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Aliados de Bolsonaro empregam assessores de Flávio investigados pelo MP

O senador Flávio Bolsonaro (PSL-RJ) - 01.out.2019 - Mateus Bonomi/Agif/Estadão Conteúdo
O senador Flávio Bolsonaro (PSL-RJ) Imagem: 01.out.2019 - Mateus Bonomi/Agif/Estadão Conteúdo

Igor Mello

Do UOL, no Rio

30/10/2019 04h00

Resumo da notícia

  • Aliados da família Bolsonaro mantêm empregados ex-funcionários de Flávio Bolsonaro
  • Eles tiveram sigilos quebrados em inquérito do MP suspenso por Dias Toffoli (STF)
  • Deputados negam que assessores tenham sido indicados pela família Bolsonaro
  • No Senado, Flávio continua empregando cinco assessores investigados no Caso Queiroz
  • Outro ex-funcionário de Flávio trabalha hoje com Carlos Bolsonaro na Câmara do Rio

Levantamento feito pelo UOL em diários oficiais e folhas de pagamento de órgãos públicos revela que cinco dos 62 assessores e ex-assessores do senador Flávio Bolsonaro (PSL), cujos sigilos foram quebrados a pedido do MP (Ministério Público) do Rio, mantiveram cargos em gabinetes de aliados do filho mais velho do presidente Jair Bolsonaro (PSL). Outros seis alvos do MP foram mantidos como assessores da família.

Os funcionários de Flávio tiveram os sigilos fiscal e bancário quebrados pelo juiz Flávio Itabaiana, da 27ª Vara Criminal, no dia 24 de abril, como parte das investigações do Caso Queiroz. Os promotores Gaecc (Grupo de Atuação Especializada no Combate à Corrupção) investigavam a existência de uma possível rachadinha no gabinete de Flávio na Alerj (Assembleia Legislativa do Rio), prática em que assessores devolvem parte dos salários para o político que os contratou.

Segundo o MP, há indícios de que Queiroz era o operador desse esquema. A Promotoria via Flávio e Queiroz como suspeitos de cometer os crimes de organização criminosa, peculato e lavagem de dinheiro.

Em julho, o ministro Dias Toffoli, presidente do STF (Supremo Tribunal Federal), decidiu suspender todos os inquéritos e PICs (procedimentos de investigação criminal) que utilizassem dados de inteligência financeira sem supervisão da Justiça. A decisão de Toffoli se deu horas após um pedido da defesa de Flávio em uma ação de repercussão geral que tramita no Tribunal desde 2017.

No fim de setembro, novo pedido da defesa de Flávio foi acatado pelo STF: o ministro Gilmar Mendes determinou a suspensão de todas as investigações contra o senador até que a decisão de Toffoli seja avaliada pelo plenário da Corte —o julgamento está marcado para 21 de novembro.

Áudio revelado na semana passada pelo jornal O Globo, referente a uma conversa de Whatsapp ocorrida em junho passado, indica que Queiroz continua tendo influência política e sendo consultado sobre nomeações no Legislativo (ouça abaixo). Queiroz foi exonerado em outubro do ano passado do gabinete de Flávio na Alerj. O ex-assessor disse ao jornal que mantém influência política por ter "contribuído de forma significativa na campanha de diversos políticos no Estado do Rio de Janeiro".

Cargos na Alerj

Uma das principais aliadas da família Bolsonaro no Rio, a deputada estadual Alana Passos (PSL) deu lugar em seu gabinete a duas ex-assessoras de Flávio que tiveram os sigilos quebrados no Caso Queiroz. Amanda Prado Simoni e Graziella Jorge Robles de Faria mantêm até hoje os cargos no gabinete da parlamentar. Receberam em setembro, respectivamente, R$ 7.534,51 e R$ 4.970,34 líquidos.

Militar do Exército, Alana foi a única candidata do PSL a um assento na Alerj que contou com um pedido de votos de Jair Bolsonaro. A confiança também se materializou na vida partidária: presidente do diretório estadual do PSL no Rio, Flávio a escolheu para ser secretária-geral do partido.

Apesar da proximidade com Flávio e Jair, a deputada nega que a família Bolsonaro tenha sido a responsável pelas indicações. "Já conhecia Amanda e Graziella e precisava de pessoas de confiança para trabalhar no meu primeiro mandato', argumentou.

Ainda segundo a parlamentar, as duas assessoras têm sua confiança: "[Mantive as assessoras] Porque conhecia o trabalho das duas e, mais importante, confio nelas. O fato de terem tido o sigilo quebrado não torna nenhuma das duas suspeitas, criminosas ou incapazes para continuar exercendo suas atividade e contribuindo para um mandato. Dos 40 cargos a que tenho direito, só estou ocupando 17 justamente por ter escolhido profissionais de confiança e altamente capacitados", afirmou.

Outro deputado estadual do PSL que empregou ex-funcionários de Flávio é Renato Zaca. Em maio, após a quebra dos sigilos, ele nomeou Filomena Romanda da Silva Souza de Fonseca para um cargo na Comissão de Defesa e Proteção dos Animais da Alerj, presidida por ele.

