STF tem maioria por restringir foro privilegiado, mas Toffoli pede vista
O ministro Dias Toffoli, do STF (Supremo Tribunal Federal), pediu vista nesta quinta-feira (23) do julgamento da ação que pode levar à restrição das regras do foro privilegiado para congressistas. Quase seis meses antes, a deliberação do Supremo sobre o caso havia sido interrompida por um pedido de vista do ministro Alexandre de Mores. O placar ficou em 8 a 0 para a aplicação de restrições para deputados federais e senadores.
Ainda falta o voto de três dos onze ministros para que o julgamento seja encerrado, o que não tem data para ocorrer.
A maioria dos ministros acompanhou o voto do relator, Luís Roberto Barroso. Também seguiram o voto de Barroso os ministros Marco Aurélio Mello, Rosa Weber e Cármen Lúcia, presidente do STF, na primeira parte do julgamento, em maio, além de Alexandre de Moraes, Celso de Mello, Edson Fachin e Luiz Fux.
Para Barroso, só teriam direito ao foro privilegiado políticos acusados por crimes cometidos no exercício do mandato e que também tenham relação com o cargo ocupado.
Barroso defendeu que a restrição do foro seja aplicada apenas a deputados federais e senadores, e não às demais autoridades que hoje têm direito ao foro privilegiado.
Por exemplo, um deputado que cometesse um crime no trânsito, seria julgado em primeira instância. Já um deputado flagrado negociando propina em troca da aprovação de projetos na Câmara, permaneceria sendo julgado pelo STF.
A Constituição Federal prevê que deputados federais, senadores, ministros de Estado, o presidente da República e seu vice devem ser julgados pelo STF em processos criminais. Já no caso de governadores, por exemplo, a competência é do STJ (Superior Tribunal de Justiça).
O ministro Alexandre de Moraes, primeiro a votar hoje, divergiu parcialmente do voto do relator.
O ministro não exigiu, como Barroso, que o crime tenha relação com o cargo. Ou seja, um crime de trânsito praticado durante o mandato ainda seria abrangido pelo foro.
Moraes também defendeu que seja alterado o entendimento do STF de que investigados em processos que envolvem pessoas com foro possam também ser julgados no STF caso exista relação entre os fatos do processo.
O ministro Edson Fachin, segundo a apresentar seu voto hoje, acompanhou integralmente o voto de Barroso "por compreender que a regra de competência para crimes comuns só se aplica para congressistas desde que condigam com o exercício da função", afastados atos anteriores à diplomação. "A prerrogativa não pode abranger quem à época dos fatos sequer era parlamentar. Somente após a diplomação", declarou.
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"O alcance da inviolabilidade [dos parlamentares] pode ser examinado à luz dos atos por eles praticados", acrescentou Fachin.
Sétimo a votar, o ministro Luiz Fux também acompanhou o relator. Em voto bastante sucinto, que não passou de três minutos, o ministro disse entender que, por conta da rigidez da Constituição, há "uma necessidade de mutação constitucional, como já fizemos em vários casos --e há de exemplo a união estável homoafetiva e assim por diante".
O ministro Dias Toffoli, oitavo a se pronunciar, iniciou sua fala lembrando que o Congresso delibera sobre o foro. Ele apontou que o Senado aprovou a PEC (Proposta de Emenda à Constitucional) em dois turnos, e sua admissibilidade foi aprovada nesta quarta (22) pela CCJ (Comissão de Constituição e Justiça) da Câmara e acabou pedindo vistas do julgamento.
A presidente da Corte, ministra Cármen Lúcia, interveio, dizendo que a ação em julgamento hoje já havia sido incluída por ela na pauta antes de os deputados federais agendarem a votação da matéria na comissão.
Ele argumentou ainda que a suposta impunidade derivada do foro especial por prerrogativa de função se tornou "uma espécie de folclore" nas redes sociais, citando em seguida todas as ações penais que estão sob sua responsabilidade e o "status" de cada uma.
Toffoli disse ter feito o registro porque, no seu gabinete, pelo menos, "não há que se falar em prescrição".
Dizer que esta Corte não delibera, não investiga e não julga é uma tremenda mentira!"
Ministro Dias Toffoli
Para Toffoli, "o texto [da PEC] do Congresso é muito além desse". "Lá, sim, se acaba com o foro", declarou.
Questionado por Toffoli, o relator afirmou que apenas o Congresso Nacional poderia extinguir totalmente o foro privilegiado.
