Itamaraty diz que posição do comitê da ONU sobre Lula é "recomendação"
Gustavo Maia e Luís Adorno
Do UOL, em Brasília e em São Paulo
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Ricardo Stuckert
Comitê da ONU quer Lula em debates; Itamaraty não vê 'efeito jurídico'
O Ministério das Relações Exteriores divulgou nota à imprensa nesta sexta-feira (17) na qual diz que as conclusões do comitê de Direitos Humanos da ONU (Organização das Nações Unidas) sobre a candidatura do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) "têm caráter de recomendação". Já a defesa de Lula diz que "essa decisão deve ser cumprida, é mandatória e não comporta qualquer tipo de questionamento".
Em documento divulgado hoje, o comitê da ONU pediu que o Brasil tome todas as medidas necessárias para assegurar os direitos políticos de Lula enquanto ele estiver na prisão. O texto --que tem um timbre da ONU-- faz referência a acesso do ex-presidente a veículos de comunicação e a membros do PT em função de ele ser candidato ao Planalto.
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Para o Itamaraty, a deliberação "não possui efeito juridicamente vinculante" (não passa a valer obrigatoriamente), mas o seu teor será encaminhado ao Poder Judiciário brasileiro. Produzido pela assessoria de imprensa da pasta, o comunicado não é assinado pelo ministro Aloysio Nunes Ferreira (PSDB). O ministro, no entanto, reproduziu o conteúdo da mensagem em suas redes sociais.
Segundo o ministério, a Delegação Permanente do Brasil em Genebra tomou conhecimento, "sem qualquer aviso ou pedido de informação prévios", da deliberação do comitê.
O colegiado é classificado pelo Itamaraty como um "órgão de supervisão do Pacto de Direitos Civis e Políticos", que é integrado não por países, mas por peritos que exercem a função em sua capacidade pessoal.
"O Brasil é fiel cumpridor do Pacto de Direitos Civis e Políticos. Os princípios nele inscritos de igualdade diante da lei, de respeito ao devido processo legal e de direito à ampla defesa e ao contraditório são também princípios constitucionais brasileiros, implementados com zelo e absoluta independência pelo Poder Judiciário", conclui o comunicado.
O Comitê, órgão de supervisão do Pacto de Direitos Civis e Políticos, é integrado não por países, mas por peritos que exercem a função em sua capacidade pessoal.
— Aloysio Nunes (@Aloysio_Nunes) August 17, 2018
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O comitê pede essas garantias até que os recursos de Lula contra a sentença no processo do tríplex tenham terminado. Condenado em segunda instância, o ex-presidente já cumpre sua pena, desde abril, na Superintendência da PF (Polícia Federal) em Curitiba. Ainda cabem recursos ao STJ (Superior Tribunal de Justiça) e ao STF (Supremo Tribunal Federal), mas o entendimento atual da Justiça brasileira é de que as penas podem começar a ser executadas antes da análise dos recursos pelas instâncias superiores.
O entendimento do Ministério das Relações Exteriores contraria o que disse ao UOL um dos integrantes do corpo de especialistas e dirigentes da ONU, o brasileiro Paulo Sérgio Pinheiro.
Defesa de Lula diz que "não há questionamento"
Em entrevista coletiva em São Paulo, os advogados de Lula demandaram que a decisão da ONU seja cumprida. "Esta decisão liminar proferida hoje assegura o direito do presidente Lula de participar das eleições deste ano e todos os seus direitos às condições de candidato", disse Cristiano Zanin Martins, um dos advogados do ex-presidente.
"É isso o que se buscava. Hoje, a ONU garante ao presidente Lula o direito de participar das eleições. É uma decisão muito importante, com repercussão mundial, e que atende a um pedido feito pela defesa. Essa decisão deve ser cumprida, é mandatória e que não comporta qualquer tipo de questionamento", completou Zanin.
Questionado em entrevista coletiva nesta tarde, Paulo Sérgio Pinheiro afirmou que a posição do Itamaraty era "constrangedora. Zanin afirmou que o STF já reconheceu que os tratados internacionais estão acima da lei. "Sobretudo, os tratados que versam Direitos Humanos", disse.
"Desde hoje, quando o Brasil recebeu a decisão, ele está obrigado a cumprir. Se houver eleições do país sem o presidente Lula, descumprindo a decisão internacional, essas eleições serão questionadas internacionalmente", complementou Zanin.
"Em 2009, o Brasil subscreveu o pacto, o Brasil se obrigou a cumprir as decisões do Comitê de Direitos Humanos da ONU. É preciso levar ao Itamaraty esse decreto e a doutrina internacional", afirmou o advogado do ex-presidente.
A candidatura de Lula foi oficializada pelo PT, que pediu registro nesta quarta-feira (15) ao TSE (Tribunal Superior Eleitoral), mas pode ser rejeitada pela corte com base na Lei da Ficha Limpa, que proíbe candidatos condenados em segunda instância de se candidatarem.
O petista foi preso no dia 7 de abril deste ano após ser condenado a 12 anos e um mês de prisão por corrupção passiva e lavagem de dinheiro, no caso do tríplex do Guarujá (SP).
A Lei da Ficha Limpa, que foi sancionada por Lula em 2010, faz com pessoas com condenação por órgão colegiado --caso da 8ª Turma do TRF-4 (Tribunal Regional Federal da 4ª Região)-- sejam consideradas inelegíveis. Mesmo assim, o PT registrou Lula como seu candidato a presidente na última quarta-feira (15).
Consultada pela reportagem, a PGR (Procuradoria Geral da República) ainda avalia um posicionamento a respeito do documento do comitê.
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