Brasil se encaminha para impasse institucional, diz ex-ministro Rubens Ricupero
O ex-ministro e ex-embaixador Rubens Ricupero, 81, disse nesta sexta-feira (6) que o Brasil "se encaminha para um impasse" institucional e político. A reflexão se baseia em parte nos desdobramentos do caso do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) com a Justiça.
"Vejo com muita preocupação o destino do sistema político brasileiro. Está cada vez mais disfuncional e nos encaminha para um impasse", afirmou por telefone ao UOL, de Genebra (Suíça), onde visita familiares.
Para Ricupero, a disputa em torno da constitucionalidade da execução da pena de prisão após condenação em segunda instância, como no caso de Lula, é mais um "sinal" de que a Constituição está sendo "cada vez mais contestada" e "deixando de funcionar".
"Se a Constituição, mesmo quando interpretada literalmente, conduz à impunidade, qual é a conclusão? A conclusão é que não vai haver possibilidade de punir", apontou o ex-ministro da Fazenda no governo Itamar Franco (1992-94) e ex-embaixador do Brasil em Washington. Ministros do STF (Supremo Tribunal Federal) discutiram na última sessão, na quarta-feira (4), sobre a prisão em segunda instância, apelando ao princípio constitucional da presunção da inocência e do cumprimento da pena somente após esgotados todos os recursos da defesa.
"Quer dizer, a aplicação da Constituição não torna possível punir em certos casos. É um negócio complicado, uma situação em que o sistema esteja se esgotando."
Ricupero se diz especialmente apreensivo com o fato de que não percebe, por parte de quem poderia propor mudanças efetivas, por exemplo os deputados e senadores, "a consciência da gravidade e da premência" da situação.
Na sua análise, nem mesmo as eleições de outubro terão o efeito desejado de "normalizar o país", uma vez que as mesmas regras e práticas reconhecidamente problemáticas do sistema eleitoral e político continuam em vigor.
Ao contrário, para Ricupero, o Congresso Nacional só teria produzido "reformas muito complicadas" no campo político. Uma delas foi a reforma nas normas do fundo de assistência aos partidos, que na visão do ex-ministro concentrou recursos nas grandes legendas e reforçou o domínio daqueles que as controlam. Quer dizer, teria impedido renovação com vias ao equilíbrio do sistema.
"Diante de uma crise muito grave, o que tem saído em coisa de reforma é insignificante", resume o ex-ministro.
Ele frisa a importância transformadora da reforma correta, no tempo correto, citando Nabuco de Araújo, pai do abolicionista Joaquim Nabuco e senador do Império, durante discurso em 1870 pela campanha da abolição da escravidão: "A oportunidade é a essência das coisas públicas. As reformas, por pouco que sejam valem muito na ocasião, não satisfazem depois, ainda que sejam amplas".
"Decepção" com Lula
Sobre o caso judicial de Lula, especificamente, Ricupero se diz "deprimido" e "entristecido', apesar de ele e Lula terem lutado em campos políticos adversários, diz.
![capas economist - Reprodução - Reprodução](https://conteudo.imguol.com.br/2013/09/26/quinta-feira-26set2013---a-revista-britanica-the-economist-voltou-a-estampar-o-brasil-na-capa-de-sua-edicao-para-a-america-latina-e-a-asia-com-uma-manipulacao-digital-que-mostra-o-cristo-1380213794068_615x300.png)
"É um desfecho triste. Dá uma certa pena, um momento da história do Brasil que acaba mal", lamenta.
"O momento em que o Brasil teve talvez a melhor imagem no exterior [da sua história] coincidiu com os últimos anos do governo Lula, 2009, 2010. Aquela famosa capa da [revista] 'The Economist' [com a imagem do Cristo Redentor decolando e o título 'Brasil decola']."
Para Ricupero, o caso do petista, condenado à prisão por corrupção e lavagem de dinheiro, acaba prejudicando agora a imagem do Brasil no exterior. "Não no sentido de crítica à Justiça, ao processo penal, mas de uma decepção com o país, que parecia estar dando certo. Uma decepção política com alguém que parecia ter levado o país a um ponto extraordinário."
Seja o primeiro a comentar
Essa área é exclusiva para você, assinante, ler e comentar.
O autor da mensagem, e não o UOL, é o responsável pelo comentário. Reserve um tempo para ler as Regras de Uso para comentários.