Mineração supera ambientalistas em órgão de Minas que aprova barragens
A gestão de Fernando Pimentel (PT) no governo de Minas Gerais aumentou a força de representantes da mineração no órgão responsável por licenciar empreendimentos como a barragem de rejeitos da Vale em Brumadinho (MG), que rompeu na sexta-feira (25). A CMI (Câmara de Atividades Minerárias), ao mesmo tempo, reduziu a participação de ambientalistas em seu conselho.
Em abril de 2016, a câmara tinha cinco representantes da área ambiental. Em dezembro daquele ano, essa representação caiu para três integrantes, com a retirada do ICMBio (Instituto Chico Mendes de Biodiversidade) e da Comissão de Meio Ambiente da assembleia legislativa do estado. As mudanças foram feitas pelo então secretário de Meio Ambiente Germano Luiz Gomes de Oliveira - o mesmo que, nomeado pelo ex-governador Fernando Pimentel (PT), mudou regras para critérios de risco de barragens.
Já o setor de mineração tinha quatro integrantes em abril de 2016, e foi reforçado para cinco. Em dezembro, a Amig, associação de municípios com áreas de mineração, foi substituída pela Federação da Associações Comerciais e Empresariais de Minas. O setor mineral propriamente dito ficou com quatro representantes, ainda assim mais forte que os ambientalistas na CMI.
Em nota, a assessoria do ex-governador afirmou que "em nenhum momento, as medidas adotadas previram a concessão indiscriminada de licenças, mas o compromisso do governo de Minas Gerais de analisar os pedidos" (veja mais abaixo).
O UOL pediu uma entrevista com um representante da Secretaria do Meio Ambiente de Minas para explicar por que escolheu mais representantes da área de mineração na CMI do que da área ambiental. A secretaria enviou respostas por escrito sem explicar o motivo da decisão, se limitando a citar a lei mineira: metade da Câmara precisa ser formada por instituições governamentais e metade por instituições da sociedade civil, assegurando-se alguma participação de entidades das áreas ambiental, educacional e do setor produtivo.
72% dos pedidos foram aprovados
Levantamento do UOL mostra que oito dos 11 pedidos de barragens foram aprovados desde 2015, ano em que rompeu a barragem do Fundão, em Mariana (MG), matando 19 pessoas. Os órgãos ambientais ainda autorizaram 13 pilhas e cavas de rejeitos, em meio a 18 solicitações. Isso representa 72% de aprovação do total de 29 pedidos no período.
A secretaria destacou que o método de construção da Barragem do Fundão, que causou acidente em Mariana, e da B1, que se rompeu em Brumadinho, não são permitidos para novos empreendimentos. A proibição está em vigor desde 2016.
Para Júlio Grillo, integrante da CMI e superintendente do Ibama, o número de autorizações é "reflexo" do que acontece com a Câmara de Atividades Minerárias. Para ele, o órgão não representa preocupações com o meio ambiente. "A Câmara já foi montada para que a sociedade civil participe para referendar aquilo que já foi decidido."
Todos os projetos de 2018 foram aprovados com os votos contrários de Ibama, as ONGs de defesa do meio ambiente e da universidade: três votos contra todo o resto. Essa é a questão-chave nesses conselhos. Parece que o conselho é democrático, é paritário, mas não é. Na verdade, é um órgão para que você possa dizer assim: 'Olha, a sociedade foi consultada, mas a decisão já está tomada'.
Júlio Grillo, superintendente do Ibama
O engenheiro geólogo Antônio Geraldo da Silva, suplente dos profissionais liberais de mineração na CMI, concorda com Grilo. "Em princípio, fica meio esquisito", afirmou. "Há um desequilíbrio." Geraldo, no entanto, afirma não ver necessidade de mudanças no grupo.
Questionada sobre o fato de 72% das dos pedidos de licenças terem sido aprovados, a assessoria da secretaria disse que as decisões são tomadas "em reuniões públicas" e com "autonomia" pelos integrantes da CMI, que também fazem parte do Copam (Conselho Estadual de Política Ambiental).
Antônio Geraldo, suplente da vaga do Crea (Conselho Regional de Engenharia e Arquitetura) na câmara, afirmou à reportagem que Grillo tem razão quando diz que o grupo dos ambientalistas perdeu votações. No entanto, afirmou que o próprio chefe do Ibama-MG já aprovou alguns projetos quando viu que as condições ambientais estavam atendidas.
Ibama defende secar rejeitos antes de descartá-los
Levantamento do UOL com base em dados do sistema de decisões em licenciamento da Secretaria de Meio Ambiente de Minas Gerais mostra que, desde 2015, ano em que a barragem de Mariana se rompeu, foram expedidas oito autorizações para barragens de resíduos. São pedidos para represar rejeitos de minérios e reaproveitar os materiais. Um deles foi feito pela Samarco, de propriedade da Vale do Rio Doce e que é dona da barragem do Fundão em Mariana. Além disso, as mineradoras solicitaram 18 licenças para formar pilhas de rejeitos e cavas. Foram autorizadas 13.
Para Grillo, superintendente do Ibama, essa modalidade de acumulação de detritos oferece menos risco que as barragens, mas também não é totalmente segura. Ele defende que o método mais seguro seria retirar a água dos rejeitos do minério e compactar o material seco sob o solo. Depois seria feita uma cobertura de terra e, a seguir, seria colocada vegetação por cima. "O gasto representaria apenas 0,5% do lucro das mineradoras", aposta Grillo. Para a assessoria da Secretaria de Meio Ambiente, o tratamento a seco é uma "alternativa tecnológica" à disposição.
A secretaria destacou ainda que a B1 (Barragem 1) de Brumadinho iniciou suas atividades em 1970, mas não recebia rejeitos desde 2015. Afirmou que o objetivo do licenciamento era justamente desativar o depósito de resíduos. Questionada se os critérios para aprovação de licenças serão mudados, o governo informou que há projetos de lei para isso na Assembleia Legislativa de Minas.
"Era fundamental dar respostas", diz ex-governador
O ex-governador de Minas, Fernando Pimentel (PT), destacou, por meio de nota, que sua administração mudou leis para impedir novas barragens como o modelo usado em Brumadinho. Ele disse que a CMI atuou para atender a demanda de 3.000 pedidos de licença que se acumularam em 2015, quando assumiu o mandato.
Em nenhum momento, as medidas adotadas previram a concessão indiscriminada de licenças, mas o compromisso do governo de Minas Gerais de analisar os pedidos, conceder as licenças ou negá-las, de acordo com a legislação e os riscos de cada projeto.
Nota enviada pela assesssoria de Fernando Pimentel (PT)
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