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Prisão de ex-governador é necessária, defendem PF e MPF: Alagoas 'era dominada por organização criminosa'

Foto de 2013 mostra o ex-governador Teotônio Vilela Filho (PSDB) entre o senador Renan Calheiros (PMDB-AL) e a então presidente Dilma Rousseff (PT) em cerimônia de inauguração do primeiro trecho do Canal do Sertão Alagoano, em Água Branca (AL) - 12.mar.2013 - Roberto Stuckert Filho/PR
Foto de 2013 mostra o ex-governador Teotônio Vilela Filho (PSDB) entre o senador Renan Calheiros (PMDB-AL) e a então presidente Dilma Rousseff (PT) em cerimônia de inauguração do primeiro trecho do Canal do Sertão Alagoano, em Água Branca (AL) Imagem: 12.mar.2013 - Roberto Stuckert Filho/PR

Carlos Madeiro*

Colaboração para o UOL, em Maceió

30/11/2017 14h13Atualizada em 01/12/2017 13h59

Alagoas era comandada por uma "organização criminosa" de "pessoas abastadas", afirmaram os membros da PF (Polícia Federal) e do MPF (Ministério Público Federal) que atuaram, nesta quinta-feira (30), na Operação “Caribdis”. A ação apurou o pagamento de propina na construção de trechos de obras do Canal do Sertão, em um esquema que envolvia o ex-governador Teotônio Vilela Filho (PSDB). Ele nega qualquer irregularidade.

Inicialmente, os investigadores apontam para um pagamento de R$ 2,8 milhões em propinas a Vilela e outros dois secretários de seu governo.

Segundo os investigadores, o esquema contava com a participação de Vilela Filho, secretários de Estado e até familiares. O ex-governador comandou o Estado entre 2007 e 2014. Antes, foi senador e presidiu o PSDB entre 1996 e 2001, sendo um dos nomes fortes do partido durante o governo de Fernando Henrique Cardoso.

Nesta manhã, policiais cumpriram 11 mandados de apreensão em Maceió, na região metropolitana, em Salvador, Brasília e Limeira (SP). A PF e o MPF chegaram a pedir a prisão dos investigados, incluindo o ex-governador, mas a Justiça negou a solicitação. O processo corre sob sigilo.

O Canal do Sertão é uma mini-transposição do rio São Francisco com 107 quilômetros já inaugurados para levar água a regiões do semiárido alagoano. Quando concluída, a obra deve ter 250 quilômetros de extensão e passar por 42 municípios. O custo total estimado é de R$ 3 bilhões.

O superfaturamento indicado pelas investigações até o momento é de pelo menos R$ 78 milhões, delatadas em acordo de colaboração da Odebrecht. O alerta de sobrepreço na obra já havia sido feito por auditoria do TCU (Tribunal de Contas da União) e noticiada pelo UOL.

Organização criminosa

Procuradora da República em Alagoas, Renata Ribeiro Baptista afirma que o governo alagoano montou um suposto esquema ilegal com envolvimento de pessoas, inclusive fora da cúpula estatal.

"Houve participação de familiares, não era somente pessoas da cúpula. Ou seja, era um Estado dominado por uma organização criminosa. Quando chega a esse quadro, a prisão é necessária", disse, ao defender o pedido de prisão feito e negado pela 2ª Vara Federal de Alagoas.

Os nomes dos familiares não foram revelados para não atrapalhar as investigações.

Para Renata, não há dúvida que a atuação da organização não se ateve apenas às obras no Canal do Sertão. "Se foi pego nessa obra, o modus operandi indica que possivelmente outras investigações aparecerão. Não é um modus sofisticado, não é algo inédito. É algo que deixa rastro, e que deixa rastro em outros casos", avalia.

"São várias condutas de corrupção, de fraude à licitação, de lavagem de dinheiro. Para cada obra existem muitos crimes envolvidos. A soma das penas é relevante", completou Renata.

A procuradora admite ainda que os valores desviados são maiores e que ainda estão sendo apurados. "A delação é de apenas uma das empresas, existem outras empresas que estão em negociações com o MPF para suas delações", disse.

