O celular que você troca todo ano causa mortes na China, mostra estudo
Toda vez que alguém troca de celular, compra um brinquedo ou uma roupa nova, mais pessoas morrem com a poluição do ar na China. É o que afirma um estudo publicado na revista Nature. Pesquisadores dos EUA, Europa e China quantificaram o impacto do mercado global nos problemas de saúde causados por poluentes do ar em todo o mundo.
Segundo a pesquisa, mais de 100 mil chineses morrem todos os anos devido à poluição atmosférica provocada pelas fábricas chinesas de produtos feitos para serem exportados para lugares como EUA e Europa.
Na última década, cidades da China se tornaram extremamente poluídas com a chegada de multinacionais em busca de mão de obra barata --o que possibilita a oferta de produtos com preços baixos a consumidores de todo mundo.
O estudo mostrou que as emissões na China são as que mais causam mortes em todo o mundo, seguidas pela poluição produzida na Índia e em outros países asiáticos. Mas é a demanda por produtos fabricados nesses locais que provoca o maior impacto.
"As pessoas pensam que a poluição do ar é um problema local. Em média, a cada seis meses mudamos nosso telefone. Isso tem um custo de saúde do outro lado do mundo", disse ao jornal inglês Guardian o economista Dabo Guan, professor da Universidade de East Anglia, na Inglaterra, e autor principal do estudo.
O estudo analisa a poluição do ar por material particulado (conhecido como PM 2,5) gerada mundialmente em 2007 por usinas, fábricas, aviões e transporte marítimo em 13 regiões do globo. Essas partículas finas, que possuem 2,5 milésimos de milímetros, penetram profundamente nos alvéolos dos pulmões e podem chegar à circulação sanguínea, provocando doenças respiratórias e cardiovasculares. Elas são responsáveis por 90% das mortes associadas à poluição atmosférica.
Os pesquisadores se basearam nesses dados de poluição e em modelos de correntes atmosféricas globais para identificar onde a poluição foi emitida e onde ela terminou. Foram analisados dados de 228 países. Para realizarem a correlação com o consumo global de produtos, utilizaram dados do Global Trade Analysis Project.
O consumismo mata mais que a indústria
De acordo com a pesquisa, ocorrem no mundo cerca de 3,5 milhões de mortes prematuras causadas pela contaminação do ar pelas chaminés de fabricantes de brinquedos, roupas e produtos eletrônicos. Atualmente, essas indústrias se concentram em países da Ásia, como China, Índia, Paquistão e Vietnã.
O deslocamento da poluição pela atmosfera mata cerca de 411 mil pessoas (12% do total) em lugares distantes desses centros. Na Europa, morrem 3.100 pessoas pela poluição que vem da China, aponta o estudo.
Contudo, muito mais pessoas, cerca de 762 mil (22% do total) morrem em lugares que produzem bens que são comprados em shoppings e lojas distantes, de outros países. São 100 mil chineses mortos devido ao consumismo europeu e norte-americano.
"Algumas regiões consomem, enquanto outras produzem e sofrem os efeitos de produção na saúde", disse Guan para o El País. De acordo com a pesquisa, para cada milhão de consumidores só na Europa ocidental há 416 mortes associadas à contaminação por PM 2,5 em outras regiões do mundo. Cada milhão de consumidores nos EUA soma na conta 339 mortes por poluentes no mundo.
Poluição na China é problema global
Para os pesquisadores, a poluição na China, que chama a atenção do mundo com pessoas usando máscaras de ar em cidades cobertas por fumaça de fábricas, não é problema só dos chineses, mas de todo o mundo.
"Em nossa economia global, os bens e serviços consumidos em uma região podem envolver a produção de grandes quantidades de poluição do ar - e mortalidade relacionada - em outras regiões", afirma o estudo. Para eles, é necessário conscientização por parte de consumidores e políticas públicas que dividam entre os países os prejuízos da poluição.
"A poupança de consumidores ocorre com perdas de vidas em outros locais. [Os custos] das políticas regionais que regulam a qualidade do ar [com impostos] (...) poderiam ser partilhados com os consumidores de outras regiões", afirmam.
Eles apontam como dificuldades para se alcançar melhorias o fato de indústrias poluidoras migrarem para regiões com regulamentações ambientais mais permissivas, gerando nos países que recebem novas fábricas "tensão entre os esforços para melhorar a qualidade do ar e para atrair investimentos estrangeiros diretos".
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