Ingrato, linguajar chulo, meio ministro: as crises de Santos Cruz e Olavo
A disputa de espaço dentro do governo de Jair Bolsonaro (PSL) entre militares e a chamada ala "ideológica" ganhou um novo capítulo nos últimos dias. O ministro da Secretaria de Governo, general Carlos Alberto Santos Cruz, tem sido criticado abertamente e de forma constante pelo escritor Olavo de Carvalho --tido como "guru" de parte dos aliados de Bolsonaro. O militar reagiu levando o caso ao presidente.
O aparente estopim foi um post do humorista e apresentador Danilo Gentili no Twitter. No domingo, Gentili publicou um vídeo com um trecho de uma entrevista dada um mês antes por Santos Cruz à rádio Jovem Pan. Perguntado sobre como o governo poderia usar as redes sociais de forma a não causar ruídos, o ministro respondeu que a "tecnologia disponível" poderia ser utilizada, mas que "isso aí, tem que ser tomado muito cuidado, tem que ser disciplinado, a própria legislação tem que ser melhorada".
Gentili relacionou a declaração de Santos Cruz a uma suposta tentativa de controle da mídia e alertou para a formação de uma "cúpula estranha" no governo.
Menos de uma hora depois do tuíte de Gentili, Bolsonaro também usou essa rede social para afirmar que seu governo não fará qualquer regulamentação da mídia.
Segundo a coluna "Painel" da Folha de S. Paulo, um trecho da fala de Santos Cruz foi distribuído por WhatsApp por simpatizantes de Olavo de Carvalho na manhã de domingo, seguido pela mensagem de Bolsonaro contra a regulamentação da mídia.
Na tarde do mesmo dia, o deputado federal Eduardo Bolsonaro (PSL-SP) e o vereador Carlos Bolsonaro (PSC-RJ), filhos do presidente, defenderam a não regulamentação da mídia e a internet "livre". Carlos inclusive citou a importância das redes sociais para a eleição de Bolsonaro.
Pouco depois, Olavo de Carvalho voltou à carga contra Santos Cruz.
No domingo à noite, depois de a hashtag #ForaSantosCruz chegar aos assuntos mais comentados do Twitter no Brasil naquele dia, o ministro foi ao Palácio da Alvorada conversar com Bolsonaro. O blogueiro do UOL Tales Faria noticiou que Santos Cruz disse a Bolsonaro que havia uma operação coordenada contra ele. O presidente negou incentivar a "fritura".
Ainda na noite de domingo, Olavo de Carvalho comparou a situação de Santos Cruz à do ex-ministro Gustavo Bebianno, demitido em fevereiro da Secretaria-Geral da Presidência após a crise decorrente da denúncia do uso de candidaturas "laranjas" pelo PSL na última eleição.
Pelo menos um militar de alta patente teve uma reação pública à atitude de Olavo de Carvalho. O general da reserva Eduardo Villas Bôas, ex-comandante do Exército, chamou o escritor de "Trótski de direita" -- uma alusão a Leon Trótski, um dos líderes da revolução que implantou o comunismo na Rússia no começo do século passado.
Ontem à tarde, o deputado federal Marco Feliciano (PSC-SP), que já defendeu o impeachment do vice-presidente Hamilton Mourão (PRTB) --também militar--, falou que Santos Cruz deixou o Alvorada como "meio ministro".
Na noite de segunda, Olavo continuou disparando sua metralhadora virtual contra Santos Cruz.
O youtuber Bernardo Kuster --já recomendado por Bolsonaro no ano passado como opção de "canal de informação"-- até sugeriu um substituto para Santos Cruz: o deputado federal Paulo Eduardo Martins (PSC-PR).
As rusgas entre Carvalho e Santos Cruz não vêm de hoje. No fim de março, depois de ataques verbais do escritor ao vice-presidente Hamilton Mourão (PRTB) --general da reserva do Exército-- e aos militares do governo de forma geral, Santos Cruz falou em "desequilíbrio evidente" pelo "linguajar chulo" usado por Carvalho.
No momento, a disputa tem como pano de fundo a comunicação do governo Bolsonaro, que está subordinada ao ministério comandado por Santos Cruz.
O general questionou os valores que a Secom (Secretaria de Comunicação da Presidência) queria gastar para divulgar do projeto de reforma da Previdência, uma das principais bandeiras do governo.
Santos Cruz também desautorizou uma ordem da Secom para que toda a publicidade estatal passasse pelo órgão, decisão tomada um dia depois do veto de Bolsonaro a uma propaganda do Banco do Brasil estrelada por jovens tatuados e de cabelos coloridos tirando selfies com frases como "faz carão" e "cara de diva irritada". O comercial tem 50% de atores negros e uma personagem transexual. "A linha mudou. A massa quer o quê? Respeito à família", criticou o presidente.
Ontem, Bolsonaro negou a existência de divisões no governo. "Não existe grupo de militares, nem grupo de 'Olavos'. É tudo um time só", afirmou.
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