No Ceará, motorista vira cabo eleitoral de Bolsonaro com venda de camisetas

Nathan Lopes

Do UOL, em Juazeiro do Norte e Crato (CE)

  • Nathan Lopes/UOL

    Tallison Nogueira da Silva é motorista de aplicativo e vende camisetas de Bolsonaro

    Tallison Nogueira da Silva é motorista de aplicativo e vende camisetas de Bolsonaro

Em Juazeiro do Norte, cidade mais populosa do interior do Ceará, o primeiro turno da eleição presidencial foi vencido pelos candidatos da esquerda.

A saída de Ciro Gomes (PDT) --uma das principais lideranças políticas do estado-- da disputa e a mobilização de um grupo de apoiadores de Jair Bolsonaro (PSL) podem dificultar a transferência de votos do pedetista a Fernando Haddad (PT).

Em 7 de outubro, os esquerdistas tiveram, juntos, cerca de 77% dos votos válidos no município, distante 500 km da capital cearense.

Dessa quantia, 44 pontos percentuais pertencem a Ciro, e 33, a Haddad. Primeiro colocado na contabilidade nacional de 7 de outubro, Bolsonaro obteve quase 19% no município cearense, com os outros candidatos mal chegando a 1%.

Desde o início do segundo turno, vêm aumentando o interesse e as atividades dos apoiadores de Bolsonaro na cidade, um reduto de partidos ligados a políticos da esquerda. Eles são cerca de 200 e integram um grupo de WhatsApp. Têm organizado atos em Juazeiro e em cidades da região.

O mais recente foi no último sábado (20) na cidade de Crato, vizinha a Juazeiro. Eles fizeram uma carreata no município no mesmo dia em que Haddad realizava um ato na localidade. Nenhum dos lados sabia da atividade do outro.

O único momento de encontro entre eles foi quando a comitiva do petista deixava a cidade rumo ao aeroporto de Juazeiro e a carreata dos bolsonaristas adentrava o município.

Ao identificarem os petistas nos veículos, os apoiadores do candidato do PSL faziam, como em um balé, o gesto de arma tão repetido pelo seu presidenciável, acompanhado de um grito de "mito" aqui e ali.

Nathan Lopes/UOL

Pelas ruas, têm sido comum ver camisetas vermelhas com mensagens a respeito do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva ou com a frase "Haddad é Lula". Mas também se exibem roupas com o desenho de Bolsonaro e o slogan "é bom já ir se acostumando".

Também não há como deixar de notar a quantidade carros adesivados com imagens de Haddad (quase sempre acompanhado de Lula) ou com a de Bolsonaro.

Um dos responsáveis por isso é o motorista de aplicativo Tallison Nogueira da Silva, 23, que concilia sua atividade com o estudo para concursos públicos.

Ele tem distribuído adesivos de Bolsonaro e vendido camisetas do candidato do PSL. Tudo começou como uma brincadeira, diz. "Vi a camiseta com um amigo meu, me interessei, peguei uma. Aí eu comecei a vestir e andar nos cantos de Juazeiro. As pessoas se interessaram, vinham até mim e perguntavam: 'Onde é que eu consigo uma blusa do Bolsonaro?'"

Tantas vezes respondeu que passou a revender a roupa --que usa de vez em quando durante seu trabalho como motorista. Ele cobra R$ 20 pela camiseta, justamente o preço que pagou com o fornecedor. 

Meu intuito não é nem ganhar um dinheiro, é divulgar o Bolsonaro

Tallison Nogueira da Silva, motorista apoiador do candidato do PSL

Ele já vendeu 30 camisetas desde o fim do primeiro turno e os pedidos continuam na média em dois por dia.

Silva faz parte do grupo de WhatsApp de apoiadores de Bolsonaro em Juazeiro. "A gente faz reuniões, combina adesivaço em frente ao shopping e divulga o homem." O próximo evento de apoio ao candidato será neste domingo (21) em Juazeiro. 

Mas o apoio a Bolsonaro já causou problemas dentro da família de Silva. "A primeira vez [que me viram com a camisa], até minha família não aprovou. Quando eu cheguei em casa, foi 'ave, Maria, você é louco de usar uma camisa dessa?'", lembra.

Hoje, ele já conseguiu fazer com que alguns familiares trocassem de candidato em prol de Bolsonaro.

"É melhor tentar mudar do que ficar nessa mesmice aí"

Silva, que já votou no PT, diz que foi atrás do candidato para entender o que tanto falavam dele. Para o motorista, "as pessoas pegavam muito no pé" de Bolsonaro. "E eu fui atrás. E vi que as propostas do homem são bem melhores que as do Haddad", referindo-se ao concorrente, o petista Fernando Haddad.

O apoio de pessoas como Silva faz diferença em função de Bolsonaro não ter conquistado uma base forte no Ceará em relação ao seu concorrente. O partido do presidenciável elegeu um deputado federal e dois estaduais.

Do outro lado, PDT e PT tem nove federais e 18 estaduais, além do governador reeleito, Camilo Santana (PT), com quase 80% dos votos válidos, e Cid Gomes (PDT) como senador.

O motorista já passou por problemas até no trabalho em razão do apoio ao candidato do PSL. Foi quando, vestindo uma camiseta de Bolsonaro, recebeu passageiros com roupas com mensagens pró-PT. Não se tocou no assunto política durante o trajeto, segundo ele, mas a avaliação dos passageiros sobre seu serviço foi uma estrela, de cinco possíveis.

Com a opção de apoiar Bolsonaro, ele, que votou em Dilma Rousseff (PT) em 2014, diz estar, de certa forma, alterando o cenário político. "Na minha opinião, mudar... ele não vai mudar o país. Mas o que eu posso dizer? Ele vai tentar mudar. É melhor você tentar mudar do que ficar nessa mesmice aí. O PT tentando acabar com o país, roubo por cima de roubo, ninguém faz nada", comentou. "Se não der certo, a gente vai nas ruas, pede o impeachment. Ou, então, espera os quatro anos [de mandato]."

Sobre as polêmicas a respeito de posições de Bolsonaro a respeito de ditadura, direitos da mulher, homofobia, entre outros, Silva diz que "ele tem seus defeitos". Mas o que ele espera mesmo é que algo se transforme no país. "Queria que quem ganhasse mudasse esse quadro. Porque não está fácil a vida."

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