Temer convocou Exército para se "agarrar ao poder", analisam especialistas
ATUALIZAÇÃO: Temer recua e revoga decreto que colocou Forças Armadas nas ruas de Brasília
A decisão do presidente Michel Temer de convocar o uso das Forças Armadas em Brasília por um período de sete dias é uma medida exagerada e movida por uma estratégia política para se manter no poder, de acordo com a opinião de analistas políticos e advogados constitucionalistas consultados pelo UOL.
As "Garantias da Lei e da Ordem" (GLO) são reguladas pela Constituição Federal, em seu artigo 142, pela Lei Complementar 97, de 1999, e pelo Decreto 3897, de 2001. Nelas, os militares recebem de forma provisória “a faculdade de atuar com poder de polícia”. O decreto de Temer está previsto para durar até o dia de 31 de maio, em todo o Distrito Federal, mas, segundo nota da Presidência, pode ter seu fim antecipado.
Para Rubens Beçak, constitucionalista e professor da USP, a aplicação da medida deveria ter em vista possíveis atos terroristas em grandes eventos, mas acabou distorcida. “Está sendo usada de uma forma descabida. É um governo que já não tem legitimidade e que procura se agarrar ao poder. Parece um golpe de Estado”, afirma.
O anúncio feito pelo ministro da Defesa, Raul Jungmann, sobre o decreto que autoriza o uso das Forças Armadas após a manifestação na Esplanada dos Ministérios não têm ligação direta com a votação das reformas trabalhista e da Previdência no Congresso Nacional, opina Jorge Zaverucha, professor de ciência política da UFPE (Universidade Federal de Pernambuco).
Ele [Temer] está lutando hoje para sobreviver e está mostrando que tem o apoio das Forças Armadas", analisa Zaverucha.
A duração de sete dias para a aplicação da medida é uma das evidências de que a decisão tomada por Temer foi política, diz o professor do curso de Gestão de Políticas Públicas da USP, Pablo
O senador Romero Jucá (PMDB-RR), líder do governo no Senado, afirmou em discurso no plenário na noite desta quarta-feira (24) que o presidente Temer “tinha obrigação” de chamar as Forças Armadas para atuar nas ruas de Brasília, durante manifestação contra o seu governo, para evitar que “algum militar” agisse por conta própria. “Não adianta querer colocar ações do governo de forma distorcida: ‘o presidente Michel Temer está chamando as Forças Armadas para se sustentar’. Não, o presidente Michel Temer chamou as Forças Armadas porque um bando de marginais estava tocando fogo em ministérios", declarou.
Medida desproporcional
Nestor Castilho Gomes, sócio e advogado constitucionalista do Bornholdt Advogados, diz que é preciso ter uma justificativa clara para aplicação da medida.
Para o advogado, a atuação das Forças Armadas por meio das "Garantias da Lei e da Ordem" só é possível quando houver um reconhecimento formal pelo chefe do Executivo do Estado de que a Polícia Militar é incapaz de desempenhar as suas funções. “É bastante questionável a necessidade desse decreto. Creio que a PM é capaz de manter a ordem no Distrito Federal. O decreto, ao que parece, veio após o fim do ato e ainda irá se manter até o fim do mês.”
Segundo o Ministério da Defesa, as GLOs ocorrem por “ordem expressa” da Presidência da República em casos em que há o “esgotamento das forças tradicionais de segurança pública” e “em graves situações de perturbação da ordem”. Em coletiva, a Polícia Militar do DF informou que 1.400 agentes participaram da segurança do ato nesta quarta-feira. Ainda segundo a corporação, 35 mil manifestantes participaram do ato. A PM conta hoje com 11.672 policiais.
Para Beçak, a aplicação da GLO em Brasília chama atenção pelo ineditismo e causa preocupação ao remeter a medidas utilizadas pelo regime militar. “A última vez que isso ocorreu foi durante o governo de João Figueiredo, em outra Constituição, outro regime”, diz.
O professor considera que a medida vai contra a ordem constitucional. “Manifestações, ainda que com episódios de violência, precisam ser vistas como manifestações”, afirma.
Ninguém está dizendo que um prédio público pode ser destruído, mas nós temos a polícia para situações como essa", diz Beçak.
Gomes lembra ainda que isso não deve impedir a realização de futuras manifestações. “A utilização das forças armadas não deve impedir o exercício de outros direitos fundamentais, como o direito à reunião, que inclui o direito de protesto.”
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