Bolsonaro pede pacto nacional pela preservação da vida e dos empregos
O presidente Jair Bolsonaro (sem partido) defendeu, na noite de hoje, a necessidade de um pacto nacional pela preservação "da vida e dos empregos". A fala foi em pronunciamento em rádio e televisão para todo o país.
"O efeito colateral das medidas de combate ao coronavírus não pode ser pior que a própria doença. A minha obrigação como presidente vai para além dos próximos meses. Preparar o Brasil para sua retomada, reorganizar nossa economia e mobilizar todos nossos recursos e energia para tornar o Brasil ainda mais forte após a pandemia", declarou o presidente durante o pronunciamento.
Bolsonaro afirmou preocupação com a área econômica e disse que, apesar do temor diante das questões de saúde, com a quantidade de casos confirmados e número de mortos pela covid-19 aumentando, o país deve "evitar a destruição de empregos". Novamente ele mencionou uma frase do diretor-presidente da OMS fora de contexto para justificar o fim do isolamento social.
"Com esse mesmo espírito, agradeço e reafirmo a importância da colaboração e a necessária união de todos, num grande pacto pela preservação da vida e dos empregos. Parlamento, Judiciário, governadores, prefeitos e sociedade", disse.
Hoje o Brasil bateu o recorde de mortes em 24 horas. Foram 42 mortes de ontem para hoje, totalizando 201. Ontem o país já tinha batido um recorde, com 23 mortes. No total, são 5.717 casos oficiais confirmados no país — 1.138 diagnósticos confirmados em um dia — e 3,5% de letalidade, informou o ministério.
Presidente oculta fala de diretor da OMS
Hoje de manhã, o presidente distorceu uma entrevista do diretor-presidente da OMS (Organização Mundial da Saúde), Tedros Ghebreyesus, na qual ele dizia que os trabalhadores "precisam trabalhar para ter o pão de cada dia". Após essa frase, o diretor ainda disse que os governos deveriam garantir que todos cumprissem o isolamento social.
Tirando a declaração do contexto, Bolsonaro insinuou que a entidade estaria alinhada às críticas ao isolamento social e disse que, Tedros, por ser africano, "sabe o que é passar dificuldade".
A entidade respondeu em duas publicações em redes sociais, mas sem citar Bolsonaro diretamente. Ele escreveu que pessoas "sem salários regulares ou poupanças merecem políticas sociais que garantam dignidade e permitam a elas adotar medidas contra a covid-19 seguindo orientações de saúde da OMS e de autoridades locais".
Último pronunciamento
Na terça passada, Bolsonaro fez um pronunciamento em rede nacional no qual chamou a covid-19 de "gripezinha" e acusou a imprensa de espalhar pânico. Bolsonaro também criticou governadores por determinarem quarentena — com fechamento de comércio e fronteiras — e questionou o motivo pelo qual escolas foram fechadas.
O pronunciamento foi criticado por políticos, autoridades em saúde, especialistas e pela imprensa internacional, por ir na contramão das recomendações da Organização Mundial da Saúde. Desde então, Bolsonaro tem defendido o isolamento vertical, no qual apenas os grupos de risco e os infectados ficariam afastados do trabalhado e as demais pessoas voltariam às suas vidas normais.
Crise econômica e defesa do isolamento vertical
Bolsonaro defende o isolamento vertical alegando que a quarentena para todos trará danos à economia, porém em reuniões com secretários estaduais, autoridades federais admitiram que não há um estudo para justificar este pensamento. Segundo um estudo feito por nos Estados Unidos e na Alemanha, o fim do isolamento não impediria a recessão econômica. Segundo os pesquisadores, o confinamento de fato aumenta o impacto na recessão econômica, mas tem o potencial de evitar 500 mil mortes só nos Estados Unidos.
Na sexta-feira, o presidente voltou a pedir que os brasileiros voltem ao trabalho e disse não acreditar no número de mortos em São Paulo, estado que concentra os maiores casos. Ele acusou os governadores que estão implantando a quarentena de estarem tentando desestimular os investimentos no país.
"Alguns vão morrer, vão morrer, lamento, é a vida. Não pode parar uma fábrica de automóveis porque tem mortes no trânsito", disse durante entrevista ao Brasil Urgente.
O próprio ministro da Saúde, Luiz Henrique Mandetta, tem defendido o isolamento social completo — embora tenha amenizado esse discurso logo após o pronunciamento do presidente. Hoje ele reforçou a orientação de que as pessoas mantenham medidas de isolamento social como forma de retardar a velocidade de transmissão do novo coronavírus no país.
O isolamento vertical defendido por Bolsonaro não tem embasamento científico e é alvo de críticas de entidades médicas. Especialistas ouvidos pelo UOL já disseram que este tipo de isolamento pode não funcionar no Brasil, pois não há testes para todos, portanto não há como saber quem está contaminado ou não. Entidades como a Sociedade Brasileira de Infectologia e Fiocruz demonstração preocupação com a fala e reforçaram que apenas o isolamento horizontal funcionaria para retardar as contaminações.
Passeio no DF e isolamento político
Ontem Bolsonaro mais uma vez contrariou as orientações mundiais em saúde ao sair para "falar com o povo" e passar pelo Distrito Federal pelas regiões de Ceilândia, Taguatinga e Sobradinho. Hoje, ele demonstrou irritação com as críticas: "Não fui passear, não", disse hoje ao deixar o Palácio da Alvorada. Segundo Bolsonaro, "não é apenas a questão de vida, é a questão da economia e do emprego também".
Além de contrariar as orientações públicas do Ministério da Saúde, Bolsonaro tem dito a auxiliares que está de "saco cheio" de Luiz Henrique Mandetta, chefe da pasta. Ele só não o demitiu até agora para evitar agudizar a crise provocada pela pandemia do novo coronavírus.
O clima com os governadores também segue tenso no início de semana. João Doria (PSDB-SP) afirmou: "Não sigam as orientações do presidente. Ele não orienta corretamente e não lidera no combate ao corona e na preservação à vida". Já o governador do Rio de Janeiro, Wilson Witzel (PSC), disse que Bolsonaro pode ser acusado de crimes contra a humanidade por desrespeitar reiteradamente as determinações sanitárias no combate à covid-19.
Presidente é alvo de notícia-crime
Na segunda-feira, o ministro do STF (Supremo Tribunal Federal) Marco Aurélio Mello determinou que a PGR (Procuradoria-Geral da República) analise uma notícia-crime apresentada contra Bolsonaro para que a "conduta irresponsável e tenebrosa e criminosa" que ele tem adotado "não continue a colocar em risco a saúde de todos os cidadãos brasileiros". Segundo a petição, a "conduta irresponsável e tenebrosa" de Bolsonaro incorre no crime previsto no artigo 268 do Código Penal Brasileiro, que trata de "infringir determinação do poder público, destinada a impedir introdução ou propagação de doença contagiosa" e prevê detenção de um mês a um ano, além de multa.
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