País vive escalada autoritária com ataques à imprensa, dizem parlamentares
O Brasil vive uma escalada autoritária com os frequentes ataques à imprensa ao longo do governo do presidente Jair Bolsonaro (sem partido), afirmaram hoje líderes da oposição no Congresso Nacional.
A Associação Brasileira de Imprensa (ABI), Associação Brasileira de Jornalismo Investigativo (Abraji) e a Federação Nacional de Jornalistas (Fenaj) promoveram um ato virtual em defesa da democracia e da imprensa livre.
No encontro, parlamentares e jornalistas ressaltaram a importância do trabalho da imprensa sem ameaças ou incentivos a ofensas por parte do governo e de seus apoiadores para o reforço permanente da democracia em um país. Dentre os partidos, participaram representantes do PSB, PDT, PT, PSOL, Rede, Cidadania e PCdoB.
O líder da minoria no Senado, senador Randolfe Rodrigues (Rede-AP), afirmou que um dos indicativos mais fortes da instalação de um regime autoritário é a violência contra a liberdade de imprensa.
"Não se tem conhecimento, a não ser nos períodos de ascensão [autoritária] de nossa história, que a imprensa tenha sido tão ofendida e agredida", falou.
O líder da minoria na Câmara, deputado José Guimarães (PT-CE), ressaltou que a imprensa livre é um dos principais elementos do Estado democrático de Direito.
"Sobre isso não podemos tergiversar. A democracia brasileira corre risco. Há um governo com escalada fascista que pode interditar tudo o que construímos ao longo do fim da ditadura militar até os dias atuais", ponderou.
A presidente da Fenaj, Maria José Braga, informou que a violência contra profissionais da imprensa cresceu 54% em 2019 em comparação com 2018, segundo dados compilados pela federação e por sindicatos de jornalistas de todo o Brasil. De janeiro a abril deste ano, Bolsonaro fez 179 ataques à categoria, disse.
"O mais grave é que cresceu em razão de uma institucionalização desta violência por meio da Presidência da República. O presidente do país foi responsável sozinho por cerca de 58% dos ataques desferidos genericamente à imprensa e a jornalistas em particular", falou.
A líder do PSOL na Câmara, deputada Fernanda Melchionna (RS), lamentou a morte de mais de 30 mil brasileiros em decorrência do coronavírus e avaliou que o autoritarismo também deve ser considerado uma espécie de vírus no Brasil a ser derrotado.
Ela declarou que autoritários tentam suprimir as liberdades previstas na Constituição de 1988 e atacam a imprensa como parte da tentativa de atacar a livre expressão da população. A deputada ainda pediu uma reação a essa escalada mais organizada.
"Nossa luta pela liberdade de imprensa passa obviamente por derrotar esse autoritarismo", afirmou.
O líder da oposição na Câmara, deputado André Figueiredo (PDT-CE), criticou a ida de Jair Bolsonaro a manifestações que pedem o fechamento do Congresso Nacional e do STF (Supremo Tribunal Federal), assim como atitudes de retaliação à imprensa. Para ele, as agressões aos jornalistas são um reflexo de uma postura "inconsequente e irresponsável" do presidente.
No final de maio, diversos veículos de comunicação decidiram suspender de forma temporária a cobertura presencial na portaria do Palácio da Alvorada devido à falta de segurança para jornalistas e cinegrafistas no local. Apoiadores de Bolsonaro costumam xingar e ameaçar a imprensa, sem serem repreendidos por agentes de segurança da Presidência com o devido rigor.
No Alvorada, Bolsonaro já falou para repórter "calar a boca" ao ouvir questionamentos de interesse público, mas dos quais não gostou, e nada fez ao ver gritos de apoiadores a jornalistas. O receio é que hoje não há segurança caso apoiadores partam para agressões físicas.
O chefe da sucursal do UOL em Brasília, Tales Faria, lembrou não ser por acaso que distopias, como 1984 de George Orwell, apontam que o primeiro ataque que as ditaduras fazem é à comunicação mudando o sentido dos fatos e impedindo o livre trânsito da informação.
"O domínio da informação é o poder e vai ser cada vez mais. Daí porque que a função do jornalista é uma das mais nobres que conheço. Distribuímos renda, porque distribuímos informação. [...] Estamos em um momento de impasse, porque temos um presidente da República agredindo seguidamente a imprensa e os jornalistas", declarou.
Na avaliação do presidente da Abraji, Marcelo Träsel, a escalada autoritária se reflete em uma perseguição a jornalistas por ser papel da imprensa fazer denúncias e impedir o uso oportunista do Estado para fins antidemocráticos.
Ele ressaltou que em momento algum o presidente da República condenou as agressões físicas e o assédio contra jornalistas na internet.
"O discurso injurioso que o presidente, seus ministros e outros membros do alto escalão do governo costumam propalar diariamente é inaceitável numa democracia. Portanto, ao não condenar essas atitudes por parte de sua militância e, pelo contrário, ao reiterar o discurso hostil contra a imprensa, o presidente Jair Bolsonaro se torna corresponsável pelas agressões, assédio e pelo clima de intimidação sobre o qual os repórteres trabalham hoje em dia no Brasil", disse.
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