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Decisões da Justiça barraram projetos de Bolsonaro em 2019; veja quais

O presidente do STF, ministro Dias Toffoli (à esq.), conversa com o presidente Jair Bolsonaro - MATEUS BONOMI/AGIF/ESTADÃO CONTEÚDO
O presidente do STF, ministro Dias Toffoli (à esq.), conversa com o presidente Jair Bolsonaro Imagem: MATEUS BONOMI/AGIF/ESTADÃO CONTEÚDO

Felipe Amorim

Do UOL, em Brasília

27/12/2019 04h00

Resumo da notícia

  • Entre derrotas mais recentes do presidente, estão volta de radares moveis e do Dpvat
  • Juízes também suspenderam nomeação de Bolsonaro para o comando da Fundação Palmares
  • Publicação de edital em jornais e leilão de petróleo em Abrolhos foram outros casos que foram parar nos tribunais

Neste ano, o presidente Jair Bolsonaro (sem partido) sofreu uma série de derrotas na Justiça em decisões que impuseram recuos a projetos do governo e derrubaram decisões administrativas.

A retirada dos radares de velocidade, demissões no grupo de combate à tortura, alterações nas demarcações indígenas e revogação de projetos LGBT foram algumas das medidas barradas por decisões da Justiça Federal de primeira instância ou em julgamentos do STF (Supremo Tribunal Federal).

Veja abaixo as principais decisões da Justiça que barraram ações do governo Bolsonaro.

Radares de velocidade

Depois de Bolsonaro anunciar que iria suspender o uso de radares de velocidade nas estradas federais, duas decisões judiciais colocaram um freio à intenção do presidente.

O presidente anunciou em março a intenção de retirar os radares das rodovias federais —"Não teremos mais lombadas eletrônicas. Elas não serão renovadas", disse — e o cancelamento da instalação de 8 mil equipamentos nas estradas. Mas a juíza Diana Wanderley, da 5ª Vara Federal em Brasília, proibiu a retirada dos radares e determinou que o governo renove por 60 dias contratos que estejam perto de expirar.

A decisão, de abril, atendeu a um pedido do senador Fabiano Contarato (Rede-ES), que ajuizou uma ação popular contra a medida.

A ação contou com o apoio do MPF (Ministério Público Federal) e levou a um acordo judicial com o governo, fechado em julho, para a instalação nas rodovias de 1.140 radares fixos, os chamados pardais.

Apesar do acordo judicial para manter os radares fixos, os radares móveis permaneceram na mira de Bolsonaro. Em agosto, o presidente determinou a suspensão do uso de equipamentos móveis em rodovias federais, em decisão publicada no Diário Oficial da União.

A medida, no entanto, foi suspensa pelo juiz Marcelo Gentil Monteiro, da 1ª Vara da Justiça Federal de Brasília, atendendo a pedido do MPF (Ministério Público Federal). A decisão foi confirmada em segunda instância pelo TRF (Tribunal Regional Federal), que negou o recurso do governo.

Diferentemente dos radares fixos, também conhecidos como pardais ou lombadas eletrônicas, os radares móveis podem ser operados sobre um suporte temporário, de dentro de veículos ou manualmente por agentes de fiscalização.

Especialistas em segurança do trânsito dizem que a consequência de tirar ou diminuir radares de velocidade nas estradas federais será o aumento do número de mortos em acidentes. Reportagem da Folha de S.Paulo mostrou que o número de mortes nas estradas brasileiras caiu 21,7% nos trechos de rodovias federais em que há radares depois da instalação dos equipamentos.

Bolsonaro tem sido um crítico da fiscalização eletrônica da velocidade. "Estou com uma briga juntamente com o Tarcísio [de Freitas, ministro da Infraestrutura] na Justiça para acabarmos com os pardais no Brasil, essa máfia de multas, que vai para o bolso de alguns poucos nessa nação. É uma roubalheira", disse o presidente, em agosto.

