BV: o que é o mecanismo da publicidade que Bolsonaro pretende proibir
O chamado BV, um valor pago por veículos de comunicação a agências de publicidade por volume investido em anúncios, entrou na mira do presidente Jair Bolsonaro (PSL) na segunda-feira (7).
Jargão do mercado publicitário, a sigla BV se refere às expressões "bônus por volume" ou "bonificação por volume". Em resumo, o mecanismo funciona da seguinte forma: quanto mais publicidade uma agência destina a um veículo durante um determinado período de tempo (um ano ou um semestre), maior será o BV pago por este veículo à agência.
"Vamos buscar, junto ao Parlamento brasileiro, a questão do BV [Bônus de Volume]. Isso tem que deixar de existir. Aprendi há pouco o que é isso, e fiquei surpreso e até mesmo assustado", declarou Bolsonaro, sem detalhar o plano. "Vamos eliminar essas questões para que a imprensa possa cada vez mais fazer um bom trabalho no Brasil."
Os críticos do BV dizem que este tipo de pagamento leva agências a concentrarem anúncios em um mesmo veículo, mesmo que isso não atenda aos objetivos de comunicação do anunciante. Com isso, veículos menores, com menos caixa para pagar o bônus, receberiam menos anúncios. Por isso, a rede Globo seria uma das principais empresas afetada pela medida.
O governo Bolsonaro tem pronto um projeto de lei que proíbe o uso do mecanismo. O texto, segundo o jornal "Folha de S.Paulo", foi feito sob inspiração de executivos de agências de publicidade e executivos concorrentes da Globo e será apresentado pelo deputado eleito Alexandre Frota (PSL-SP) a partir de fevereiro.
Agências têm planos de incentivo
As leis e normas existentes para a publicidade no Brasil não abordam especificamente o BV, mas preveem a possibilidade de "planos de incentivo" por meio dos quais veículos de comunicação podem remunerar agências de publicidade de acordo com critérios acordados entre as partes.
Segundo as Normas-Padrão da Atividade Publicitária, o veículo de comunicação é "livre para configurar o respectivo plano, bem como para e não apenas: estabelecer critérios, objetivos, metas, âmbito, metodologia de aferição, duração, condições para habilitação, inclusão e exclusão de agência, e estipular os frutos, que poderão ser ou não de natureza monetária",
As normas-padrão têm respaldo legal e foram definidas pelo Cenp (Conselho Executivo das Normas-Padrão), uma entidade sem fins lucrativos mantida por associações de veículos, anunciantes e agências, entre outras organizações.
Os planos de incentivo até podem, em tese, incluir o pagamento de BV, mas também podem envolver outros critérios, como o pagamento da publicidade pelo anunciante ao veículo no prazo estipulado. Neste caso, sem o pagamento no prazo, o veículo não pagaria o incentivo à agência.
Fontes ligadas ao mercado publicitário ouvidas pelo UOL reconheceram a importância dos planos de incentivo na receita das agências, mas questionaram a força deles como indutor do investimento em propaganda em um determinado veículo.
Em nota, a Abap (Associação Brasileira das Agências de Publicidade) disse que "pretende dialogar com o novo governo e explicar como é a atual regra de compra de mídia no Brasil, desfazendo crenças e alguns mitos, de que o mercado brasileiro não possui boas práticas nesse segmento".
Segundo a associação, "no mercado brasileiro nenhum plano de mídia é adquirido sem a expressa aprovação por parte da equipe de marketing do cliente, que examina várias opções e solicita alterações sempre em busca de eficiência técnica".
Ainda de acordo com a associação, "os planos de incentivos são utilizados por quase todas as grandes atividades do país e convivem em harmonia com os fundamentos do liberalismo econômico".
A lei 12.232/2010, que rege a contratação de serviços de publicidade pelo poder público, prevê que as agências não podem "sobrepor os planos de incentivo aos interesses dos contratantes, preterindo veículos de divulgação que não os concedam ou priorizando os que os ofereçam". Os preços definidos via licitação ou contrato não se alteram "em razão da vigência ou não de planos de incentivo".
Alvo seria publicidade na TV aberta
O UOL apurou que o alvo do questionamento de Bolsonaro seria a intermediação feita pelas agências na compra de espaço publicitário na TV aberta -- meio no qual o pagamento de BV supostamente tem mais peso e influência. Segundo a fonte ouvida pela reportagem, as agências receberiam, dependendo do volume investido, "até 15% do valor total contratado pela compra desses espaços".
No mesmo discurso em que atacou o BV, o presidente prometeu o fim do que chamou de "privilégio" na destinação de verbas publicitárias do governo federal para determinados órgãos de imprensa "que não sejam parciais", e disse que "a imprensa livre é a garantia da nossa democracia".
Não há valor mínimo estipulado para pagamentos decorrentes de planos de incentivo. O que existe é o "desconto-padrão", uma das principais formas de remuneração das agências e que tem um piso de 20% definido nas Normas-Padrão da Atividade Publicitária. O desconto-padrão pode ser reduzido de 20% para 15%, em favor do anunciante, se o investimento anual bruto em espaço publicitário passar de R$ 25 milhões.
O desconto-padrão é bancado pelos veículos e incide sobre o valor gasto na concepção, execução e distribuição de propaganda. O pagamento se justifica, entre outros motivos, pela atuação das agências na captação de anunciantes e na cobrança dos valores pagos pelos mesmos, reduzindo custos dos veículos. Críticos desta forma de remuneração alegam que ela induz as agências a realizarem campanhas caras, indo contra o interesse dos anunciantes.
De acordo com a lei 12.232/2010, o poder público só pode contratar serviços de publicidade de agências que tenham o certificado de qualificação técnica emitido pelo Cenp, a mesma entidade que definiu, entre outras normas, o valor do desconto-padrão.
Na sexta-feira (4), o governo federal lançou sua nova identidade visual pelas redes sociais do presidente, marcando um contraponto justamente com a publicidade pela TV aberta.
"A parte mais importante é que a divulgação está sendo lançada na internet com custo zero, economizando mais de R$ 1,4 mi aos cofres públicos [gastos] se a ação fosse realizada pelos canais tradicionais de TV", escreveu Bolsonaro, ao divulgar a logomarca e o slogan de sua gestão.
A Secretaria Especial de Comunicação Social da Presidência da República não informou quais critérios utilizou para estimar o valor economizado.
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