Como Crivella perdeu apoios e passou a enfrentar um processo de impeachment
O processo de impeachment aberto por vereadores do Rio esta semana expõe o enfraquecimento do prefeito Marcelo Crivella (PRB) junto ao legislativo municipal carioca.
Inabilidade administrativa, descumprimento de acordos e denúncias sucessivas são apontados por parlamentares como os principais motivos para que sua base tenha se derretido.
Do total de 51 vereadores, 35 votaram pelo impeachment na última terça-feira (2), iniciando assim o trâmite inédito na capital fluminense. O processo vai apurar possível crime cometido pela gestão Crivella ao prorrogar, sem licitação, contratos com empresas que exploram publicidade em pontos de ônibus e outras instalações públicas.
Em setembro do ano passado, um pedido de impeachment havia sido rejeitado - àquela altura, com uma interlocução maior com os parlamentares, Crivella teve apenas 14 votos contrários.
Em um vídeo publicado em suas redes sociais, o prefeito afirmou que a abertura de processo de impeachment "não faz o menor sentido". Crivella também afirmou que o resultado da votação teve "motivação política".
"Falta palavra"
Eleito com 59% dos votos em 2016 contra Marcelo Freixo (PSOL), Crivella iniciou o mandato em 2017 com apoio suficiente para alterar, por exemplo, regras de cálculo do IPTU e para contrair mais de R$ 1 bilhão em empréstimos.
Três anos mais tarde, Crivella não tem apoio de alguns dos seus antigos aliados.
"A gestão Crivella é medíocre. [Em 2017] ele propôs que eu fosse exonerada do cargo, voltasse à Câmara, votasse pelo aumento do IPTU e depois retornasse à Secretaria. Na ocasião, eu me neguei, pois não sou manipulável", disse ao UOL Teresa Bergher (PSDB), que chegou a fazer parte do secretariado de Crivella no primeiro ano de gestão
Esta semana, ela votou pela abertura do processo de impeachment - que terá, agora, 90 dias de análises e culminará em nova votação na câmara.
"Além disso, a falta de cumprimento dos acordos que ele faz com os vereadores cria desgastes e gera insatisfações. Falta palavra", afirma Teresa.
Retaliações a quem vota de forma contrária
Até mesmo aliados de Crivella cogitam passar a apoiar o impeachment. Daqui a 3 meses, em votação na Câmara, 34 dos 51 votos derrubariam o prefeito carioca.
"Sou da base, mas deixo claro que posso mudar o meu voto. Aliás, isso explica em muito essa relação desgastada dos vereadores com o prefeito", diz Luiz Carlos (Podemos).
De acordo com ele, Crivella tem dificuldades para dialogar com parlamentares que, eventualmente, votem contra os seus interesses.
Oposição desde o início do mandato, Tarcísio Motta (PSOL) diz que não se surpreende com a perda de apoios.
"Crivella é adepto da velha política, da distribuição de cargos em troca de apoios, mas nem para isso se mostra hábil. Ele faz nomeações com base em indicações de vereadores e depois as exonera sem aviso prévio - faz isso, especialmente com quem, eventualmente, vota contra ele", diz.
Denúncias de corrupção, medidas impopulares
Vereadores também citam episódios de grande repercussão como o "Fala com a Márcia" -- Crivella indicou uma servidora que atenderia munícipes evangélicos em filas para cirurgias de catarata.
"Há um prazo de paciência do povo e da base aliada para que ele siga dizendo que encontrou uma prefeitura falida e cheia de problemas. Ao mesmo tempo acontecem denúncias de nepotismo, uso da máquina pública para fazer campanha do filho, favorecimentos específicos", afirma Tarcísio, em referência a denúncias de uso da máquina pública na campanha do filho para deputado federal.
Para o presidente da Câmara, Jorge Felippe (MDB), também pesam contra Crivella algumas falas que se tornam públicas.
Felippe se declarou impossibilitado de votar na abertura do pedido de impeachment: se Crivella for cassado, ele assumirá temporariamente a Prefeitura, já que o vice-prefeito da cidade, Fernando Mac Dowell, morreu no ano passado.
"Vai ficando difícil para um vereador se declarar defensor de um prefeito que critica abertamente a polícia militar e é investigado por utilizar a máquina pública na campanha do filho. As votações são abertas, os parlamentares vão deixando de querer associar as suas imagens a essa gestão", afirma.
No mês passado, durante uma reunião com servidores, Crivella chegou a afirmar que o Rio de Janeiro era uma "esculhambação" e que policiais militares subiam morros para pegar "arrego" [propina]. Depois, ele disse que as suas falas foram tiradas de contexto e afirmou respeito pela Polícia Militar do Rio de Janeiro.
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