Topo

Jango tinha tropas leais e poderia enfrentar o golpe, diz Pedro Simon

Arte/UOL
Imagem: Arte/UOL

Bruna Borges

Do UOL, em Brasília

31/03/2014 06h00

Amigo do então presidente João Goulart, o senador Pedro Simon (PMDB-RS), 84, acompanhou o golpe militar de 1964 de perto. Simon conta que o golpe “pegou todos de surpresa”. “Ninguém pensava que ia estourar a coisa como aconteceu.”

Apesar de março de 64 ter sido um mês de agitação política, segundo o parlamentar, no dia 31 pouco se acreditava na possibilidade concreta de ocorrer um levante militar que tiraria Jango do poder.

Em 1964, Simon era deputado estadual pelo PTB do Rio Grande do Sul e estava em Porto Alegre quando Jango, seu companheiro de partido, deixou o país e partiu para o exílio no Uruguai.

“O presidente do Senado simplesmente disse: está vaga a Presidência da República,  presidente João Goulart está no exterior em lugar incerto e não sabido e em seu lugar vai tomar posse o presidente da Câmara, o deputado Ranieri Mazzilli."

Segundo Simon, Tancredo Neves, então deputado federal, estava lá e protestou. “Ele gritava:  'canalhas, canalhas'”, conta o parlamentar.

Em um período de polarização entre a esquerda e a direita, faça suas escolhas e veja como você passaria pelos 21 anos da ditadura no Brasil

Jogue

O antropólogo Darcy Ribeiro, que à época era o chefe da Casa Civil, enviou um ofício ao presidente do Senado, Auro de Moura Andrade, naquele momento informando que Jango estava em Porto Alegre, na casa do comandante do 3º Exército. E que estava à disposição do congressista. O ofício indicava endereço e telefone para localizar o presidente, mas, segundo Simon, a informação foi ignorada.

“Eu participei ao vivo do lado do presidente. Deposto de uma maneira estúpida. Um presidente que estava aqui no Brasil e o senador Auro de Moura Andrade, uma figura infeliz da história brasileira, por conta própria deu um golpe extraordinariamente escandaloso”, diz.

Na opinião de Simon, Jango possuía tropas leais ao seu governo e poderia ter comandado uma resistência aos militares que se rebelaram para tomar o comando da República.

Qual a sua história?

memoriasreveladas.arquivonacional.gov.br/Arquivo Nacional
Envie seu relato da época

“Naquela noite, o Jango ligou para o comandante do 2º Exército pedindo para ele ir com suas tropas em direção a Juiz de Fora para se contrapor ao general Mourão, que era contrário a ele  e tinha um contingente de menor importância de tropas militares”, conta Simon.

Amaury Kruel, o comandante do 2º Exército, pediu a Jango que escrevesse uma carta afirmando que era um democrata e que não instalaria o comunismo ao Brasil em hipótese alguma. Kruel alegava que estava sem condições de fazer a resistência porque a notícia do perigo de um golpe comunista havia se espalhado pelo país e existiam muitos focos de rebelião por parte das Forças Armadas, segundo Simon.

Ainda de acordo com o senador, Jango se recusou e afirmou que se sentiria humilhado se escrevesse a carta. “O Jango não quis dar a carta, porque ele achou que dando naquele momento, ficava muito apequenado, ele ficaria amarrado a um determinado grupo.”

“Eu tenho convicção que se o Jango tivesse escrito a carta, o Amaury Kruel teria condições de trancar a rebelião e teria condições de tentar uma nova caminhada para o país naquele momento”, opina Simon.

Ditadura

O senador destaca a importância da investigação histórica realizada pela Comissão Nacional da Verdade. “Parece mentira que os militares brasileiros fizeram tantas atrocidades. Cada dia se descobrem informações novas.”

Simon conta que não quis ir para luta armada para resistir à ditadura por acreditar que tal ação não teria êxito em um país de dimensões continentais.

“Não é que eu seja contra a guerrilha e luta armada, mas eu acho que o Brasil é grande demais. Não dá para comparar com Cuba, que é descer a serra e tomar conta de uma cidade. O Brasil é um continente”, compara.

Simon também valoriza a luta pela redemocratização como um dos poucos feitos do povo. Ele cita a Independência e a Proclamação da República como exemplos de feitos históricos executados por uma minoria que estava no poder. “A democracia pós-ditadura não. Os jovens foram para a rua em uma época que a gente não acreditava, todo mundo achando que nós estávamos fazendo papel de bobos.”

“Os jovens foram para rua para cobrar. Começaram a avançar, foram avançando, aí lançamos a campanha das Diretas Já. Os militares começaram a não ter o que fazer e foram se recolhendo. Nós fizemos um racha na Arena. E o MDB com um pedaço da Arena no Congresso Nacional elegeu o Tancredo presidente. Foi um feito de tal maneira com o povo na rua, com os jovens, que os militares viram que se eles entrassem ia ser um caos porque ninguém ia aceitar, ia morrer muita gente”, conta Simon.