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Bolsonaro desautoriza acordo de Pazuello e diz que não comprará CoronaVac

Do UOL, em São Paulo

21/10/2020 08h39Atualizada em 21/10/2020 12h59

O presidente Jair Bolsonaro (sem partido) afirmou hoje que o governo brasileiro não comprará doses da CoronaVac, vacina desenvolvida pelo laboratório chinês Sinovac em parceria com o Instituto Butantan e que tem o governo de São Paulo, comandado pelo rival político João Doria (PSDB), como principal fiador no Brasil.

A declaração desautoriza anúncio de ontem do ministro da Saúde, Eduardo Pazuello, que em reunião com governadores informou que o governo compraria 46 milhões de doses do imunizante.

Em declaração postada nas redes sociais, o presidente afirmou que não vai firmar acordo por nenhuma vacina não autorizada pela Anvisa e que o povo brasileiro não será "cobaia". Ainda chamou a CoronaVac de "vacina chinesa de João Doria".

Para o meu governo, qualquer vacina, antes de ser disponibilizada à população, deverá ser comprovada cientificamente pelo Ministério da Saúde e certificada pela Anvisa. O povo brasileiro não será cobaia de ninguém. Não se justifica um bilionário aporte financeiro num medicamento que sequer ultrapassou sua fase de testagem. Diante do exposto, minha decisão é a de não adquirir a referida vacina.
presidente Jair Bolsonaro

Antes da reunião com governadores, o Ministério da Saúde chegou a enviar um ofício ao Instituto Butatan, datado de segunda-feira (19), para confirmar a intenção de compra das vacinas. "Informo a intenção em adquirir 46 milhões de doses da referida vacina (Vacina Butatan - Sinovac/Covid-19)", diz o documento assinado por Pazuello. "Ao preço estimado de US$ 10,30 (dez dólares e trinta centavos) por dose, seguindo as especificações da vacina e o respectivo cronograma de entrega."

No fim da manhã de hoje, Bolsonaro disse que mandou cancelar o protocolo de intenções. "Não abro mão da minha autoridade", afirmou o presidente.

Brasil assinou compra da vacina de Oxford sem autorização da Anvisa

A declaração de Bolsonaro nas redes sociais contradiz os esforços do atual governo em divulgar, incentivar e produzir cloroquina, medicamento cuja eficácia nunca foi comprovada contra o coronavírus. O Exército brasileiro havia produzido até julho 3 milhões de comprimidos do medicamento. Os custos da produção, de mais de R$ 1,5 milhão, são alvo de investigação do Ministério Público de Contas e do TCU.

Além disso, apesar de dizer que não comprará vacina não autorizada pela Anvisa, em 6 de agosto, Jair Bolsonaro assinou MP (Medida Provisória) que libera R$ 1,9 bilhão para produção, compra e distribuição de 100 milhões de doses da vacina desenvolvida pela Universidade de Oxford em parceria com o laboratório Astrazeneca. No Brasil, a pesquisa sobre esse imunizante é liderada pela Fiocruz.

As vacinas da Sinovac e da Astrazeneca estão na mesma fase 3, o estágio em que são feitos testes massivos do imunizante. Nenhuma delas ainda tem eficácia comprovada nem autorização de uso pela Anvisa.

Questionado hoje por um seguidor sobre por que exigia eficácia comprovada de uma vacina se recomenda o uso da cloroquina e da hidroxicloroquina, cuja eficácia contra a covid-19 já foi negada pela OMS (Organização Mundial de Saúde), Bolsonaro respondeu: "tomava a hidroxicloroquina depois de contaminado ou não tomava nada. Simples, ninguém obrigava tomar a HCQ".

Resposta a seguidores já indicava contradição

Mais cedo, em mensagens a seguidores no Facebook que criticavam o anúncio do Ministério, Bolsonaro já afirmava que a compra não seria realizada.

"Presidente, a China é uma ditadura, não compre essa vacina, por favor. Eu só tenho 17 anos e quero ter um futuro, mas sem interferência da Ditadura chinesa", comentou um seguidor. Na sequência, Bolsonaro respondeu: "Não será comprada".

bolsonaro vacina não será comprada - Reprodução - Reprodução
bolsonaro vacina
Imagem: Reprodução

Bolsonaro também se manifestou em outra publicação, na qual o seguidor disse que o presidente traiu os eleitores ao comprar a vacina.

"Qualquer coisa publicada, sem qualquer comprovação, vira traição", respondeu Bolsonaro, afirmando que as notícias publicadas sobre a intenção de compra eram mentirosas.

bolsonaro traição 2 - Reprodução - Reprodução
bolsonaro traição 2
Imagem: Reprodução

A informação da intenção de compra foi anunciada ontem pelo Ministério da Saúde, que destacou que a compra só seria feita após um registro da Anvisa (Agência Nacional de Vigilância Sanitária), já que a vacina ainda está em fase de testes.

"Temos a expertise de todos os processos que envolvem esta logística, conquistada ao longo de 47 anos de PNI. As vacinas vão chegar aos brasileiros de todos os estados", disse ontem o general que comanda a Saúde.

Quando uma seguidora criticou o ministro da Saúde, dizendo haver "um Mandetta milico no Ministério da Saúde", Bolsonaro respondeu novamente:

Tudo será esclarecido hoje. Tenha certeza, não compraremos vacina chinesa. Bom dia
presidente Jair Bolsonaro

Muitos apoiadores de Bolsonaro criticam o acordo porque a China é um governo de esquerda. Outros reclamam porque a CoronaVac está sendo desenvolvida em parceria com o governo de São Paulo, gerido por João Doria (PSDB), adversário político de Bolsonaro.

Procurado pelo UOL, o Ministério da Saúde ainda não comentou as declarações do presidente.

Acordo

Segundo informações divulgadas ontem, os 46 milhões de doses devem ser entregues até dezembro de 2020. Destas, 6 milhões serão produzidas na China e entregues em frascos unidose; os 40 milhões restantes, em frascos multidoses, ficarão a cargo do Instituto Butantan.

O cronograma indica ainda que mais 15 milhões de frascos multidoses serão distribuídos até fevereiro de 2021. Já em junho de 2021, a previsão é que sejam entregues outros 40 milhões de frascos multidoses, todos produzidos pelo Butantan.

Além da CoronaVac, a Fiocruz (Fundação Oswaldo Cruz) deve começar, a partir de abril, a produção própria da vacina da AstraZeneca e disponibilizar ao país até 165 milhões de doses ao longo do segundo semestre de 2021.

Como a Butantan-Sinovac e a AstraZeneca-Oxford estão em etapas avançadas de produção, a previsão é que a vacinação comece em janeiro de 2021. Mas elas ainda devem ser liberadas pela Anvisa e ter eficácia e segurança garantidas, como determina o Ministério da Saúde.