terra. Por isso, é preciso proteger sua riqueza natural pensando nas gerações futuras e educar as pessoas na importância dos valores ecológicos", comentou.

Como parte dessa política de divulgação, Maria é a favor do turismo ártico, consciente de que, devido ao difícil acesso e ao seu alto custo, nunca será de massa.

"Nos últimos dois ou três anos recebemos cruzeiros com várias centenas de turistas que ficaram durante duas semanas. Também é uma forma de conscientizar as pessoas. Cerca dos 10% restantes são expedições de turismo extremo, mas são a exceção", assinalou.

A expedição russa ao arquipélago permitiu ainda traçar um mapa mais detalhado do território, que inclui quase 200 ilhas e abriga um perigoso "lixão industrial" com centenas de milhares de toneladas de hidrocarbonetos abandonados após a queda da União Soviética em 1991.

Maria é subdiretora científica de um parque nacional criado em 2009 e que cobre uma superfície de 1,4 milhão de hectares cobertos por gelo em 85% de sua totalidade e onde vivem ursos polares, baleias da Groenlândia e narvais.