'É como se tivesse sido morto outra vez', diz irmão de citado por Bolsonaro
O advogado e ex-vereador Marcelo Santa Cruz comentou hoje as declarações de Jair Bolsonaro (PSL) sobre seu irmão, Fernando Santa Cruz, desaparecido desde a ditadura militar: "É como se Fernando tivesse sido morto outra vez", comparou.
Ontem, o presidente da República disse que "se o presidente da OAB quiser saber como é que o pai dele desapareceu no período militar, conto para ele. Ele não vai querer ouvir a verdade".
O presidente da Ordem dos Advogados do Brasil é Felipe Santa Cruz, filho de Fernando, desaparecido desde a ditadura militar, e sobrinho de Marcelo - que conversou com jornalistas na tarde de hoje na sede de uma ONG que ele fundou no Recife.
Marcelo afirmou hoje que a família quer que o desaparecimento do irmão seja reaberto pela Corte Interamericana de Direitos Humanos, ligada à OEA (Organização dos Estados Americanos).
"O governo brasileiro prestou várias informações à Corte negando a prisão e o sequestro de Fernando. [...] A Corte deu o caso por encerrado. Agora, com a declaração do presidente Jair Bolsonaro, é o caso de reabrir o caso porque ele deu uma nova informação", afirmou.
Fernando estava na casa de Marcelo no Rio de Janeiro quando saiu para encontrar um amigo e não voltou mais em 1974.
"Ele [Bolsonaro] tem informações que a família não teve, nem a Comissão da Verdade, que são informações dos porões da ditadura", acrescentou.
Bolsonaro se queixava de investigação da facada
Ontem, Bolsonaro se referiu ao desaparecimento de Fernando Santa Cruz quando comentava a atuação da OAB na investigação do caso de Adélio Bispo dos Santos, que o atacou com uma faca durante a campanha eleitoral no ano passado.
"Por que a OAB impediu que a Polícia Federal entrasse no telefone de um dos caríssimos advogados [de Adélio]? Qual a intenção da OAB? Quem é essa OAB?", questionou, antes de citar o desaparecimento.
"Não é a minha versão, é a que? a minha vivência me fez chegar a essas conclusões naquele momento. O pai dele integrou a Ação Popular, o grupo mais sanguinário e violento da guerrilha lá de Pernambuco, tá ok? E veio a desaparecer no Rio de Janeiro", completou Bolsonaro.
Mais tarde, o presidente voltou a comentar o assunto. Enquanto cortava o cabelo, ao vivo nas redes sociais, Bolsonaro afirmou que Fernando Santa Cruz não foi morto por militares, mas por integrantes do grupo no qual militava.
"De onde eu obtive essas informações? Com quem eu conversei na época, oras bolas. Não foram os militares que mataram ele, não, tá? É muito fácil culpar os militares por tudo o que acontece", afirmou.
Quem foi Fernando Santa Cruz
Fernando Augusto de Santa Cruz Oliveira consta da lista de 434 nomes de mortos e desaparecidos políticos disponível no Relatório da Comissão Especial sobre Mortos e Desaparecidos Políticos, ligada ao governo federal.
Fernando nasceu no Recife em 1948, era estudante universitário, funcionário público e integrante do grupo de esquerda Ação Popular Marxista-Leninista, de resistência à ditadura militar.
Era casado e tinha um filho de dois anos, o atual presidente da OAB, quando desapareceu em fevereiro de 1974, no Rio de Janeiro.
"Eduardo e Fernando foram presos nessa data de 23 de fevereiro de 1974, possivelmente por agentes do DOI-CODI do I Exército [órgão de repressão do governo brasileiro durante a ditadura militar], Rio de Janeiro, e nunca mais foram vistos", diz o relatório.
O documento aponta duas hipóteses para o desparecimento de Fernando e Eduardo. Eles podem ter sido levados ao DOI-CODI do II Exército, em São Paulo.
"Essa indicação do DOI-CODI/SP como possível órgão responsável pelo desaparecimento de Fernando e Eduardo aponta para a possibilidade de os corpos dos dois militantes terem sido encaminhados para sepultamento como indigentes no Cemitério Dom Bosco, em Perus".
A segunda hipótese é a de que eles foram encaminhados a um lugar que ficou conhecido como Casa da Morte, em Petrópolis (RJ), "e seus corpos levados posteriormente para incineração em uma usina de açúcar".
No fim de junho, a mãe de Fernando e avó de Filipe, Elzita Santa Cruz, morreu aos 105 anos. Ela dedicou mais de quatro décadas à procura do filho desaparecido.
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