O que pensam os brasileiros que pedem a volta da monarquia?
Resumo da notícia
- Nesta sexta (15), comemora-se a Proclamação da República
- Ato marcou o fim da Monarquia no Brasil
- Passados 130 anos, há brasileiros que defendem abertamente esse sistema
- Para eles, o país era mais estável e menos corrupto sob a monarquia
A Proclamação da República, em 15 de novembro de 1889, foi um "golpe" que afundou o Brasil em corrupção. A solução? Restaurar a monarquia e o Poder Moderador e entregá-los com uma coroa a dom Luiz de Orléans e Bragança, bisneto da princesa Isabel.
Essa é a opinião de brasileiros de diferentes origens e profissões que dedicam parte de suas vidas a defender a volta da monarquia ao país, um regime que caiu há 130 anos, por pressão de republicanos liderados pelo marechal Manuel Deodoro da Fonseca.
O UOL ouviu partidários da monarquia e também consultou um professor para ponderar a opinião dos monarquistas.
'República é ilegítima'
"A República é um sistema ilegítimo. Foi instaurada contra a vontade popular através de um golpe militar que acabou se transformando em ditadura", afirma a professora de literatura e monarquista Guacyra Pereira, 43.
"Tornei-me monarquista por conta, estudando sozinha. O que motivou foi a série A Última Cruzada do Brasil Paralelo", famosa no Youtube.
Membro do movimento Nação Real, Guacyra é uma entre tantos monarquistas que se unem em reuniões e manifestações públicas em diversas regiões do Brasil, embora a restauração da coroa tenha sido rejeitada pela população em 1993.
Naquele ano, 10,3% dos eleitores, ou 6,7 milhões de pessoas, escolheram a restauração da monarquia em um plebiscito. Mas os apoiadores da monarquia perderam: a maioria ratificou o atual sistema republicano e presidencialista.
A corrupção seria menor?
Além de denunciarem um golpe de Estado, os monarquistas brasileiros dizem acreditar que a coroa seria um antídoto contra a corrupção no país.
"Tendo direito ao trono desde o nascimento, o imperador não precisa vender a alma aos partidos para chegar ao poder", diz o empresário André Martins de Oliveira, 46, morador de Itararé (SP).
Outro remédio anticorrupção, dizem os defensores desse regime, seria o Poder Moderador, uma prerrogativa do imperador que se sobrepõe ao Legislativo e Judiciário e que esteve à disposição dos últimos imperadores brasileiros.
Ele daria ao monarca brasileiro o direito de "dissolver o Parlamento, demitir o primeiro-ministro em caso de corrupção e ineficiência e convocar novas eleições", enumera o funcionário público César Rogério Jaques, 40, morador de Itu (SP). A cidade do interior paulista, inclusive, recebeu o título de Fidelíssima, concedido por dom Pedro 1º em 1823.
"Os agentes públicos iriam pensar muito antes de cometer algum ato de corrupção", diz Jaques, que também é membro do Movimento Itu Fidelíssima do Império e é cofundador da primeira rádio monarquista do Brasil, a Web Rádio Brazil Imperial, no ar desde agosto deste ano.
Primeiro vice-chanceler do Círculo Monárquico do Rio de Janeiro, o médico Rodrigo Brasileiro, 37, compara: "No período em que [o ex-presidente] Michel Temer (MDB) governou, ele era rejeitado por 80% da população, mas não houve meio de retirá-lo do poder".
O caderninho de Dom Pedro 2º
Dom Pedro 2º tinha um "famoso caderninho preto" e o "também famoso lápis fatídico", afirma o estudante de Relações Internacionais em Niterói (RJ) Matheus Guimarães, 24. "Ele anotava o nome dos políticos envolvidos em corrupção, e esses nunca mais conseguiam ocupar um cargo público", diz.
"Se estivéssemos na monarquia, escândalos como o mensalão e o petrolão jamais teriam acontecido, e mesmo que tivessem, teriam resultado na imediata dissolução do Parlamento e na prisão dos envolvidos", afirma o estudante, membro da Pró Monarquia, organização que atua como secretariado da família imperial. "Auxilia os príncipes e coordena ações para esclarecer a opinião pública acerca da necessidade de restaurarmos a monarquia."
