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Marco Aurélio critica "gripezinha" e diz que Bolsonaro nega a realidade

Do UOL, em São Paulo

06/05/2020 11h23Atualizada em 06/05/2020 13h37

No UOL Entrevista desta quarta-feira, o ministro do STF (Supremo Tribunal Federal) Marco Aurélio Mello fez diversas críticas a comportamentos recentes do presidente Jair Bolsonaro (sem partido), entre eles a minimização da pandemia do novo coronavírus, declarações grosseiras e apoio a atos antidemocráticos.

Em entrevista ao colunista do UOL Josias de Souza, ele elogiou a atuação do ex-ministro da Saúde, Luiz Henrique Mandetta, demitido por Bolsonaro no mês passado, e disse que "devemos" um agradecimento a ele por recomendar o isolamento social, medida considerada por autoridades de saúde como a mais efetiva para evitar a disseminação da covid-19.

Quando o presidente diz que se trata apenas de uma 'gripezinha', ele evidentemente não reconhece a realidade e, de certa forma, influencia certos segmentos. Vejo e ouvi de um integrante do Ministério da Saúde que não chegamos ao pico. Que teremos esse pico somente em junho e julho. As pessoas hoje já estão baixando a guarda, já não estão mantendo a cautela que deveriam manter.

"Arroubo de retórica" do presidente

O ministro ainda classificou como "um arroubo de retórica indevido" a fala do presidente, que disse recentemente "eu sou a Constituição".

"O pessoal geralmente conspira para chegar ao poder. Eu já estou no poder. Eu já sou o presidente da República", disse Bolsonaro no dia 20 de abril, que, em outro momento, afirmou: "Eu sou, realmente, a Constituição".

"A leitura foi péssima", analisou Marco Aurélio. "Eu sou um dos guardas da Constituição, mas não posso dizer que sou a Constituição. Ela é um documento abstrato com concretude maior. Foi um arroubo de retórica indevido feito pelo presidente."

Participação em atos antidemocráticos

Questionado sobre a participação de Bolsonaro em ao menos duas manifestações cujas bandeiras eram o fechamento do Congresso e do STF, Marco Aurélio afirmou que falta "temperança" ao presidente.

A sinalização em si não é boa, quando o presidente da República se engaja numa manifestação contra instituições que devem ser, na República, perenes, como são o congresso nacional e o próprio STF. Creio que está na hora de ter uma temperança maior, perceber-se que atos são vistos e têm reflexos na vida nacional. E que acabam gerando uma insegurança jurídica muito grande para a sociedade.

Ele ainda minimizou a declaração de Bolsonaro, dada no último domingo, de que as Forças Armadas estavam apoiando o governo.

"Não passa na minha cabeça o engajamento das Forças Armadas, considerado o governo atual ou futuro. As Forças Armadas existem para nos proporcionar segurança", declarou Marco Aurélio, que ainda avaliou da presença de militares no ministério do governo Bolsonaro.

"O presidente esteve na caserna e ele concluiu que poderia arregimentar valores nas Forças Armadas, mas de início deve haver a separação entre a área civil e a área militar propriamente dita. Eu não vejo a necessidade de ter-se militares, e militares de alta patente, no Palácio do Planalto, mas foi uma escolha livre do presidente da República."

Conversas em frente ao Alvorada

Marco Aurélio ainda questionou o comportamento de Bolsonaro de parar diariamente na porta do Palácio do Alvorada para conversas com populares e, muitas vezes, atacar a imprensa de maneira grosseira durante esses encontros. Ontem, o presidente chegou a mandar um jornalista a calar a boca duas vezes.

É muito ruim, o desgaste é enorme para o presidente. E há muito tempo eu não vejo o porta-voz do presidente. Algo que não compreendo é que, ao sair do Palácio, ele determine que o veículo pare para papear com as pessoas que ficam ali aguardando a saída dele. É esse descompasso que temos notado no dia a dia e o de ontem foi de uma agressividade ímpar.

"O presidente da República não pode estar na linha de frente. Para isso, tem auxiliares e os ministros em si. Para falar à sociedade, tem um porta-voz, para manter contato com jornalistas. O desgaste em termos de envergadura da cadeira é muito grande quando o presidente se sente um popular e que confraternizar com a mesma emoção com esses populares."