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Recuperação do rinoceronte branco é "ficção científica", avalia pesquisador

Lenny Ignelzi/AP
Imagem: Lenny Ignelzi/AP

Paula Moura

Colaboração para o UOL

03/12/2015 06h00

A morte de um dos quatro últimos rinocerontes brancos do norte levantou mais uma vez o debate sobre animais em extinção e o que a Ciência pode fazer para tentar salvá-los desse destino. Nola, que tinha 41 anos, morreu no Zoológico de San Diego, onde viveu por 26 anos sem ter conseguido se reproduzir. Os outros três rinocerontes brancos do norte restantes estão em uma reserva no Quênia e têm problemas para procriar, segundo a instituição.

As alternativas para a recuperação são restritas e tecnicamente muito difíceis. O primeiro passo seria dominar a tecnologia de reprodução artificial para esse animal. “Cada espécie tem uma biologia própria, e não dá para aplicar as técnicas de reprodução de humanos ou camundongos para o rinoceronte. Além disso, o aparelho reprodutivo deles é bastante complexo”, diz o pesquisador brasileiro Eduardo Eizirik, da Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul (PUC-RS).

O Zoológico de San Diego é um dos centros de pesquisas mais avançados na manutenção de células congeladas com nitrogênio líquido. Mas, apesar de ter em seu banco o sêmen de dois machos de rinoceronte branco do norte, o zoológico não têm óvulos congelados. Nola já era um animal mais velho, de forma que a equipe da instituição conseguiu conservar células vivas e tecidos de seu útero e ovário, mas não óvulos.

Mesmo que houvesse óvulos e sêmen viáveis, e que houvesse a tecnologia desenvolvida para realizar uma fertilização in vitro para essa espécie, seria necessário que houvesse uma fêmea viva para receber o embrião. As outras duas que estão no Quênia têm 26 e 15 anos. Eizirik estima que seriam necessários vários anos de pesquisa sobre a biologia reprodutiva dessa espécie para realizar um procedimento como esse, o que torna bastante difícil essa a tentativa.

Para o diretor de genética do zoológico, Oliver Ryder, “a informação do DNA (de Nola) - a sequência digitalizada do genoma dela - e as células vivas que salvamos como um legado são ferramentas cruciais para nossos esforços para trazer de volta o rinoceronte branco do norte da beira da extinção. Esperamos que o que estudamos também possa contribuir para a conservação de outras espécies de rinocerontes”.

Clonagem?

De acordo com o pesquisador brasileiro, que trabalha com genética da conservação, outra alternativa seria fazer a clonagem desta fêmea, assim como foi feita da ovelha Dolly. Poderiam ser feitos três clones, por exemplo, para cruzar com machos diferentes e com isso reduzir a perda da pouca variabilidade genética que ainda resta nesta população. Apesar de interessante em teoria, esta opção exige ainda mais conhecimento sobre a biologia da espécie do que a fertilização in vitro, sendo por isso ainda mais difícil de viabilizar a curto prazo.

Um desafio nesse caso é que a clonagem geralmente requer o uso de um óvulo da mesma espécie, cujo núcleo é removido, sendo substituído pelo núcleo de uma célula do animal que se quer clonar (Nola, nesse caso). Caso não se obtenha óvulos de uma das fêmeas ainda vivas desse rinoceronte, uma opção seria usar óvulos de rinoceronte branco do sul, que possui características genéticas diferentes, mas parecidas com as do norte, e colocar o núcleo da célula do tecido de Nola. Ainda que teoricamente possível, os desafios técnicos são enormes. “É quase ficção científica.”, diz o professor Eizirik. “Se não fosse a possibilidade de usar essas tecnologias, estaria extinto. Mas, com elas, ainda existe alguma chance de recuperação, mesmo que remota”.

Os cientistas americanos conseguiram fazer o sequenciamento genético de Nola, o que não ajuda diretamente na reprodução assistida, mas é o começo para saber quais genes existem naquela espécie, o que é desconhecido para a maioria delas. Assim, pode-se iniciar programas de pesquisa que, a longo prazo, podem permitir ativar genes relevantes.

Por isso, afirma Eizirik, “a ênfase para salvar as espécies deve ser evitar a perda de habitat delas, reduzir a pressão dos humanos sobre essas áreas”. Ele explica que, quando chega nesta situação próxima da extinção, é preciso muito tempo, muitas pessoas e muito dinheiro para tentar fazer os animais se reproduzirem novamente e atingirem um número suficiente para voltar para a natureza. “A velocidade da extinção é maior que a velocidade dos cientistas para classificar as espécies, o que é apenas o início do processo de conhecê-las”.