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Defesa de Cury faz novo laudo; Isa Penna critica: 'Continuidade do assédio'

A deputada estadual Isa Penna (PSOL-SP), que acusa Fernando Cury (Cidadania-SP) de assédio durante sessão da Alesp em dezembro de 2020 - José Antonio Teixeira/Alesp e Divulgação
A deputada estadual Isa Penna (PSOL-SP), que acusa Fernando Cury (Cidadania-SP) de assédio durante sessão da Alesp em dezembro de 2020 Imagem: José Antonio Teixeira/Alesp e Divulgação

Juliana Arreguy

Do UOL, em São Paulo

19/02/2021 19h32

A deputada estadual Isa Penna (PSOL-SP) criticou a nova linha de defesa adotada pelo deputado Fernando Cury (Cidadania) no Conselho de Ética da Alesp (Assembleia Legislativa de São Paulo). Os advogados de Cury questionam se houve contato físico entre os dois parlamentares em uma sessão que ocorreu na Casa em dezembro passado, quando ele foi acusado de apalpar a psolista na altura dos seios.

Os advogados de Cury entregaram ontem (18) ao conselho, onde o deputado foi denunciado por assédio, um laudo assinado por perito criminal. O relatório, divulgado pela Folha de S.Paulo e obtido pelo UOL, questiona se houve o toque inapropriado após avaliação de trecho de 35 minutos da sessão legislativa em que ocorreu o episódio.

A defesa apresentada é inaceitável e reproduz o que há de pior na cultura misógina do país.
Parecer divulgado por Isa Penna após ofício da defesa de Cury ser entregue no Conselho de Ética

A argumentação da defesa é que Cury tem o costume de abraçar os colegas da Alesp e que há diferença entre o toque e o ato de apalpar. O laudo aponta que ele abraçou ou tocou dez deputados, entre eles Isa Penna, e que pode ter ocorrido um mal-entendido ocasionado pela sobreposição da imagem de quem assiste aos vídeos.

O deputado Fernando Cury tem o hábito de abraçar as pessoas, de forma inocente, sem má-fé.
Peça entregue pelos advogados de Cury ao Conselho de Ética da Alesp

Em um parecer divulgado após a manifestação da defesa de Cury, Isa Penna afirmou que as imagens apresentadas não mostram o deputado abraçando por trás nenhum outro parlamentar.

Me estarrece constatar que, ao dizer que me deu apenas um 'abraço', Cury e sua defesa dão continuidade ao assédio que sofri em dezembro.
Parecer divulgado por Isa Penna

O perito afirma que, se houve contato, ele ocorreu "sem pressão, de forma tão leve" que passou inicialmente despercebido por Isa Penna. O documento destaca que a deputada dirigiu-se a Cury do lado esquerdo, apenas quando ele surge em seu campo de visão.

Admitindo-se apenas por hipótese que houve contato da mão direita do deputado Fernando Cury, com a lateral direita da deputada Isa Penna, esse teria ocorrido sem qualquer pressão e restaria, apenas, sobre o tecido do seu traje.
Trecho de laudo pericial apresentado pela defesa de Cury na Alesp

A peça argumenta que, se Cury tivesse o hábito de assediar mulheres, já teria sido denunciado outras vezes e que nunca apresentou tal padrão de comportamento. Os advogados pedem que o Conselho de Ética ouça oito testemunhas de defesa — todas mulheres.

Segundo a assessoria do deputado, trata-se de pessoas que "conviveram com o deputado, profissional e pessoalmente, e que se dispuseram a narrar seu caráter e postura".

Isa Penna afirmou se tratar de uma "inverdade" a argumentação de que ela não reagiu no momento em que ele a encosta. Ela observou que a reação foi automática e que isso consta nas imagens filmadas pela TV Alesp.

No entanto, mesmo que eu não tivesse reagido na hora, isso não significaria que o assédio não ocorreu. Por conta da cultura de estupro, muitas mulheres no Brasil são educadas a terem medo e não reagirem a assédios, e essa é justamente a forma mais comum de culpabilização das mulheres pelo assédio sofrido: se a mulher não reagiu, o assédio não ocorreu.
Parecer divulgado por Isa Penna

A defesa aponta supostas contradições nos depoimentos de Isa Penna e menciona a atuação parlamentar de Cury na área da saúde, embora sem relação alguma com o caso, como manifestação de boa índole.

Admitindo-se que a abordagem do deputado Fernando Cury possa ter sido inadequada e inoportuna, como a feita nos demais nove deputados, ela nem de longe caracteriza o crime de importunação sexual e muito menos é carregada do dolo de assediar, essencial para que haja quebra do decoro parlamentar e, por conseguinte, infração ética-disciplinar.
Peça entregue pelos advogados de Cury ao Conselho de Ética da Alesp

"Apesar de se adequar aos parâmetros legais, a defesa feita por Delmanto Jr. [advogado de Cury] fortalece a cultura do estupro no Brasil, naturalizando como normais e corriqueiros atos que são violações do corpo das mulheres", escreveu Isa Penna.

O processo no conselho pode levar à cassação ou suspensão de Cury. O relator do caso é o deputado Emídio de Souza (PT), que deve elaborar um parecer para ser avaliado pelos outros membros do comitê.

Cury também é alvo de investigação do Ministério Público e enfrenta um processo interno no Cidadania, que pode expulsá-lo da sigla.