O ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) pode ser declarado inelegível hoje pelo Tribunal Superior Eleitoral. Isso quer dizer que ele pode ser impedido de concorrer a novos cargos eleitorais por um período de oito anos.
O caso trata do dia em que o então presidente da República recebeu embaixadores de diversos países no Palácio do Planalto em julho do ano passado. Na ocasião, Bolsonaro proferiu discurso atacando o sistema eletrônico de votação e acusando a Justiça Eleitoral de fraudar eleições.
Além disso, o discurso do ex-presidente foi transmitido para milhares de pessoas por meio da TV Brasil, uma emissora pública.
O ex-presidente, na condição de chefe de Estado e chefe de Governo, tinha o direito legítimo de promover o encontro, de proferir falas e ser acompanhado pela televisão por todo povo brasileiro. Não haveria qualquer conduta ilegal ou ilícita até aqui.
O problema está justamente no abuso de suas prerrogativas enquanto agente público e político. Bolsonaro valeu-se do cargo e da situação para promover uma fala em tom de campanha eleitoral e promover desinformação (fake news) com o uso de recursos públicos.
Desde o paradigmático caso da cassação do então deputado federal eleito pelo Paraná, Fernando Francischini, em 2021, por promover ataques contra o sistema eletrônico de votação, considera-se que essa postura causa grave abalo à legitimidade e normalidade do processo eleitoral. Ou seja, coloca em xeque todo o processo do exercício do voto e a escolha livre do eleitorado.
Nesse aspecto, o fato de o discurso ter sido transmitido ao vivo para milhares de pessoas ganha destaque. Tudo isso a 76 dias das eleições.
Com isso, foi acusado de cometer abuso de poder político e uso indevido dos meios de comunicação, que podem levar às penas de cassação de mandato e à sanção de inelegibilidade. Como não foi reeleito, resta-lhe a inabilitação para a vida pública pelo período de oito anos contados da eleição.
Se a Justiça Eleitoral entender que a conduta foi abusiva o suficiente, seguindo a linha da sua jurisprudência, Bolsonaro estará irremediavelmente inelegível.
Entretanto, não é tão fácil sacramentar antecipadamente o resultado desse julgamento. Diferente dos crimes em si, esse tipo de conduta não possui um contorno específico na legislação eleitoral.
Por exemplo, todas e todos sabem o que é o comando "matar alguém", expresso no Código Penal. Já as condutas de abuso de poder não possuem essa delimitação, ainda.
Por isso é que julgamentos como esses sempre geram muita expectativa e apreensão, seja dos juristas, seja da sociedade em geral. Bem, para além obviamente dos acusados e acusadas.
Esse é um problema atrelado à falta de delimitação do espectro sancionador da legislação eleitoral. Todavia, frisa-se que esse é um problema de todas e todos que respondem perante a Justiça Eleitoral e não somente porque é o Bolsonaro.
Espera-se, como gosta de frisar o ex-presidente que sentará hoje no banco dos réus para responder à primeira de muitas ações eleitorais nas quais é acusado, que o julgamento se dê dentro das quatro linhas da Constituição e das regras do jogo democrático.
Amanda Guimarães da Cunha é especialista em direito eleitoral e em ciências penais, membro da Abradep e autora do livro "Direito eleitoral sancionador: o dever de imparcialidade da autoridade judicial"
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