Filomena deixou a vaga em julho, mas a exoneração não teve relação com as investigações, segundo o deputado. A assessora teve salário de R$ 5.109,18 líquidos em junho. "A funcionária perdeu o marido e pediu o desligamento para cuidar de questões pessoais", explicou Zaca.

Assim como Alana, ele também defendeu a manutenção da funcionária. "A Filomena trabalha na Alerj há cerca de 30 anos. O fato de uma pessoa ter o sigilo quebrado não torna ninguém suspeito e muito menos culpado. Ela foi mantida no cargo pelas competências profissionais e pelo amplo conhecimento do funcionamento das comissões."

Cargos em Brasília

Outros dois alvos do MP do Rio têm cargos em Brasília. Primo dos filhos do presidente e amigo do vereador Carlos Bolsonaro (PSC), Leonardo Rodrigues de Jesus, o Leo Índio, tem um posto no gabinete de Chico Rodrigues (DEM), senador por Roraima. Seu salário é de R$ 17.037,88 líquidos, segundo o Portal da Transparência do Senado.

Em Brasília, ele é presença frequente no Palácio do Planalto e virou uma espécie de "espião voluntário" do governo, elaborando "dossiês informais" sobre "comunistas e infiltrados".

O UOL tentou contato por e-mail e por telefone com o gabinete do senador, mas não obteve resposta. Em abril, Chico Rodrigues justificou a contratação à revista Época. "Conversei muito com ele, achei ele muito desenvolto. Um cara jovem, cheio de energia. Vi que ele conhece muita gente. Ter um assessor parlamentar com essa desenvoltura seria muito bom para mim", disse.

O outro nomeado é João Henrique Nascimento de Freitas —ele se encontra lotado na Vice-Presidência da República como chefe da Assessoria Militar de Hamilton Mourão, com salário de R$ 13.686,48 líquidos em agosto.

Freitas também exerce a função de presidente da Comissão de Anistia —vinculada ao Ministério da Mulher, da Família e dos Direitos Humanos, ela tem a função de avaliar os requerimentos de vítimas da ditadura militar.

A assessoria da Vice-Presidência da República informou que Freitas foi convidado por Mourão para atuar no órgão. A nota afirma ainda que o assessor não é investigado no Caso Queiroz.

Além dos cinco servidores, uma sexta investigada pelo MP do Rio chegou a ser nomeada por aliados. Gilza Gomes dos Santos Ramos foi lotada no gabinete do deputado estadual Anderson Moraes (PSL) na Alerj, mas acabou exonerada no começo de maio, duas semanas depois da quebra dos sigilos. O parlamentar nega que isso tenha influenciado na decisão: "Não sabia da quebra do sigilo. Ela não se adaptou e saiu por vontade própria, como outros que saíram."

Flávio e Carlos mantêm assessores

Como o UOL mostrou em maio, Flávio mantém empregados em Brasília Miguel Angelo Braga Grillo, seu chefe de gabinete, Lygia Regina de Oliveira Martam e Fernando Nascimento Pessoa. Empregos em seu escritório de apoio no Rio —senadores têm direito de manter esse tipo de estrutura em seus estados de origem— estão Alessandra Esteves Marins e Juraci Passos dos Reis.

Na ocasião, o senador defendeu a manutenção dos funcionários. "O Senado Federal possui um setor responsável por receber a documentação de todos os indicados e, somente após criteriosa análise por essa área, se dá a nomeação", disse, em nota. Flávio acrescentou que "o fato de ter sigilo quebrado não torna ninguém criminoso". Segundo ele, os assessores citados têm "reputação ilibada, larga e comprovada experiência".

Além dos cinco, a família Bolsonaro também emprega Nelson Alves Rabello. Ex-assessor de Jair Bolsonaro na Câmara dos Deputados, ele hoje está lotado no gabinete de Carlos Bolsonaro na Câmara dos Vereadores do Rio. Assim como o presidente, Rabello é militar da reserva.

Ele tem uma longa história em gabinetes da família Bolsonaro. Passou pelo de Carlos por um mês, entre fevereiro e março de 2005. Em seguida, foi nomeado na Câmara por Jair, permanecendo no cargo até maio de 2011. De lá, ficou entre junho e agosto do mesmo ano na equipe de Flávio na Alerj. Voltou a trabalhar com Carlos Bolsonaro entre agosto de 2011 e abril de 2017, por fim voltando ao staff de Jair Bolsonaro até o fim de seu mandato como deputado federal, em dezembro de 2018. Desde então, foi trabalhar com Carlos Bolsonaro pela terceira vez.

O chefe de gabinete de Carlos Bolsonaro, Jorge Luiz Fernandes, foi procurado por telefone e por mensagens no aplicativo WhatsApp pela reportagem, mas não retornou os contatos.

A reportagem do UOL também consultou as assessorias e chefias dos gabinetes sobre se os assessores em questão se manifestariam sobre a investigação do MP —ora suspensa, à espera de julgamento pelo STF—, mas eles não retornaram.

Áudio indica que Queiroz continua sendo consultado sobre nomeações

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