Fachin vota pela continuidade do inquérito das fake news, mas com limites
O ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) Edson Fachin votou a favor da continuidade do inquérito das fake news, que apura ataques e ofensas a integrantes da corte, mas pediu algumas mudanças na forma como a investigação está sendo feita.
Em julgamento hoje, ele disse ser constitucional a portaria que abriu a apuração — decidida pelo presidente do Supremo, ministro Dias Toffoli, e não pelo Ministério Público — e que também não há ilegalidade na escolha de Alexandre de Moraes como relator do caso — o que é objeto de crítica por parte de políticos e juristas.
Único ministro a manifestar seu voto nesta quarta, Fachin também afirmou que "é inadmissível a defesa da ditadura e do fechamento do Congresso ou do Supremo". O julgamento será retomado na sessão do dia 17 de junho.
Segundo o magistrado, é preciso que o inquérito das fake news siga uma série de seguintes parâmetros, inclusive manter a investigação de disparos em massa de mensagens produzidas e difundidas com financiamento empresarial.
Fachin também propôs que haja acompanhamento das investigações pelo Ministério Público, que o objeto da apuração seja limitado — demandas do procurador-geral da República, Augusto Aras — e que os advogados dos investigados tenham acesso ao inquérito — uma queixa dos alvos do STF.
Fachin disse ainda ser preciso observar a proteção à liberdade de imprensa, excluindo do objeto do inquérito reportagens jornalísticas e manifestações particulares de pessoas na internet, inclusive com anonimato. No entanto, segundo ele, deveriam ser investigadas essas mensagens quando integram "esquemas de financiamento e divulgação em massa" nas redes sociais.
Políticos, blogueiros, empresários e apoiadores do presidente da República, Jair Bolsonaro (sem partido), que foram alvo de uma operação da Polícia Federal no dia 27 de maio, são suspeitos de integrar o esquema de disseminação de notícias falsas e ataques aos integrantes da corte — alguns deles haviam estado com o presidente dias antes de entrarem na mira do tribunal.
Há intenção de "dinamitar instituições", diz Fachin
Na avaliação de Fachin, a intenção das ameaças aos ministros é "dinamitar instituições" e por isso, disse, decidiu manter a validade das investigações.
"Diante do intento de dinamitar instituições, do incitamento do fechamento do Supremo Tribunal Federal, de ameaça de morte ou de prisão de seus membros, de apregoada desobediência a decisões judiciais, proponho o julgamento improcedente do pedido nos termos expressos", afirmou.
A ação em julgamento nesta quarta-feira foi aberta pelo partido Rede Sustentabilidade. A sigla questionou a constitucionalidade da portaria que ordenou o início da investigação do inquérito, feita pelo presidente do STF, Dias Toffoli, em março do ano passado. E ele mesmo escolheu Moraes como relator, sem usar o sistema de distribuição eletrônica do órgão.
Fachin, porém, argumentou que o STF pode agir quando há "inércia ou omissão" dos órgãos de controle. Afirmou ainda que a distribuição do caso até poderia ter sido feita por sorteio eletrônico, mas que o regimento da corte não proíbe a delegação feita por Toffoli.
Fachin comparou o relator do inquérito, Alexandre de Moraes, aos juízes instrutores dos gabinetes, magistrados que auxiliam o trabalho realizando tarefas, como audiências. Segundo ele, o próprio presidente do STF poderia relatar o caso, mas preferiu delegar a outro ministro.
Defesa da ditadura é inadmissível, diz Fachin
Em seu voto, Fachin disse que "não há liberdade de expressão que ampare" a defesa da volta da ditadura militar, o fim da democracia e o fechamento do STF e do Congresso, como vem ocorrendo em manifestações de apoiadores de Bolsonaro.
"Quem pratica esses atos precisa saber que enfrentará a Justiça constitucional do seu país. Precisa saber que este Supremo não os tolerará, não há direito e não há princípios que possam ser invocados para que se autorize transigir com a prevalência dos direitos fundamentais", afirmou.
Ele ainda disse que só o Judiciário interpreta a Constituição. "Não há no texto constitucional qualquer norma que autorize outro Poder ou instituição a última palavra sobre e a Constituição Federal, que cabe ao Judiciário. A espada sem a justiça é o arbítrio"
Inquérito deve ter "balizas", diz PGR
Durante o julgamento, o procurador-geral da República, Augusto Aras, voltou a defender a continuidade do inquérito das fake news no Supremo, mas pediu que o tribunal "estabeleça balizas" na investigação.
"Precisamos de balizas para que o objeto do inquérito das fake news não seja um objeto caminhante, não seja um objeto em que caibam todas e quaisquer pessoas", disse Aras
Diferentemente de sua antecessora Raquel Dodge, que pediu o arquivamento do inquérito, Aras diz não ver inconstitucionalidade na forma como a investigação foi aberta — sem provocação da PGR — mas quer que o Ministério Público Federal tenha participação em sua condução. Segundo ele, "medidas de ordem invasiva", como prisões preventivas e ações de busca e apreensão da Polícia Federal, devem ser enviadas antes à Procuradoria para que o órgão possa se manifestar.
Governo defende liberdade de expressão
O advogado-geral da União, José Mello Júnior, também defendeu a legalidade do inquérito das fake news, mas enfatizou a defesa da liberdade de expressão em redes sociais de pessoas que não são jornalistas profissionais — caso daqueles que foram alvos de busca e apreensão pela Polícia Federal e eram militantes bolsonaristas.
Mello disse que a que a democracia exige "fontes alternativas" de informação, além dos meios de comunicação tradicionais e as redes sociais, "sendo elas jornalistas profissionais ou não".
"Inclui as redes sociais e os protagonistas espontâneos", disse o advogado-geral da União. O inquérito diz que parte das publicações em redes sociais é feita de maneira empresarial, por robôs e softwares.
Ao final, Mello pediu que o inquérito respeite princípios, entre os quais o de não criminalizar a liberdade de expressão e de imprensa, "inclusive e em especial na internet". Para ele, na dúvida entre uma informação falsa e o legítimo direito à liberdade de expressão, deve-se valorizar o segundo.
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