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Abraji e OAB: Agressão é incompatível com equilíbrio esperado de presidente

O presidente Jair Bolsonaro durante o hasteamento da bandeira no Palácio da Alvorada em Brasília  - Frederico Brasil/Futura Press/Estadão Conteúdo
O presidente Jair Bolsonaro durante o hasteamento da bandeira no Palácio da Alvorada em Brasília Imagem: Frederico Brasil/Futura Press/Estadão Conteúdo

Carolina Marins

Do UOL, em São Paulo

18/02/2020 15h07

Entidades de imprensa repudiaram hoje a fala do presidente Jair Bolsonaro (sem partido), na qual insultou a repórter Patrícia Campos Mello, da Folha de S.Paulo, ao fazer insinuação sexual. "Ela queria um furo. Ela queria dar o furo a qualquer preço contra mim", disse o mandatário.

As declarações de Bolsonaro foram dadas hoje de manhã, em frente ao Palácio da Alvorada. O presidente comentava o episódio em que Hans River, ex-funcionário de uma agência de disparos de mensagens em massa por WhatsApp, mentiu à CPMI das Fake News no Congresso dizendo que a repórter queria "um determinado tipo de matéria a troco de sexo". O depoimento foi dado na semana passada.

Em nota conjunta, a Abraji (Associação Brasileira de Jornalismo Investigativo) e o Observatório da Liberdade de Imprensa da OAB (Ordem dos Advogados do Brasil) se solidarizaram com a jornalista e repudiaram a fala. "A Abraji e a OAB repudiam veementemente a fala do presidente. O desrespeito pela imprensa se revela no ataque a jornalistas no exercício de sua profissão", diz.

"Com sua mais recente declaração, Bolsonaro repete as alegações que a Folha já demonstrou serem falsas. Na mesma entrevista, Bolsonaro chegou a dizer aos repórteres que deveriam aprender a interpretar textos, assim ofendendo todos os profissionais brasileiros, não apenas a repórter da Folha. As declarações foram transmitidas ao vivo na página de Bolsonaro no Facebook".

E finaliza: "Os ataques aos jornalistas empreendidos pelo presidente são incompatíveis com os princípios da democracia, cuja saúde depende da livre circulação de informações e da fiscalização das autoridades pelos cidadãos.

As agressões cotidianas aos repórteres que buscam esclarecer os fatos em nome da sociedade são incompatíveis com o equilíbrio esperado de um presidente
Abraji e OAB

A ABI (Associação Brasileira de Imprensa) também condenou a fala e disse que Bolsonaro "agrediu de forma covarde" a jornalista. "Este comportamento misógino desmerece o cargo de Presidente da República e afronta a Constituição Federal. O que temos visto e ouvido, quase cotidianamente, não se trata de uma questão política ou ideológica", diz em nota.

Cada dia mais, fica patente que o presidente precisa, urgentemente, de buscar um tratamento terapêutico
ABI

A Aner (Associação Nacional de Editores de Revistas) e a ANJ (Associação Nacional de Jornais) chamou de "lamentáveis" as declarações do presidente. "As insinuações do presidente buscam desqualificar o livre exercício do jornalismo e confundir a opinião pública. Como infelizmente tem acontecido reiteradas vezes, o presidente se aproveita da presença de uma claque para atacar jornalistas, cujo trabalho é essencial para a sociedade e a preservação da democracia".

A Folha de S.Paulo também se manifestou sobre o episódio. "O presidente da República agride a repórter Patrícia Campos Mello e todo o jornalismo profissional com a sua atitude. Vilipendia também a dignidade, a honra e o decoro que a lei exige do exercício da Presidência", escreveu.

Não há quebra de decoro

O advogado constitucionalista Marcellus Ferreira Pinto disse em entrevista ao UOL que não há quebra de decoro ou ofensa na fala de Bolsonaro, já que é uma insinuação e não um ataque direto. "Nesse caso, especificamente, não vejo nenhum conteúdo na fala do presidente que possa ser atribuído como sendo um assédio de natureza sexual", disse.

"Parece que essa expressão 'dar o furo' de fato pode gerar um duplo entendimento. Dar o furo em meios mais machistas, pode representar uma outra situação. Mas me parece aqui que ele queria se referir ao furo de reportagem, que é uma linguagem do jornalismo".

Segundo o advogado, quem se sentir ofendido por uma fala sempre pode entrar com processo na justiça por crimes contra a honra, como calúnia e injúria. Porém, por se tratar de um presidente da República, o caso só seria julgado após o fim do mandato.