Aliados chamam denúncia de Valério sobre Lula de "chantagem"; oposição quer investigação "imediata" do MP
Após a revelação, nesta terça-feira (11), de que o publicitário Marcos Valério, em depoimento ao Ministério Público em setembro deste ano, disse que o ex-presidente se beneficiou do dinheiro do mensalão e teria dado "ok" a empréstimos bancários do publicitário para financiar o esquema, tem sido chamada pela base governista de "assunto requentado" e "chantagem", enquanto parlamentares da oposição querem abertura imeadiata de investigação pelo Ministério Público. A nova denúncia de Valério foi publicada pelo jornal "O Estado de São Paulo".
Segundo a reportagem, os recursos foram depositados na conta da empresa do ex-assessor da Presidência Freud Godoy, que era espécie de "faz-tudo" de Lula.
Em nota oficial, o PT afirmou que depoimento foi vazado de maneira "inexplicável" e diz ainda que o publicitário age de maneira "desesperada" para tentar diminuir a pena que recebeu no STF.
O deputado Miro Teixeira (PDT-RJ), cuja legenda é da base aliada dos governos do PT, cobrou nesta terça-feira (11) que o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva explique em público as relações que teve com Marcos Valério.
“Eu acho que o Lula tem o dever de falar, porque nós votamos no Lula, nós tivemos esta luta enorme pela democracia juntos. Não é para agora chegar um sujeito vigarista, condenado [se referindo a Marcos Valério], e ficar lançando lama numa história de muita luta”, afirmou o parlamentar pedetista.
Miro Teixeira afirmou que as denúncias de Marcos Valério poderiam estar “contaminadas” por chantagem, uma vez que ele teve a maior condenação entre os réus do processo do mensalão do STF (Supremo Tribunal Federal), com pena de 40 anos de reclusão e o pagamento de multas que podem ultrapassar R$ 2,7 milhões.
“O Marcos Valério já condenado, desesperado (...), não sabemos se isso aí não é parte de um mecanismo de chantagem, de chantagem financeira. [Ele] Perdeu absolutamente a credibilidade e fica sob a suspeita de estar querendo fazer chantagem para não inventar coisas. O que ele disser hoje não é considerado tanto que o Ministério Público, que não considerou para o efeito de pedir redução da pena dele e os ministros do Supremo também não consideraram. Como disse o ex-ministro do Supremo Ayres Britto, ele é um jogador”, continuou Teixeira.
"Isso é um assunto requentado. Isso é um assunto de 2005, levantado e devidamente respondido. As minhas contas de campanha são públicas e aprovadas pelos tribunais eleitorais. Não houve nenhum tipo de pagamento", disse o senador Humberto Costa (PT-PE), citado por Valério nas novas denúncias.
Para o presidente da Câmara, Marco Maia (PT-RS), o depoimento de Valério não tem credibilidade. "É uma declaração desequilibrada, descontextualizada, que vem oito anos depois do processo iniciado. Me parece muito mais que tenha objetivo de confundir o processo já em andamento, já julgado", afirmou. "Insistir nessa tecla é tentar manter vivo um tema que já foi superado e discutido à exaustão pelo Brasil, pelo país, pela Câmara e pelo Senado, e pelo STF", disse Maia, que acha improvável que o PT saia prejudicado desse episódio. "O PT enfrentou todo esse debate e continua crescendo."
"Infelizmente a declaração veio de alguém que foi condenado. E é algo recheado de sentimento de ira", disse ainda o senador Walter Pinheiro (BA), líder da bancada do PT no Senado.
O presidente do Senado também defendeu Lula das acusações. "Se existiu [o depoimento], é uma profunda inverdade porque a pessoa que disse não tem autoridade para falar sobre o presidente Lula, que é um patrimônio do país, da história do país por sua vida e tudo que ele tem feito", declarou José Sarney (PMDB-AP).
O deputado Paulo Teixeira (PT-SP) chamou o último depoimento de Marcos Valério ao MP de “abraço de afogado” no ex-presidente Lula. “O Marcos Valério tenta dar um abraço de afogado. Ele já foi condenado a 40 anos de prisão ele tenta envolver novas personagens para obter a diminuição de sua pena. Acho que esta é sua estratégia.”
Oposição quer investigação do MP
Por outro lado, a oposição defende que, diante de mais evidências, o MPF (Ministério Público Federal) abra uma investigação incluindo o ex-presidente, que ficou de fora do processo do mensalão. Na avaliação da maioria dos ministros do STF, o escândalo se refere ao esquema de pagamento de propina pelo PT, por meio de Marcos Valério, seus sócios e funcionários para partidos políticos em troca de apoio em votações em favor do governo federal no Congresso Nacional.
O líder do PPS, Rubens Bueno (PR) afirmou que irá cobrar novamente um posicionamento do MPF. No início de novembro, PPS e PSDB protocolaram uma representação no MPF pedindo que Lula fosse investigado.
