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CPI da Covid: Guerra de plaquinhas ilustra embate entre oposição e governo

O vice-presidente da CPI, Randolfe Rodrigues (Rede-AP), à esquerda; e o governista Luis Carlos Heinze (Progressistas-RS), à direita - Arte/UOL
O vice-presidente da CPI, Randolfe Rodrigues (Rede-AP), à esquerda; e o governista Luis Carlos Heinze (Progressistas-RS), à direita Imagem: Arte/UOL

Hanrrikson de Andrade e Luciana Amaral

Do UOL, em Brasília

27/05/2021 16h48

Plaquinhas com números da pandemia se tornaram marca da CPI da Covid, no Senado Federal, instalada para investigar se houve erros da gestão federal durante a crise sanitária e atos de corrupção em estados e municípios.

O artifício foi lançado originalmente pelo relator da Comissão Parlamentar de Inquérito, Renan Calheiros (MDB-AL), opositor à gestão de Jair Bolsonaro (sem partido). No lugar de seu nome na plaquinha de identificação, ele passou a enumerar os mortos pela covid-19 no país ao longo das reuniões como forma de criticar o governo federal.

Por ser relator e se sentar numa mesa elevada da cúpula da CPI, Renan costuma aparecer mais do que a maioria dos senadores nas transmissões dos depoimentos. Consequentemente, sua plaquinha também.

Renan - Edilson Rodrigues/Agência Senado - Edilson Rodrigues/Agência Senado
20.mai.2021 - Relator da CPI da Covid, senador Renan Calheiros (MDB-AL)
Imagem: Edilson Rodrigues/Agência Senado

Após bate-bocas por causa da medida, aliados do presidente da República passaram a responder na mesma moeda, mas mostrando o número de pacientes curados da covid-19.

Na audiência realizada hoje, na qual prestou depoimento o diretor do Instituto Butantan, Dimas Covas, houve plaquinhas de parte a parte.

À frente do vice-presidente da comissão, Randolfe Rodrigues, um dos líderes da oposição, havia um cartaz de identificação que, em vez do nome do parlamentar, exibia o número de vítimas desde o início da pandemia do coronavírus: 454.623 mortos.

Já o gaúcho Luis Carlos Heinze (Progressistas), uma das vozes da "tropa de choque" bolsonarista, reagiu com uma plaquinha que mostra o número de "vidas salvas" —em referência aos brasileiros que se recuperaram da covid-19. Seriam pouco mais de 14,7 milhões de pessoas.

Heinze - Jefferson Rudy/Agência Senado - Jefferson Rudy/Agência Senado
O senador Heinze (Progressistas-RS) é aliado do governo Jair Bolsonaro
Imagem: Jefferson Rudy/Agência Senado

Fora do plenário da CPI da Covid, a moda das plaquinhas também já se faz presente. Durante o expediente na Comissão de Meio Ambiente da Câmara dos Deputados, a deputada bolsonarista Carla Zambelli (PSL-SP) expôs dessa mesma forma números que, segundo a parlamentar, se referem a inquéritos e processos contra Renan Calheiros.

Carla Zambelli - Divulgação - Divulgação
Carla Zambelli (PSL-SP)
Imagem: Divulgação

Depoimento de Dimas Covas

Renan Calheiros disse hoje considerar que o depoimento de Dimas Covas, diretor do Instituto Butantan, contradiz os dos ex-ministros Eduardo Pazuello (Saúde) e Ernesto Araújo (Relações Exteriores) e do ex-secretário de Comunicação da Presidência, Fabio Wajngarten.

Em documento, Calheiros cita o momento em que Covas relatou a existência de um acerto informal, ainda em 2020, entre o Butantan e Ministério da Saúde para que o instituto entregasse 100 milhões de doses da vacina CoronaVac.

As negociações esfriaram, segundo o diretor, após o presidente Jair Bolsonaro dizer que "toda e qualquer vacina está descartada", em outubro daquele ano. O contrato entre o governo federal e o Butantan só seria assinado em janeiro de 2021, em condições diferentes das propostas anteriormente.

"O depoente [Covas] contradiz Pazuello, que afirmou: 'Acreditem, nunca o presidente da República me mandou desfazer qualquer contrato, qualquer acordo com o Butantan — em nenhuma vez'. (...) O depoente contradiz Pazuello, que afirmou que já teria assinado o protocolo de intenções com o Butantan, e que esse acordo não havia sido desfeito", apontou o senador.

Dimas Covas, continuou Calheiros, ainda contradisse o ex-ministro da Saúde ao afirmar que as declarações de Bolsonaro atrasaram, sim, a compra de vacinas contra a covid-19.

"Prova disso foi a assinatura do contrato do Ministério da Saúde com a AstraZeneca em agosto de 2020 e, com o Butantan, em janeiro de 2021", acrescentou.

Em outro trecho do documento, o relator da CPI faz menção à declaração de Covas de que os posicionamentos de autoridades brasileiras acabam repercutindo na imprensa chinesa e podem, como consequência, atrapalhar as tratativas pelas vacinas.

"Cada declaração que ocorre aqui no Brasil repercute na imprensa da China. As pessoas da China têm grande orgulho da contribuição que a China dá ao mundo neste momento. Então, obviamente, isso se reflete nas dificuldades burocráticas, que eram normalmente resolvidas em 15 dias, e hoje demoram mais de mês", afirmou o diretor do Butantan à CPI.

Esta fala, de acordo com o senador, contradiz os depoimentos de Araújo e Wajngarten.

"[Dimas Covas] Contradiz Pazuello, Ernesto Araújo e Fabio Wajngarten ao afirmarem que as relações com a China sempre foram salutares e não teriam sofrido impactos negativos por conta das atitudes do governo federal e de declarações do presidente da República", avaliou Calheiros.

A CPI da Covid foi criada no Senado após determinação do Supremo. A comissão, formada por 11 senadores (maioria era independente ou de oposição), investigou ações e omissões do governo Bolsonaro na pandemia do coronavírus e repasses federais a estados e municípios. Teve duração de seis meses. Seu relatório final foi enviado ao Ministério Público para eventuais criminalizações.