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Justiça manda Fundação retirar texto que cita Zumbi como dono de escravos

Logo da Fundação Palmares - Reprodução/Facebook
Logo da Fundação Palmares Imagem: Reprodução/Facebook

Alex Tajra

Do UOL, em São Paulo

31/07/2020 16h55

A 9ª Vara Federal Cível da SJDF (Seção Judiciária do Distrito Federal) determinou hoje que o site da Fundação Palmares retire do ar um texto com o título "Então... Zumbi tinha escravos? Ainda Bem!", assinado por Luiz Gustavo dos Santos Chrispino. A decisão foi do juiz Renato Coelho Borelli, e impõe multa diária de R$ 1.000 caso a fundação não cumpra a decisão.

O texto alvo da decisão de hoje diz que Zumbi dos Palmares foi alçado ao posto de figura de resistência do movimento negro brasileiro pela "historiografia marxista". Segundo o juiz, não cabe à Justiça entrar em debates acadêmicos, mas a publicação do texto reflete em "explícita desconsideração da raça, cultura e consciência pretas".

Borelli argumenta ainda que a atuação da Fundação Palmares "se desvirtuou" de suas finalidades legais, o que consiste em abuso de poder sob a forma de "desvio de finalidade". O magistrado defendeu também que a retirada do texto não põe em risco a liberdade de expressão, posto que a remoção se dá em um site institucional de uma fundação pública, e não de uma rede social ou página privada.

"(...) A permanência do artigo questionado no sítio institucional da FCP ameaça o patrimônio histórico-cultural brasileiro e viola o direito à identidade, ação e memória da comunidade negra e a sua garantia a condições adequadas para a preservação, expressão e desenvolvimento de sua identidade", escreveu o juiz.

A ação popular foi ajuizada por Caio Henrique Alves de Freitas. Ele sustenta que publicações no site da Fundação Palmares "ostentam o escopo de desqualificar a figura que dá nome à instituição", e cita que outros dois textos foram removidos por conta de uma outra ação. As publicações tinham como título "Zumbi e a Consciência Negra - Existem de verdade" e "A narrativa mítica de Zumbi dos Palmares".

O texto

Na publicação alvo da Justiça, Luiz Gustavo dos Santos Chrispino, que se define como "mulato, brasileiro, jornalista e professor escolar, com muito orgulho", cita texto em que os historiadores Décio Freitas, Joel Rufino dos Santos e Clóvis Moura são classificados como "marxistas".

Para ele, Zumbi foi "um herói questionável, que no meu entender denigre a real luta do povo negro que busca, fora da política, mostrar seu real valor, mas que a massa marxista politica ligada ao movimento, quer usar para seus fins politiqueiros e esquerdizantes de uma consciência inconsciente e manipulável".

A posição de Chrispino converge com a do presidente da Fundação Palmares, Sergio Camargo. Ele é alvo de uma série de ações que contestam sua nomeação para o cargo em novembro passado. A nomeação chegou a ser suspensa pela Justiça Federal do Ceará e pelo TRF-5 (Tribunal Regional Federal da 5ª Região), mas foi revertida pelo governo.

Em suas redes sociais, Camargo defendeu que Zumbi "é herói imposto pela ideologia que a grande maioria dos brasileiros repudia". No dia 13 de maio, data na qual foi assinada a Lei Áurea, que extinguiu a escravidão no Brasil, ele homenageou a princesa Isabel e ironizou Zumbi, no que foi considerado uma provocação ao movimento negro.