A família Bolsonaro já foi alvo recorrente da fiscalização. Reportagem da Folha publicada em abril mostrou que o presidente, três de seus filhos e sua mulher, Michelle, receberam ao menos 44 multas de trânsito nos últimos cinco anos, segundo registros do Detran-RJ (Departamento de Trânsito do Rio de Janeiro).

Fim do DPVAT

Em decisão do último dia 19, o STF suspendeu a medida provisória editada por Bolsonaro que extinguia o DPVAT, seguro obrigatório de veículos.

Bolsonaro justificou o fim do seguro sob o argumento de que havia altos índices de fraudes e elevados custos operacionais. O DPVAT foi criado em 1974. A decisão, porém, atingiria os negócios do presidente do PSL, deputado Luciano Bivar (PE), atual desafeto do presidente.

Bivar é o controlador e presidente do conselho de administração da seguradora Excelsior, empresa é credenciada pelo governo para cobertura do seguro DPVAT.

Em dez anos, o seguro foi responsável pela indenização de mais de 4,5 milhões de acidentados no trânsito brasileiro (485 mil desses casos foram fatais). Além de indenizações por mortes, o seguro também cobre gastos hospitalares e sequelas permanentes.

Alterações em conselho

O ministro do STF Luís Roberto Barroso suspendeu parte do decreto presidencial que promoveu alterações no Conanda (Conselho Nacional dos Direitos da Criança e do Adolescente). Em setembro, as alterações promovidas pelo governo Bolsonaro foram questionadas pela então procuradora-geral da República, Raquel Dodge.

Pela decisão do ministro, o mandato dos conselheiros deverá ser preservado até o término, a eleição dos representantes das entidades da sociedade civil deverá ser realizada por meio de assembleia específica e disciplinada pelo regimento interno e deverá ser garantido o custeio dos deslocamento dos conselheiros que não moram em Brasília.

Fundação Palmares

Também foi barrada pela Justiça a nomeação do jornalista Sérgio Nascimento de Camargo, escolhido por Bolsonaro para comandar a Fundação Palmares, órgão responsável por promover a cultura afro-brasileira.

A decisão do juiz Emanuel José Matias Guerra, da 18ª Vara Federal do Ceará, atendeu à ação movida por um advogado por causa das declarações de Camargo que questionavam algumas das principais políticas de valorização da população negra, como o Dia da Consciência Negra e a política de cotas.

Em seu Twitter, Bolsonaro afirmou que se conseguir derrubar a decisão judicial Camargo será reconduzido ao cargo. "O afastamento de Sérgio Camargo da Fundação Cultural Palmares se deu por causa de decisão judicial. Caso nosso recurso seja vitorioso, eu o reconduzirei à presidência da Fundação."

Edital LGBT da Ancine

Em outubro, a Justiça Federal determinou que a Ancine (Agência Nacional do Audiovisual) retome um edital para TVs Públicas que foi censurado por conter conteúdo LGBT.

O concurso estava na última fase quando foi suspenso por seis meses, prorrogáveis por outros seis meses, por ato do Ministro da Cidadania, Osmar Terra.

A suspensão ocorreu seis dias depois de o presidente Jair Bolsonaro criticar quatro produções com temática LGBT que estavam disputando o edital nas categorias "diversidade de gênero" e "sexualidade", durante uma transmissão ao vivo em seu perfil nas redes sociais.

A decisão de suspender o edital levou a uma ação do MPF (Ministério Público Federal) por improbidade administrativa contra Terra. O Ministério da Cidadania nega censura e diz que a suspensão do edital foi feita dentro da lei.

Demarcações da Funai

Em agosto, o STF decidiu manter na Funai (Fundação Nacional do Índio) a atribuição para demarcar terras indígenas.

O julgamento contrariou a intenção do governo Bolsonaro de transferir as demarcações para o Ministério da Agricultura.