Rodrigo Brasileiro cita o IPC (Índice de Percepção de Corrupção) para dizer que os países "mais democráticos, prósperos e honestos são monarquias parlamentaristas". É o caso da Inglaterra, Japão, Suécia, Noruega e Dinamarca.
Os monarquistas defendem a tese de que o Brasil tinha estabilidade econômica e social antes da República. "Estudando a nossa história e de outros países, descobri que éramos uma nação de respeito, tínhamos crescimento econômico, estabilidade política", diz Jaques.
Para o estudante de direito Arthur Oliveira Lage, 21, de Belo Horizonte, a eleição presidencial serve apenas para dividir o Brasil entre vencedores e perdedores. "Como não é eleito nem representa uma determinada visão ideológica, o rei é sempre o rei de todos, aquele que personifica a nação."
Até o dilema "direita versos esquerda" estaria resolvido, dizem os monarquistas. "Diferente do que muitos pensam, a monarquia não tem direita nem esquerda. É um sistema de governo que prevê eleições e pode ter um primeiro-ministro socialista, como na Espanha", defende Guacyra.
Quem assumiria a monarquia brasileira?
Para os monarquistas ouvidos pela reportagem, a restauração da monarquia significa a recondução dos Orléans e Bragança ao poder. "É graças a eles que temos hoje o nosso país. Todos os membros da família ainda hoje são preparados desde criança para governar", garante Oliveira.
Mesmo assim, o deputado federal Luiz Phillipe de Orléans e Bragança (PSL), conhecido como "Príncipe", fez campanha para o presidente Jair Bolsonaro (PSL), que o cortejou na terça-feira (12). "Você deveria ter sido meu vice, e não esse Mourão aí. Eu casei, casei errado. Agora não tem mais como voltar atrás", disse.
O deputado Luiz Phillipe é sobrinho de Luiz Gastão Maria José Pio Miguel Gabriel Rafael Gonzaga de Orléans e Bragança e Wittelsbach, o primeiro na linha sucessória brasileira.
Chefe da Casa Imperial, se fosse imperador, reinaria como Sua Majestade Imperial Dom Luiz I, Por Graça de Deus e Unânime Aclamação dos Povos, Imperador Constitucional e Defensor Perpétuo do Brasil.
Hoje com 81 anos, dom Luiz nasceu em 1938 em Mandelieu, uma região autônoma da França, um dos países de refúgio para uma parte da família imperial brasileira, exilada após a mudança de regime.
O que diz o especialista?
Para Masimo Della Justina, professor da PUC (Pontifícia Universidade Católica) no Paraná e cientista político especializado no período monárquico, os monarquistas acertam quando afirmam que dom Pedro 2º sofreu um golpe militar, mas discorda de que o Brasil vivia um tempo de estabilidade que seria restaurado com a ascensão de dom Luiz.
"O Exército se levantou contra o chefe de Estado. Quando Deodoro proclamou a República, Floriano Peixoto se recusou a comandar a resistência imperial", diz o especialista. "Não houve clamor popular."
O professor diz, no entanto, que havia certo "desencanto silencioso contra a monarquia". "Grande parte da população era analfabeta e assistiu ao golpe sem saber o que aquilo significava."
Também economista, Della Justina contesta a ideia de estabilidade social e econômica no período monárquico.
"A Guerra do Paraguai (1864-1870) endividou o Brasil, que recorreu aos banqueiros ingleses durante e depois da guerra", diz.
"Além disso, o Brasil passou por diversas revoltas no século 19", como a Guerra dos Farrapos (1835 - 1845), no Rio Grande do Sul, a Noite das Garrafadas (1831), no Rio de Janeiro, e a Cabanagem (1834-1840), no Pará.
Ele também rejeita a ideia de que a figura real traria identidade nacional. "Ao contrário do Japão ou das monarquias europeias, a brasileira tinha raiz portuguesa. O Brasil não era uma nação, mas uma mera colônia na maior parte do tempo."
Sobre o Poder Moderador e o combate à corrupção, o professor afirma que o país já conta com "poderes moderadores", como "Tribunais de Contas, Ministérios Públicos e imprensa livre". "O Brasil tem suficiência institucional para sermos uma República que funciona bem. O que precisamos é de bons indivíduos no setor público e privado."
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