"Acho que acabar com o foro é uma prerrogativa constitucional do Congresso", disse.
Após o pedido de vista de Toffoli, o ministro Celso de Mello pediu para adiantar seu voto e acompanhou o relator Roberto Barroso a favor da restrição das regras do foro privilegiado.
“Reconheço, tal como já havia afirmado em agosto de 2012 no início do julgamento da ação penal 470 [mensalão] de Minas Gerais, que a prerrogativa de foro merece nova discussão para efeito de uma abordagem por parte da jurisprudência do Supremo Tribunal Federal que somente a reconheça, mediante legítima interpretação do texto de nossa Constituição, em relação aos delitos praticados in officio, portanto durante vigência de titularidade funcional e que guardem íntima conexão com o desempenho da atividade funcional inerente àquele cargo”, disse Celso de Mello.
Entenda o caso
O julgamento foi iniciado em 31 de maio com o voto do relator, ministro Luís Roberto Barroso.
Segundo o relator, o atual sistema é "muito ruim e funciona mal", além de levar à impunidade e trazer "desprestígio" ao Supremo.
Barroso foi favorável à restrição da prerrogativa de foro apenas em casos de crimes cometidos no exercício do cargo e relacionados às funções desempenhadas. O ministro também defendeu que, depois da fase de instrução (quando testemunhas são ouvidas pelo juiz e diligências são realizadas), a instância do processo não será mais afetada mesmo se o agente público mudar de cargo ou deixá-lo.
Na sessão seguinte ao voto de Barroso, em 1º de junho, o julgamento foi suspenso por pedido de vista do ministro Alexandre de Moraes.
O julgamento do tema partiu de questão de ordem levantada pela PGR (Procuradoria-Geral da República) no processo contra Marquinho Mendes (PMDB), hoje prefeito de Cabo Frio (RJ) e ex-deputado federal.
Ele chegou a ser empossado como suplente do deputado cassado Eduardo Cunha (PMDB-RJ), mas renunciou ao mandato parlamentar para assumir o cargo no município. Acusado de compra de votos em sua primeira campanha à prefeitura, Mendes trocou de cargo várias vezes, entre o município e a Câmara federal, o que por sua vez provocou a mudança de foro para o julgamento do caso diversas vezes.
Segundo números do STF citados pelo ministro Barroso, tramitam na Corte cerca de 500 processos contra pessoas com prerrogativa de foro.
De acordo com um estudo da Consultoria Legislativa do Senado, mais de 54 mil pessoas têm direito a algum tipo de foro privilegiado no Brasil, garantido pela Constituição federal ou por Constituições estaduais. Além de parlamentares, entre elas estão governadores, juízes e membros do Ministério Público, entre outros.
Foro no Congresso
O Congresso Nacional também analisa uma PEC que restringe o foro privilegiado de forma mais ampla.
O projeto no Congresso mantém o foro privilegiado apenas para o presidente e o vice-presidente da República, além dos presidentes da Câmara, do Senado e do STF.
Caso a proposta seja aprovada, deputados e senadores que hoje são julgados por corrupção no STF, por exemplo, passariam a ser julgados por juízes de primeira instância, como o juiz Sergio Moro, da 13ª Vara Federal de Curitiba, ou o juiz Marcelo Bretas, da 7ª Vara Federal do Rio de Janeiro, ambos responsáveis pelos processos da Operação Lava Jato em cada Estado.
A proposta analisada no Congresso não altera a proibição da prisão de parlamentares federais, que só pode ser feita em flagrante de crime inafiançável. Nesses casos, o processo deve ser remetido dentro de 24 horas à respectiva Casa Legislativa, para ser resolvida pela maioria dos deputados ou senadores.
A PEC ainda terá um longo caminho a ser percorrido na Câmara. Isso porque, após ser aprovada na CCJ, a proposta terá que ser analisada por comissão especial, criada especificamente com essa finalidade. Depois, o plenário terá que votar a matéria em dois turnos, sendo necessários 308 votos (3/5 dos 513 deputados) em cada um deles.
Por se tratar de uma emenda constitucional, se a Câmara modificar o texto aprovado no Senado o projeto tem que ser votado novamente pelos senadores, também em dois turnos de votação. A promulgação, que não precisa passar por sanção presidencial, só ocorrerá se um mesmo texto for aprovado sem alterações pelas duas Casas.
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