A retirada de poderes da Funai foi alvo de duas medidas provisórias publicadas por Bolsonaro em 2019. A primeira foi alterada pelo Congresso Nacional para manter com a Funai a demarcação das terras indígenas. A segunda medida provisória, publicada após os parlamentares contrariarem os planos do presidente, foi o alvo da decisão do STF que suspendeu a mudança.

O principal argumento para barrar a transferência das demarcações foi o de que o presidente da República não pode editar duas vezes no mesmo ano legislativo medidas provisórias tratando do mesmo tema, pois isso é proibido pela Constituição Federal.

Extinção de conselhos

O primeiro revés do governo no STF ocorreu em junho, quando os ministros do Supremo colocaram limites ao decreto presidencial que previa a extinção de uma série de órgãos colegiados da administração federal, como conselhos, comitês e comissões, muitos deles com participação de representantes da sociedade.

O STF definiu que o governo não poderia extinguir por meio de decreto aquelas comissões que foram criadas por lei aprovada no Congresso Nacional. Dessa forma, apenas conselhos que também foram criados por decreto, ou outra norma infralegal, podem ser extintos por decreto do presidente da República.

A extinção dos conselhos foi criticada por especialistas da ONU (Organização das Nações Unidas) em carta enviada ao Planalto. Eles afirmam que a medida reduz a participação social no governo e é prejudicial à democracia.

Publicação de edital em jornais

O ministro do STF Gilmar Mendes suspendeu, em outubro, a eficácia da medida provisória publicada por Bolsonaro que dispensou os órgãos governamentais de publicar em jornais de grande circulação os editais de licitação, tomadas de preços, concursos e leilões da administração pública.

A suspensão da medida vale até que o Congresso Nacional analise a medida provisória, votando por sua aprovação ou rejeição. O prazo de vigência dessa medida provisória se encerra em 16 fevereiro e, se não for aprovada até essa data, ela perde a validade.

A decisão de Gilmar Mendes foi tomada em ação apresentada pela Rede. O partido alegou que a medida tinha o objetivo de "desestabilizar uma imprensa livre e impedir a manutenção de critérios basilares de transparência e ampla participação no âmbito das licitações".

O Palácio do Planalto defende que a publicação de editais, concursos e leilões em jornais de grande circulação representa um gasto adicional e injustificado aos cofres públicos, "cuja situação de desequilíbrio fiscal é amplamente conhecida".

Leilão de petróleo em Abrolhos

A Justiça Federal colocou ressalvas ao leilão de blocos de exploração de petróleo próximos à reserva natural do parque marinho de Abrolhos, no sul da Bahia.

A juíza federal Milena Souza de Almeida Pires, da 3ª Vara da Justiça Federal da Bahia, determinou que o leilão ocorresse com a indicação de que os blocos próximos a Abrolhos seriam leiloados sub judice. Ou seja, a futura exploração dos blocos estaria na prática submetida ao crivo do Judiciário, que ainda não concluiu a análise da ação judicial apresentada pelo MPF (Ministério Público Federal) que alega existirem riscos ambientais na produção de petróleo nessa área.

Após a decisão, os sete blocos marítimos da região não receberam nenhuma oferta das empresas que participaram do leilão. As medidas judiciais e a insegurança quanto a aspectos ambientais parecem ter afastado possíveis interessados.

O arquipélago de Abrolhos tem a maior biodiversidade do Atlântico Sul e compõe o primeiro parque marinho do Brasil. É o principal berçário das baleias jubarte e abriga importantes áreas de reprodução e alimentação de aves e tartarugas marinhas.

No primeiro semestre, o presidente do Ibama, Eduardo Fortunato Bim, decidiu liberar a exploração de petróleo na área, rejeitando um parecer do próprio órgão. A medida foi contestada por uma ação do MPF, que considerou ilegal o ato do dirigente.