"Tive que recuar", diz Isa Penna após não falar no Conselho de Ética
A deputada estadual Isa Penna (PSOL-SP) não se pronunciou na reunião de hoje do Conselho de Ética e Decoro Parlamentar da Alesp (Assembleia Legislativa do Estado de São Paulo) após pedido da defesa do deputado Fernando Cury (Cidadania). A comissão apura o caso de assédio registrado na plenária da Câmara no ano passado. "Eles pediram e eu tive que recuar", disse a deputada ao UOL.
"Claro que isso é um silenciamento. Eu sei que a questão foi jurídica, não pessoal. Mas, qualquer que seja a justificativa, não há outra conclusão que não seja: eu não pude prestar o meu depoimento na íntegra. Tive que recuar por uma ameaça de nulidade que a defesa deixou no ar."
Na sessão anterior da comissão, na qual Cury apresentou sua defesa e levou testemunhas para serem ouvidas, o advogado de defesa Roberto Delmanto Junior pediu para que fosse negado a Isa Penna o direito de fazer sua oitiva em uma sessão futura. O argumento do advogado era que a defesa deveria ser a última a falar.
O pedido foi rejeitado pelo relator do caso, Emídio de Souza (PT), mas por segurança a deputada decidiu seguir as orientações de seu advogado, Francisco Almeida Prado.
Essa sessão foi muito simbólica, era a sessão que deveria me ouvir, mas por conta da burocracia não falei. Eu estava lá para prestar esclarecimento dos fatos. Ia contar tudo. Era para isso que eu deveria ser ouvida.
Isa Penna, deputada estadual pelo PSOL
Ela vê as reuniões da comissão como uma continuidade do assédio sofrido. "Eu saio das reuniões exausta. Depois de toda reunião do Conselho de Ética da Alesp, eu chorei de raiva. A raiva de ter finalmente um assédio gravado e nem assim a punição vai ser a devida."
Tese de abraço
A estratégia da defesa de Fernando Cury é a de dizer que o gesto do deputado foi um abraço e não uma tentativa premeditada de assédio. Para sustentar a sua argumentação, Delmanto chegou a levar desenhos de anatomia humana para demonstrar que não houve toque nos seios, mas, sim, nas costelas.
"Esta aqui é a zona subaxilar", disse Delmanto enquanto erguia uma imagem da lateral de um tronco masculino. "Isso aqui não é seio, não é parte do seio. Seio fica na frente", afirmou. O advogado ainda comparou o caso da Alesp com episódios de importunação sexual de mulheres nos transportes públicos, dizendo que esses casos é que configuram assédio.
Tanto o advogado de Isa Penna quanto sua testemunha, o deputado Teonilio Barba (PT), questionaram essa argumentação. "Para haver um abraço, seja ele de frente ou de trás, tem que haver a permissão", afirmou Barba.
"A deputada Isa Penna não permitiu aquele abraço, ou a 'brincadeira', como ele chamou, ou a 'gentileza', como ele chamou, porque ela estava de costas e não viu o momento em que ele fez isso."
Essa tese do abraço, para mim, foi o famoso tiro no pé. Porque um abraço pode ser assedioso.
Isa Penna, deputada estadual
"Esta é uma conduta que nós não estamos aqui para adivinhar qual é a intenção do deputado ou não. Nós não sabemos o que estava na cabeça dele, mas sabemos quando há um ato de importunação sexual e quebra de decoro."
Ausência de titular do conselho
Titular do Conselho de Ética, Alex de Madureira (PSD) faltou à sessão. Ele havia sido convidado por Penna a falar como testemunha, já que interagiu com Cury antes e depois do episódio de assédio.
No início do processo, já havia sido negado um pedido de Penna para que Madureira fosse apenas testemunha e não deliberasse com o colegiado sobre o caso, dada sua participação no incidente.
No dia da sessão, Cury conversava com Madureira e disse algo ao colega antes de caminhar em direção a Penna. Madureira tentou segurar o colega, mas não conseguiu. A cena foi filmada pelas câmeras da Assembleia.
Na sessão anterior, depois que a deputada Erica Malunguinho (PSOL) manifestou a importância de saber o que foi dito na ocasião, outros colegas disseram que a conversa foi sobre assuntos legislativos. Madureira não esclareceu esse ponto pessoalmente no conselho.
O relator Emidio de Souza vai apresentar o seu relatório na próxima reunião do conselho, que ainda está sem data marcada. A presidente do colegiado, a deputada Maria Lúcia Amary (PSDB), manifestou intenção de marcar o encontro para esta semana. Depois de aprovado no conselho, o relatório —seja pela cassação ou pela suspensão do mandato— precisa ser levado a plenário.
Parlamentares articulam uma saída consensual sobre punição que será aplicada: a tendência é determinar a suspensão temporária do mandato. Segundo o jornal O Estado de S. Paulo, o deputado Campos Machado (Avante), membro do Conselho de Ética e um dos parlamentares mais influentes na Casa, é quem tem conduzido essa articulação. Ele está de licença dos trabalhos formais da Alesp, se recuperando de uma cirurgia.
No caso de suspensão de Cury, ainda há uma discordância em relação ao tempo que deverá durar o castigo. Se a punição superar 120 dias, será nomeado o suplente do parlamentar, que pode trocar as nomeações de seu gabinete. Já uma suspensão de duração inferior equivaleria a uma licença. Nas duas hipóteses, ele pode ficar sem receber o salário.
Nós não vamos aceitar menos de um ano de suspensão. Vamos até o fim porque consideramos que um ano de punição já é uma mediação, tendo em vista que o Brasil inteiro viu e há provas.
Isa Penna, deputada estadual
* Com Estadão Conteúdo
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