Da ditadura a Bolsonaro: o que liga duas fotos com Lula e FHC
Resumo da notícia
- Ex-presidentes da República se reuniram e registraram encontro em foto
- Partidos de FHC e Lula protagonizaram a principal polarização no país
- Durante a ditadura, Lula fez campanha para FHC em disputa pelo Senado
A foto divulgada na semana passada em que aparecem juntos os ex-presidentes Fernando Henrique Cardoso (PSDB) e Luiz Inácio Lula da Silva (PT) já é tida como histórica por ser um retrato do contexto atual vivido pelo Brasil e por mostrar dois adversários unidos contra o governo de Jair Bolsonaro (sem partido). Mas também por resgatar outra imagem feita há quase cinco décadas, que retrata o início da ligação entre duas figuras que combateram a ditadura e marcaram o período de redemocratização do país.
"A foto atual entrou para a história do Brasil, embora não tenha nenhum caráter artístico importante. Ela é apenas um flagrante do momento. Mas é suficientemente eloquente", diz o jornalista Paulo Markun, autor do livro "O Sapo e o Príncipe", sobre Lula e FHC, respectivamente. Markun, inclusive, publicou recentemente um artigo intitulado "O sapo, o príncipe e o escorpião", com referência a Bolsonaro, no jornal português Público.
Não é só o gesto. É o gesto e a circunstância em que ele se processa. Estamos a caminho de meio milhão de óbitos sob o comando de alguém que nega a eficácia de qualquer medida de combate a pandemia. Sob a morte, no fundo. Por isso, usei a imagem do escorpião.
Paulo Markun, jornalista
Lula e FHC se conhecem desde 1973, mas é de 1978 uma imagem que mostra uma ligação que hoje seria vista como impensável para quem acompanhou a política nacional apenas nos últimos anos: o líder sindical apoiando a candidatura do sociólogo.
A foto mostra Lula ajudando FHC a distribuir panfletos na porta de uma montadora de carros em São Bernardo do Campo (Grande São Paulo). Na ocasião, quando o Brasil vivia uma ditadura, FHC disputou uma vaga de senador pelo MDB, partido que reunia os opositores ao regime. Na época, a imagem não teve o impacto que a nova foto teve agora.
"Ali, o Lula, no começo da carreira sindical dele, era um sujeito muito desconfiando com os políticos profissionais, e via no Fernando Henrique o novo, o não político", diz Markun. "Ele levar o Fernando Henrique para porta de fábrica, panfletar, era uma espécie de despertar político do Lula."
Autor de "Ninho dos Tucanos", o cientista político Henrique Curi lembra que, antes, Lula era voltado a uma política mais antipartidária até meados da década de 1970. Mas, segundo ele, com o fim do bipartidarismo que vigorou em boa parte do regime militar, o futuro petista teria percebido que poderia ser interessante haver um partido que representasse o sindicalismo no Brasil.
Na onda da campanha de FHC —que, na eleição de 1978, conquistou a vaga de suplente de senador—, por pouco não saiu um partido do líder sindical e do sociólogo. A agremiação não surgiu, diz Curi, porque o grupo de Lula tinha pressa para formar o que viria a ser o PT, cujo manifesto de fundação data de 1979.
"O grupo do Fernando Henrique via como importante fortalecer o MDB, um partido democrático. E, a partir da consolidação da democracia, criar uma nova sigla", diz o cientista político. O PSDB foi fundado em 1988.
Da aliança direta em uma eleição, o petista e o tucano tornaram-se adversários, em uma rixa crescente a partir da chegada do PSDB ao Planalto em 1995. O tucano derrotou o petista nas eleições de 1994 e 98.
Quando Lula assumiu o governo, em 2003, o legado de FHC foi tratado como "herança maldita", dando ainda mais força à polarização entre seus partidos.
Por seu caráter político, a foto mais recente chama a atenção. Após a chegada de ambos ao poder, outros encontros foram registrados, como quando prestaram condolências nos falecimentos de suas esposas ou na reunião de ex-presidentes em cerimônias internacionais.
Professor do Insper, o cientista político Carlos Melo diz que o encontro entre Lula e FHC "vem cercado desse simbolismo entre dois líderes políticos que disputaram várias eleições um contra o outro, em que seus partidos são adversários, mas que sempre estiveram no campo da democracia, no respeito às instituições".
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