“Isso que está acontecendo é algo que há tempos que estamos a fim de esclarecer à sociedade brasileira o que significa Lula no poder ao longo de oito anos. É o caso da Rosemary, que esta aí há 10 anos como chefe de gabinete da Presidência da República. E agora vem mais esta denúncia de que Marcos Valério disse que fazia empréstimo pessoal a Lula e ele teria sido o grande articulador dos negócios com a Portugal Telecom e trazendo para cá recursos para o PT”, afirmou Bueno.
“Diante das declarações dadas ao Ministério Público não resta outro caminho. É abertura imediata de inquérito”, afirmou o deputado Roberto Freire (PPS-SP).
Para o senador Randolfe Rodrigues (PSOL-AP), entre as revelações feitas por Marcos Valério, a mais grave é a declaração de que a defesa do publicitário no julgamento do mensalão é paga pelo PT. “O mais grave de tudo é a informação que revela que as contas do advogado de Marcos Valério são pagas pelo PT. (...) Isso é algo grave e precisa uma explicação formal, no mínimo, em especial das lideranças do PT no Senado e na Câmara.”
Randolfe rejeitou o argumento de que o depoimento de Valério não tem credibilidade por ter sido dado num momento de “desespero”, como alegam parlamentares da base aliada do governo. “É no desespero que a verdade aparece. Tem a máxima que diz que as comadres brigam e a verdade aparece. Acho que essa é uma situação clara disso.” O senador defende que Valério seja chamado para prestar esclarecimentos nas comissões do Congresso Nacional e disse que pretende, à tarde, conversar com os líderes dos partidos na Câmara e no Senado para ver qual encaminhamento será dado.
Valério no Senado
A bancada do PSDB - principal legenda de oposição ao governo federal - irá se reunir na tarde de hoje para definir quais ações o partido tomará a partir das denúncias de Marcos Valério.
Segundo o senador Alvaro Dias (PSDB-PR), os tucanos poderão encaminhar uma nova representação ao Ministério Público para pedir investigações sobre o assunto ou encaminhar um complemento a outro pedido feito há um mês.
Outra questão que será definida pelos integrantes da bancada do PSDB é a possibilidade de tentar aprovar um pedido de convite para que Marcos Valério prestasse depoimento sobre o assunto no Senado.
“Isso [o depoimento no Senado] poderia ser o início da sua própria preservação. [Marcos Valério] Não tem autoridade moral para denunciar quem quer que seja, mas sua denúncia não pode ser ignorada”, afirmou Dias.
Entenda as novas denúncias de Valério
Em depoimento ao Ministério Público em 24 de setembro, a que o jornal "O Estado de São Paulo" teve acesso, o empresário Marcos Valério, considerado o operador do mensalão, teria dito que o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva usou dinheiro do esquema para "despesas pessoais". Os recursos teriam chegado a Lula por meio de depósito na conta da empresa de Freud Godoy, ex-assessor do petista.
Segundo o depoimento de Valério reproduzido pelo jornal, Lula teria ainda dado "ok" para empréstimos de Valério junto a bancos para financiar o esquema do mensalão. A contrapartida pela ajuda de Valério teria sido o pagamento da defesa do publicitário no julgamento do mensalão no Supremo Tribunal Federal, no valor de R$ 4 milhões. O PT nega ter pago os honorários, e o advogado de Valério, Marcelo Leonardo, não se manifestou.
As novas denúncias de Valério citam ainda o senador Humberto Costa (PT-PE) e o prefeito de São Bernardo do Campo (SP), Luiz Marinho (PT). Sobre Costa, Valério afirma que Costa teria recebido, em sua campanha de 2002, R$ 512.337,00, por meio de sua tesoureira de campanha, Eristela Feitoza. "Isso é um assunto requentado. Isso é um assunto de 2005, levantado e devidamente respondido", respondeu o senador.
Já sobre Marinho, Marcos Valério diz que ele teria sido o intermediário para a edição de uma medida provisória que beneficiou o banco BMG, dando à instituição exclusividade, por 90 dias, na exploração de crédito consignado. Em nota, o prefeito negou a acusação.
O depoimento de Valério ao MP acusa ainda Paulo Okamotto de tê-lo ameaçado de morte. Okamotto é o atual presidente do Insituto Lula e amigo pessoal do ex-presidente. Procurado pelo jornal, Okamotto disse que falará sobre o caso quando tiver mais informações.
Outra denúncia agora revelada pelo depoimento de Valério afirma que o PT teria pedido ao publicitário R$ 6 milhões para que o empresário Ronan Maria Pinto, de Santo André (SP), deixasse de chantagear Lula, o então secretário da Presidência Gilberto Carvalho e o ex-ministro da Casa Civil José Dirceu. Segundo o jornal, Valério teria se recusado a interferir nesse caso. Em nota, Ronan nega conhecer Valério.
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