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'Máscara por quê?': apoiadores de Silveira atacam imprensa e ironizam covid

18.fev.2021 - Apoiadores do deputado federal Daniel Silveira foram por dois dias à sede da PF, onde ele ficou preso - Herculano Barreto Filho/UOL
18.fev.2021 - Apoiadores do deputado federal Daniel Silveira foram por dois dias à sede da PF, onde ele ficou preso Imagem: Herculano Barreto Filho/UOL

Herculano Barreto Filho

Do UOL, no Rio

19/02/2021 15h55Atualizada em 19/02/2021 21h11

Nos dois dias em que o deputado federal Daniel Silveira (PSL-RJ) ficou preso na sede da Polícia Federal do Rio, apoiadores dele ligados ao bolsonarismo protestaram contra o STF (Supremo Tribunal Federal) e fizeram provocações a jornalistas —com episódios de deboche ao uso de máscara e até um caso de ameaça após invasão a uma sala destinada à imprensa, em frente à entrada da PF.

"Alguém quer pegar covid compartilhando a comida comigo?", ironizou uma mulher, ao oferecer a refeição a apoiadores na mesma colher com que se alimentava. Um outro apoiador questionou a reportagem: "Tá de máscara, cara? Por quê?". Em meio à pandemia da covid-19, eles abriram mão do uso de máscaras na maior parte do tempo. A Câmara dos Deputados decidiu hoje manter a prisão do parlamentar.

Cerca de 20 apoiadores permaneceram durante a manhã e a tarde de ontem em frente à sede da PF, no centro do Rio, em apoio a Silveira.

Um pequeno grupo percorreu cerca de 200 km de carro de Juiz de Fora (MG) ao Rio só para participar do ato. "Viemos para dar apoio a um ato pelo direito à liberdade de expressão para manifestar a nossa indignação contra o STF por usurpar um poder que é do Legislativo. A Constituição precisa ser cumprida", disse Lis Macedo, 28, que se identificou como jornalista.

Com bandeiras do Brasil sobre os ombros e camisas com críticas ao STF, eles também levaram cartazes, erguidos sempre atrás de repórteres de TV.

Um desses casos quase acabou em agressão. Por volta das 18h30 de ontem, após a transferência do parlamentar da PF para o BEP (Batalhão Especial Prisional) da Polícia Militar, em Niterói, dois apoiadores invadiram a sala de imprensa para exibir uma faixa durante a entrada ao vivo de uma emissora de TV.

Ao ser advertido, um deles partiu aos gritos para cima de um repórter, que estava sentado, sendo contido por outros jornalistas.

Você é o quê, irmão? Qual é a sua, vacilão? Fica em casa, otário!

Apoiador de Silveira

"Sala de imprensa e as pessoas ficam entrando aqui", reclamou outro repórter. Aos gritos, o apoiador retrucou: "Eu sou imprensa, irmão! E aí? Qual é o problema? Você pode fazer o seu trabalho e eu não posso?", questionou, mesmo sem apresentar identificação vinculada a algum órgão de imprensa.

Em seguida, o apoiador foi retirado do local.

Marcelo Träsel, presidente da Abraji (Associação Brasileira de Jornalismo Investigativo), cobra a apuração aos episódios envolvendo a ameaça ao repórter e a apreensão de celulares com o parlamentar. "A Polícia Federal permitiu que militantes do congressista tivessem acesso à sala de imprensa, assim como permitiu ao detido a aquisição de telefones celulares, a comunicação com o público e outros comportamentos absurdos", criticou.

"Mesmo não tendo ocorrido qualquer tipo de agressão física, os policiais responsáveis pelo controle do local retiraram aqueles que estavam mais exaltados, garantido a segurança de todos", disse a PF, em nota emitida a pedido do UOL. A entidade informou, ainda, que estuda rever protocolos e procedimentos de segurança após o episódio.

'Aglomeração do bem pode', provocou apoiador

Os apoiadores também fizeram provocações aos jornalistas quando cinegrafistas, fotógrafos e repórteres se posicionaram em frente à sede da PF para entrevistar o advogado André Rios, após a audiência de custódia que determinou a manutenção da prisão do parlamentar.

18.fev.2021 - Manifestantes gravam reportagem em frente à sede da PF do Rio, onde Daniel Silveira ficou preso - Herculano Barreto Filho/UOL - Herculano Barreto Filho/UOL
18.fev.2021 - Manifestantes gravam reportagem em frente à sede da PF do Rio, onde Daniel Silveira ficou preso
Imagem: Herculano Barreto Filho/UOL

"Aglomeração do bem pode", ironizou um homem sem máscara com uma camisa com a frase "Supremo é o povo", que usava o celular para gravar os jornalistas. Alguns dos apoiadores que estavam sem máscara colocaram o equipamento de proteção contra a covid-19 justamente quando se aproximaram dos repórteres para filmá-los.

A maioria dos ataques era direcionada à TV Globo. Quando a equipe de reportagem tentou fazer um registro do local, os manifestantes se aproximaram aos gritos com ofensas à emissora. A equipe então buscou refúgio na sala de imprensa.

"Cala a boca, pão com mortadela"

Na quarta (17), um homem com uma das pernas imobilizadas que caminhava com o auxílio de muletas foi ao local com uma placa em homenagem à vereadora Marielle Franco, assassinada em março de 2018 —Silveira ficou conhecido ao quebrar uma dessas placas em um ato naquele ano. O homem acabou sendo agredido por um dos apoiadores de Silveira, que o rendeu com um mata-leão.

A presença de um rapaz com uma camisa de oposição ao presidente Jair Bolsonaro (sem partido) ontem também incomodou os apoiadores de Silveira. Um deles chegou a cogitar agredi-lo. "Queria ir lá e dar uma porrada nele. E depois?", questionou.

Em outro momento, um homem gritou "fora, Bolsonaro" quando passava pelo local. "Cala a boca, pão com mortadela!", "Sai daí, maconheiro!", "Tá rebolando por quê?", "Comunista é tudo psicopata", revidaram os bolsonaristas.

Apesar dos ataques à imprensa, os manifestantes buscavam atrair a atenção dos repórteres. "Gente, atenção! Aqui é um ex-promotor de Justiça! Ele tem uma fundamentação muito boa", disse um homem aos repórteres, enquanto um manifestante discursava, em frente à PF.

Os manifestantes, então, se reuniram e começaram a gritar em coro, enquanto exibiam bandeiras do Brasil: "STF, presta a atenção! A sua toga vai virar pano de chão".