30.nov.2017 - A procuradora Renata Ribeiro Baptista entre os delegados Bernardo Gonçalves de Torres e Daniel Silvestre de Lima durante entrevista coletiva sobre a operação "Caribdis" - Divulgação/MPF - Divulgação/MPF
A procuradora Renata Ribeiro Baptista entre os delegados Antonio José Lima de Carvalho e Bernardo Gonçalves de Torres durante entrevista coletiva sobre a operação "Caribdis"
Imagem: Divulgação/MPF

Pessoas abastadas

Segundo o delegado federal Antonio José Lima de Carvalho, coordenador da operação e da investigação, o pedido de prisão dos investigados ter sido negado é um ponto negativo por se tratar de pessoas influentes no Estado.

"São pessoas abastadas, que, ao saber da investigação, podem tentar dificultar o andamento dela. Essa obra e esse valor supostamente pago colocam em xeque toda credibilidade do aparato estatal. É como se fosse permitido e não houvesse uma reprimenda por parte do órgão estatal", afirma.

O delegado explicou que a investigação atual é um desdobramento da 23ª fase da Operação Lava Jato, batizada de operação Acarajé. Naquela ocasião, uma planilha foi apreendida na sede da Odebrecht em que eram citados três nomes da cúpula do governo estadual, entre eles o do governador Teotônio Vilela Filho, o "Bobão".

De acordo com as planilhas, propinas teriam sido pagas em três parcelas ao então governador, num valor de R$ 2 milhões. Ao todo, somando propinas aos ex-secretários de Infraestrutura Marco Fireman e o ex-secretário executivo de Infraestrurtura Fernando Nunes, a propina chegou a R$ 2,8 milhões.

Segundo o delegado, as entregas foram acertadas e feitas em 2014. No caso, não haveria ligação entre os valores e as eleições. "Os pagamentos ocorreram em 2014, mas as pessoas que aqui são investigadas não disputaram mandatos eletivos naquele ano", afirma.

A PF afirma ainda que as delações foram apenas ponto de partida para investigação, e que recibos de passagens aéreas e de hospedagens comprovariam a vinda de executivos da empresa para negociar a propina.

"Eles fraudaram o edital de modo a inserir as cláusulas que permitissem que as empresas OAS e Odebrecht participassem e ganhassem a licitação. Quando da execução das obras, segundo delação, houve uma reunião aqui em Maceió e a cúpula solicitou vantagem indevida em decorrência da obra. Há um conjunto de provas que aponta isso", alega.

Ainda segundo o delegado, o governador Teotônio Vilela Filho participou da reunião, mas foi retirado da sala por um assessor no momento do acerto do pagamento de propina.

Em acordo de colaboração, delatores da Odebrecht haviam apontado que Vilela Filho teria recebido R$ 2,8 milhões em propina durante seu governo.

A Odebrecht disse que “está colaborando com as autoridades no esclarecimento de todos os fatos por ela revelados, e reafirma o seu compromisso com a verdade e com uma atuação ética, íntegra e transparente, no Brasil e em todos os países nos quais atua”. “A efetividade da colaboração da empresa já foi reconhecida não apenas pelo MPF, mas por autoridades de outros cinco países onde a empresa firmou acordos”.

Teotônio Vilela não exerce cargo eletivo e é cotado para ser candidato ao Senado em 2018. Em nota, a assessoria de imprensa do ex-governador afirmou que ele "tem consciência de que não praticou nenhum crime e que a verdade será restabelecida". "O ex-governador assegura ser o maior interessado na elucidação dessas investigações e que continuará à disposição das autoridades, contribuindo no que for preciso".

Marco Fireman é hoje secretário de Ciência, Tecnologia e Insumos Estratégicos do Ministério da Saúde. Em nota, disse que "está a disposição para prestar todos os esclarecimentos."

Já Fernando Nunes não exerce cargo no Estado mais e ainda não foi localizado pelo UOL.

Procurada pela reportagem, a OAS ainda não se manifestou.

*Colaborou Nathan Lopes, do UOL, em São Paulo